Santa Cruz – Inst. Local – Sec. Comp. Gen.

            Sumário:

I. Da descrição de factos provados relevantes não deve constar o resultado da comparação de dados de facto, mas sim os dados de facto que permitam a comparação.

II. A segunda reunião da assembleia de condóminos não pode ser marcada para o mesmo dia da primeira.

III. No entanto, os condóminos que participarem na nova assembleia não podem pedir, com fundamentos relativos à convocação, a anulação das deliberações aí tomadas.  

IV. Também não tem legitimidade para pedir a anulação de deliberações, o condómino que as aprovou.

V. Para que as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício sejam repartidas de forma diferente do critério supletivo previsto no art. 1424/1 do CC, os condóminos terão de estar todos de acordo e modificar o título constitutivo da propriedade horizontal através da forma imposta pelo art. 1419 do CC.

VI. E para que as despesas necessárias ao pagamento de serviços de interesse comum (e apenas estas) sejam repartidas de forma diferente do critério supletivo previsto no art. 1424/1 do CC, os condóminos terão de aprovar, sem oposição e por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, uma disposição do regulamento do condomínio onde elas sejam especificadas devidamente e concretizados e justificados os critérios que determinam a sua imputação (art. 1424/2 do CC).

VII. Se não observarem tais exigências, tais deliberações não passam a fazer parte nem do título constitutivo da propriedade horizontal, nem do regulamento do condomínio, pelo que, novas deliberações dos condóminos contrárias àquelas não violam nenhum regulamento e não são anuláveis só por isso (art. 1433 do CC).

            Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:

           

            A, Lda, intentou a presente acção de impugnação de deliberações de assembleias de condóminos contra o Condomínio do Edifício B, representado pela C, Lda, pedindo que: fossem anuladas todas as deliberações tomadas nas assembleias de condóminos de 14/04/2015 e de 04/05/2015; e a C fosse notificada para se abster de interferir na vida do condomínio, designadamente mas sem limitar, não efectuar quaisquer pagamentos ou recebimento, não outorgando contratos em seu nome, nem realizando quaisquer actos de administração.

            Alega para o efeito e em suma, que: é condómina do prédio; a 14/04/2015, a C foi eleita administradora do réu, tendo a autora votado contra; depois da eleição, a assembleia decorreu sem respeito pelo seu representante sendo sempre interrompido de forma brusca e ríspida; tendo abandonado a assembleia, não lhe foram comunicadas as deliberações das assembleias desse dia ou de 04/05/2015; neste dia, realizou-se uma assembleia de condóminos para a qual não foi notificada, tendo no entanto comparecido por ter lido o papel aposto no interior do elevador a informar a marcação da assembleia; para esse dia, a nova administração fez três convocatórias para poder aprovar o que quer que fosse com o quórum que estivesse presente, prática contrária ao regulamento do condomínio; nesse dia foi aprovado o novo orçamento, com o qual passaram a imputar à autora um conjunto de despesas que antes não estavam consagradas; a convocatória para a assembleia de 04/05/2015 não continha qualquer indicação quanto à aprovação do novo orçamento e a fixação de penalidades.

            O réu contestou, impugnando os factos alegados pela autora.

            Realizado o julgamento, foi proferida sentença julgando a acção totalmente improcedente.

            A autora recorre da mesma, impugnando a decisão relativa aos pontos 1 e 20 dos factos provados; e a decisão da matéria de direito, pretendendo a anulação da todas as deliberações por diversos argumentos que serão considerados à frente.

            O réu contra-alegou, secundando a sentença recorrida.

                                                      *

            Questões que importa decidir: se o facto 1 deve ser alterado e o facto 20 deve ser dado como não provado; se as deliberações das AG de 14/04/2015 e 04/05/2015 deviam ter sido anuladas.

                                                      *

            No tribunal recorrido deram-se como provados os seguintes factos:

  1. A autora é condómina do prédio em propriedade horizontal – Edifício B – sito em X, por nele ser proprietária das seguintes fracções: no piso -1: AA, AC, AD, AF, AG, AH, AM, AO, AQ, X, Y e Z; no piso -2: P, Q, R, T, U, V e W; e no piso -3: A a N [a concretização das fracções da autora, não só no piso -3, foi agora feita por este acórdão do TRL em conformidade com o decidido mais à frente].
  2. No dia 14/04/2015, na qual estavam presentes ou representados 57% do total do prédio convocado, realizou-se uma assembleia de condóminos.
  3. Os condóminos, incluindo a autora, foram convocados para a assembleia do dia 14/04/2015, através de carta registada, enviada pela administração anterior a 31/03/2015.
  4. Na assembleia referida em 2, foi eleito presidente da assembleia do condomínio – CI – e, como secretário, LP.
  5. Destituída a anterior administração (a D) por votação da maioria dos presentes e representados, a C, que havia sido chamada por um grupo de condóminos, apresentou a sua proposta para administrar o réu.
  6. Até ser chamada, a C permaneceu no hall da entrada do bloco A.
  7. Após a apresentação da proposta da C que correu de forma ordeira, silenciosa e pacata, o Sr. Y na qualidade de representante da autora, abandonou a AG de condóminos, antes da votação que resultou na eleição da C.
  8. Na convocação feita aos condóminos para a AG de 14/04/2015 constava o ponto de trabalho – deliberar sobre a administração do condomínio – pelo que os condóminos dispuseram de tempo suficiente para consultar empresas de administração de condomínios para se apresentarem naquela AG.
  9. A acta com as deliberações tomadas naquela AG realizada no dia 14/04/2015, foi assinada e comunicada/enviada a todos os condóminos ausentes, bem como à autora.
  10. Todos os condóminos, incluindo a autora, foram convocados para a AG extraordinária de condóminos a realizar no dia 04/05/2015, através de carta registada enviada a 24/04/2015.
  11. Para além de proceder ao envio da competente convocatória, a administração também afixou as respectivas convocatórias nas zonas comuns do edifício, conforme documento de fls. 184 e 185 dos autos, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido e onde, nomeadamente, se lê: “(…) Se decorridos 30 minutos após a hora marcada da assembleia acima referida, não estiverem presentes ou representados condóminos titulares da maioria do valor total do prédio, ou não for possível formara a maioria prevista no n.º4 do artigo 1432 do Código Civil, fica também desde já convocada para nova reunião da Assembleia de Condóminos a realizar no mesmo dia e local, e com a mesma ordem de trabalhos, às 20h. Fica desde já fixada a terceira convocatória para as 20h30, dado ser imperativo nos termos do art. 1424/2, 2/3 do capital investido (66,6%) por força do princípio da autonomia da vontade, que os condóminos nesta assembleia, presentes ou representados, venha a definir ou rectificar o regime da forma de comparticipação das despesas comuns. Os pontos 1, 2 e 3 da presente ordem de trabalhos, carecem dos votos de 2/3 do total do capital investido, através da presença ou delegação de poderes de votos. Não se verificando as condições acima referidas, a nova assembleia, agendada para as 20h30, 3ª convocatória, poderá deliberar por maioria dos votos dos proprietários presentes ou representados, desde que constituam pelo menos 1/4 do valor total do prédio, nos termos do n.º 4 do citado artigo 1432 do CC (…)”.
  12. Em 04/05/2015, reuniu-se AG extraordinária de condóminos do edifício A, com a seguinte ordem de trabalhos:           

1. Ratificação das deliberações tomadas nos pontos 2 e 3 da ordem de trabalhos, na AG de 13/07/2005, aprovados por unanimidade dos presentes, totalizando 38% do total do capital investido, da qual se lavrou a acta n.º 4 que nesta se reproduz…

         “Dado a heterogeneidade do Edifício e nela estarem inseridos fracções de diversas tipologias cujos acessos ao Edifício são diferenciados, propõe o mesmo [administrador, CM] que o orçamento seja subdividido em três partes, habitação, comércio e caves. No orçamento da parte habitacional o mesmo é rateado pelas fracções aplicando-se o critério da tipologia, no orçamento da zona comercial as despesas são distribuídas pelo critério das permilagens e finalmente nas caves as despesas directamente relacionadas com as mesmas são repartidas em 85% pelo número de parqueamentos e 15% pelo número de arrecadações. Dada a falta de consenso, o representante da administração propôs então que fosse alterado para 10%, o montante distribuído para as arrecadações e 90% para os parqueamentos.

         [sobre estes dois pontos o que estava realmente escrito na acta de 13/07/2005 era o seguinte: passou-se ao segundo ponto, tendo tomado a palavra o representante da administração que propôs que este fosse votado em conjunto com o terceiro ponto visto estarem interligados, tendo esta proposta sido aprovado. O mesmo explicou que… segue-se o que está transcrito acima até ‘15% pelo número de fracções’. A seguir escreve-se: Pediu a palavra o Sr. Y, que em representação da empresa promotora disse que discordava da percentagem atribuída às arrecadações dado que estas pouco iriam contribuir para as despesas das caves, tendo-se gerado um debate, com alguns dos condóminos a discordarem da posição do Sr. Y. Como não [falta] consenso, o representante da administração propôs então que fosse alterado para 10% o montante distribuído para as arrecadações e 90% para os parqueamentos. Foi então posta à votação esta proposta com a rectificação das percentagens referidas, esta proposta foi aprovada por unanimidade. Tendo os orçamentos sido anexados a presente acta para dela ser parte integrante.” – esta transcrição foi feita por este ac. do TRL para melhor compreensão do que foi decidido no ponto 12/1].

2. Ratificação da deliberação tomada no ponto n.º 2 da ordem de trabalhos, na AG de 28/02/2005, aprovado por unanimidade, totalizando 63% do capital investido, da qual se lavrou a acta n.º 5 que nesta se reproduz…

         “Respeitante às caves e à sua elevada despesa, foi questionado por alguns condóminos se a terceira cave (-3), apesar de fechada, não deveria comparticipar nas despesas de bomba de água dado que esta também é beneficiada pela existência da mesma. Após uma breve discussão, foi posteriormente deliberado por unanimidade que a referida cave pagaria parcialmente o consumo energético. […]. Foi então proposto pela administração que este valor fosse dividido equitativamente pelas três caves, com efeitos retroactivos desde o início da instalação do condomínio, propôs ainda a colocação de um contador para se apurar o efectivo valor do referido consumo, sendo posteriormente corrigido a repartição, caso haja alguma diferença. Esta proposta foi aprovada por unanimidade.”

         A parte que a administradora do réu não transcreveu da acta de 28/02/2005, correspondente ao […] é a seguinte: “Tomou a palavra a administração que informou a assembleia que dado não haver valores exactos dos consumos das bombas de água, já havia encetado contactos com o engenheiro responsável pela instalação eléctrica do edifício, em que o mesmo afirma que o consumo rondaria os 50% do total das caves.” – esta transcrição foi feita por este ac. do TRL para melhor compreensão do que foi decidido no ponto 12/1.

3. Alteração do ponto n.º 23 do Regulamento Interno do Condomínio [escreve-se o seguinte: Relativamente ao ponto 3, foi aprovado por unanimidade dos presentes e representados a alteração ao ponto 23 do regulamento […]. Alínea 1: na parte habitacional a distribuição das quotas é rateadas pelas fracções aplicando o critério da tipologia, na zona comercial as despesas são distribuídas pelo critério das permilagens e nas caves as despesas são repartidas em 85% pelo número de parqueamentos e 15% pelo número de arrecadações – esta transcrição foi feita por este ac. do TRL].

4. Apresentação, discussão e aprovação do Orçamento de despesas para o exercício entre o período de 01/05/2015 até 30/04/2016.

5. Análise da prestação de contas apresentada pela E: Discussão sujeita/pendente da resposta da empresa cessante.

6. Com base nos extractos de dívidas aos credores, deliberar planos de pagamento de dívidas.

7. Analisar e deliberar quota extra para fazer face as encargos resultantes dos acordos.

8. Outros assuntos de interesse geral.

13. A assembleia teve início pelas 20h30, reunindo-se regularmente em terceira convocatória, tendo sido presidida pela representante da C, PI, verificando-se estarem presentes ou representados os condóminos das fracções A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, O, P, Q, R, T, U, V, W, X, Y, Z, AA, AB, AC, Ad, AF, AG, AH, AM, AO, AP, AQ, AR, AT, AW, AX, AY, AZ, BC, BD, BM, BO, BP, BQ, BR, BV, BW, BY, CA, CB, CD, CI, CM, CP, CQ, CR, CT, CU, CW, CY, CZ, constituindo 56,49% do total do prédio convocado.

14. O legal representante da autora esteve presente na assembleia descrita em 13.

15. Os pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos referida em 12 são ratificações de deliberações tomadas em 28/02 e 13/07/2005.

16. Os pontos 1, 2 e 3 da ordem de trabalhos referida em 12 foram aprovados por unanimidade dos presentes na assembleia.

17. Relativamente ao ponto 4 da ordem de trabalhos, foi colocado em análise e discussão o orçamento para o período de 01/05/2015 a 30/04/2016, sendo para:

          – A zona de habitação, o valor do orçamento anual de 22.460,48€,

          – A zona de comercio, o valor de 14.612,45€,

          – A zona de garagem, o valor orçamentado de 18.385,22€.

18. Posto a votação, o orçamento para as diferentes áreas foi aprovado por maioria dos presentes e representados, abstendo-se a autora neste ponto.

19. A acta da assembleia descrita em 13 foi enviada a todos os condóminos, quer aos presentes, quer aos ausentes, nomeadamente à autora.

20. O orçamento referido em 18 atendeu aos critérios deliberados e aprovados em 2005. Esta conclusão foi substituída pelos nove quadros que se seguem, por força do decidido por este acórdão do TRL mais abaixo

         Orçamento de habitação em 2015:

Rubrica Mensal Anual
Manutenção Geral 50 € 600 €
Expediente e Jurídica 51,24 € 614,88 €
Abertura/Fecho Centro 0 € 0 €
Manutenção Eléctrica 73,20 € 878,40 E
Consumíveis WC 0 € 0 €
Elevadores 183€ 2.196 €
Linhas Telefónicas 35,87 € 430,42 €
Electricidade 370 € 4.440 €
Água 32,00 € 384 €
Limpeza 675,66 € 8.107,96 €
Administração 230,58 € 2.766,96 €
total Mensal 1701,55 € 20.418,62 €
FCR 10% 170,16 € 2041,86 €
Total com FCR 1871,71 € 22.460,48 €

         Distribuição de quotas da zona de habitação, em 2015:

Fr. Permilagem Geral HABITACIONAL Total com FCR
1.811,11 €
BM 17,59 HAB.T3 – EST.SIGLE 1.° PISO 44,56 €
BN 11,47 HAB.T1 1.° PISO 29,06 €
BO 22,88 HAB.T3 – EST.DUPLO 1.° PISO 57,96 €
BP 17,59 HAB.T3 – EST. SIGLE 1.º PISO 44,56 €
BQ 17,59 HAB.T3 – EST. SIGLE 1.º PISO 44,56 €
BR 22,88 HAB.T3 – EST. DUPLO 2.º PISO 57,96 €
BS 11,47 HAB.T1 2.° PISO 29,06 €
BT 22,88 HAB.T3 – EST. DUPLO 2.° PISO 57,96 €
BU 17,59 HAB.T3 – EST. SIGLE 2.° PISO 44,56 €
BV 17,59 HAB.T3 – EST. SIGLE 2.° PISO 44,56 €
BW 22,88 HAB.T3 – EST. DUPLO 3.º PISO 57,96 €
BX 11,47 HAB.T1 3.° PISO 29,06 €
BY 41,89 HAB.T3 – EST. TRIPLO 3.º piso 106,12 €
BZ 17,59 HAB.T3 – EST. SIGLE 3.° PISO 44,56 €
CA 17,59 HAB.T3 – EST. SIGLE 3.° PISO 44,56 €
CB 22,88 HAB.T3 – EST. DUPLO 4.° PISO 57,96 €
CC 41,89 HAB. T3 – EST. TRIPLO 4.° PISO 106,12 €
CD 15,91 HAB.T2 1.º PISO 40,30€
CE 15,91 HAB.T2 1.º PISO 40,30 €
CF 15,91 HAB.T2 1.º PISO 40,30 €
CG 17,59 HAB.T3 – EST. SIGLE 1.º PISO 44,56 €
CH 15,91 HAB.T2 2.° PISO 40,30 €
Cl 15,91 HAB.T2 2.° PISO 40,30 €
CJ 17,59 HAB.T3 – EST. SIGLE 2.º PISO 44,56 €
CK 15,91 HAB.T2 3.° PISO 40,30 €
CL 15,91 HAB.T2 3.° PISO 40,JO€
CM 22,88 HAB.T3 – EST. DUPLO 3.º PISO 57,96 €
CN 11,47 HAB.T1 4.° PISO 29,06 €
CO 15,91 HAB.T2 4.° PISO 40,30 €
CP 17,59 HAB.T3 – EST. SIGLE 4.° PISO 44,56 €
CQ 15,91 HAB.T2 1.° PISO 40,30 €
CR 15,91 HAB.T2 1.° PISO 40,30€
CS 11,47 HAB.T1 1.° PISO 29,06 €
CT 15,91 HAB.T2 2.º PISO 40,SO€
CU 15,91 HAB.T2 2.º PISO 40,30 €
CV 11,47 HAB.T1 2.º PISO 29,06 €
CW 15,91 HAB.T2 3.° PISO 40,30€
CX 15,91 HAB.T2 3.° PISO 40,30 €
CY 11,47 HAB.T1 3.° PISO 29,06 €
CZ 15,91 HAB.T1 4.° PISO 40,30 €
DA 11,47 HAB. T1 4.° PISO 29,06 €
DB 11,47 HAB. T1 4.° PISO 29,06 €
42 738,84 TOTAL MENSAL 1.871,71 €
TOTAL

ANUAL

22.460,48€

Orçamento para comércio, em 2015:

Rubrica Mensal Anual
Manutenção geral 42€ 504€
Expediente e jurídica 25,62€ 307,44€
Abertura/Fecho Centro 100€ 1200€
Manutenção eléctrica 17,93€ 215,21€
Consumíveis WC 25€ 300€
Elevadores 0€ 0€
Linhas telefónicas 0€ 0€
Electricidade 390€ 4680€
Água 62,94€ 755,28€
Limpeza 328,22€ 3938,64€
Administração 115,29€ 1383,48€
Total mensal 1107€ 13.284,05€
FCR 10% 110,70€ 1328,40€
Total com FCR 1217,70 14.612,45€

Distribuição de quotas da zona do comércio, em 2015:

Fr Perm. Comercial Total com FCR
1217,70€
AR 7,65 Comercial –r/c 51,39€
AS 8,47 Comercial –r/c 56,90€
AT 10,20 Comercial –r/c 68,52€
AU 5,75 Comercial –r/c 38,63€
AV 6,78 Comercial –r/c 45,55€
AW 6,33 Comercial –r/c 42,52€
AX 10,12 Comercial –r/c 67,98€
AY 3,53 Comercial –r/c 23,71€
AZ 8,22 Comercial –r/c 55,22€
BA 9,38 Comercial –r/c 63,01€
BB 9,26 Comercial –r/c 62,21€
BC 6,74 Comercial –r/c 45,28€
BD 22,45 Loja Est.Triplo – r/c 150,81€
BE 3,34 Comercial –r/c 22,44€
BF 4,99 Comercial –r/c 33,52€
BG 7,05 Comercial –r/c 47,36€
BH 6,62 Comercial –r/c 44,47€
BI 11,36 Comercial –r/c 76,31€
BJ 9,64 Comercial –r/c 64,76€
BK 13,44 Comercial –r/c 90,28€
BL 9,95 Comercial –r/c 66,84€
21 181,27 Total Mensal 1217,70€
Total Anual 14.612,45€

         Orçamento garagem piso -3, estacionamentos, arrecadações, em 2015:

Rubrica Mensal Anual
Manutenção geral 119€ 1428€
Expediente e Jurídica 52,46€ 629,52€
Abertura/Fecho Centro 0€ 0€
Manutenção Eléctrica 52,46€ 629,52 €
Consumíveis WC 0€ 0€
Elevadores 0€ 0€
Linhas Telefónicas 0€ 0€
Electricidade 600€ 7.200€
Água 52,06€ 624,72€
Limpeza 280,77€ 3.369,24€
Administração 236,07€ 2.832,84€
Total mensal 1392,82€ 16.713,84€
FCR 10% 139,28€ 1671,38€
Total com FCR 1532,10€ 18.385,22€

        Distribuição de quotas garagem piso-3, estacionamentos, arrecadações, em 2015:

Fr. Perm. Piso-3, Est, Arre. Total com FCR
1532,10€
A 3,94 GARAGEM -3 75,85€
B 3.94 GARAGEM -3 75,85€
C 3,94 GARAGEM -3 75,85€
D 3,94 GARAGEM -3 75,85€
E 3.94 GARAGEM -3 75,85€
F 3,94 GARAGEM -3 75,85€
G 3,94 GARAGEM -3 75,85€
H 3,94 GARAGEM -3 75,85€
I 3,94 GARAGEM -3 75,85€
J 3,94 GARAGEM -3 75,85€
K 3.94 GARAGEM -3 75,85€
L 3,94 GARAGEM -3 75,85€
M 3,94 GARAGEM -3 75,85€
N 3,94 GARAGEM -3 75,85€
O 0,66 Arrecadação 12,69€
P 0,37 Arrecadação 7,11€
Q 0,06 Arrecadação 1,15€
R 0,91 Arrecadação 17,50€
S 0,71 Arrecadação 13,65€
T 0,88 Arrecadação 16,92€
U 1.28 Arrecadação 24,61€
V 0,65 Arrecadação 12,50€
W 0,55 Arrecadação 10,58€
X 0.85 Arrecadação 16,34€

 

Y 0,82 Arrecadação 15,77€
Z

 

0,83 Arrecadação 15,96€
AA 0,82 Arrecadação 15,77€
AB 0,82 Arrecadação 15,77€
AC 0,82 Arrecadação 15,77€
AD 0,88 Arrecadação 16,92€
AE 1,90 Estacionamento duplo 36,53€
AF 0,95 Estacionamento 18,27€
AG 0,95 Estacionamento 18,27€
AH 1,10 Arrecadação 21,15€
AI 0,95 Estacionamento 18,27€
AJ 0,37 Arrecadação 7,11€
AK 0,93 Arrecadação 17,88€
AL 0,95 Estacionamento 18,27€
AM 0,09 Arrecadação 1,73€
AN 0,70 Arrecadação 13,46€
AO 1,86 Arrecadação 35,76€
AP 0,88 Arrecadação 16,92€
AQ 0,92 Arrecadação 17,69€

 

Distribuição das despesas pelas fracções em 2005:

Orçamento Zona Habitacional
Rubrica Valor Anual Valor Mensal Distribuição
1. Despesas Blocos TI T2 T3
1.1. Administração 2.898,00€ 241,50€ 3,73 € 5,20€ 7,22€
1.2. Electricidade 2.000,00€ 166,67 € 2,58€ 3,59€ 4,98€
1.3. Água 300,00€ 25,00€ 0,39€ O,54€ 0,75€
1.4. Elevador 5.229,63 € 435,80€ 6,74€ 9,38€ 13,03 €
1.5. Telefone 540,00€ 45,00€ 0,70€ 0,97€ 1,35 €
1.6. Manutenção 690,00€ 57,50€ 0,89€ 1,24€ 1,72€
1.7. Limpeza 7.242,12 € 603,51 € 9,33 € 12,99 € 18,04€
1.8. Despesas Diversas 207,06€ 17,26 € 0,27€ 0,37€ 0,52€
1.9. Convocatórias 119,46€ 9,96€ 0,15€ 0,21 € 0,30 €
1.20.Material Eléctrico 238,92€ 19,91 € 0,31 € 0,43 € 0,60€
Total 19.465,19 € 1.622,10€ 25,08 € 34,91€ 48,50€
Orçamento Centro Comercial
Rubrica Valor Anual Valor Mensal Distribuição
2. Despesas Centro Comercial  

 

Despesa

rateada

pela

permilagem

de

cada

fracção

Comercial

2.1. Administração 2.028,60 € 169,05 €
2.2. Electricidade 2.100,00 € 175,00 €
2.3. Água 250,00 € 20,83 €
2.4. Manutenção 828,00 € 69,00 €
2.5. Limpeza 5.706,24 € 475,52 €
2.6. Abertura e Encerramento do Centro 1.200,00 € 100,00 €
2.7. Consumíveis WC 400,00 € 33,33 €
2.8. Despesas Diversas 52,94 € 4,41 €
2.9: Convocatórias 30,54 € 2,55 €
2.10.Material Eléctrico 61,08 € 5,09 €
Total 12.657.40€ 1054,78€
Orçamento Caves
                  Rubrica Valor Anual Valor Mensal Distribuição
3. Despesas das Caves Estac. (81) Arrecad. (24) Cave -3
3.1. Administração 690,00€ 57,50€ 0,64€ 0,24€
3.2. Electricidade 6.500,00€ 541,67 € 6,02€ 2,26€
3.3. Electricidade 1.300,00€ 108,33 € 108,33 €
3.4. Água       100,00€ 8,33 € 0,09€ 0,03 €
3.5. Manutenção 690,00€ 57,50€ 0,64€ 0,24€
3.6. Limpeza 1.656,00€ 138,00€ 1,53 € 0,58€
3.7. Despesas Diversas 40,00€ 3,33 € 0,04€   0,01€
3.8. Convocatória 50,00€ 4,17€ 0,05€ 0,02€
Total 11.026,00€ 918,83 € 9,01 € 3,38 € 108,33 €

        Por ser essencial à compreensão dos termos usados, consigna-se aqui, ao abrigo dos arts. 663/2 e 607/4, ambos do CPC, o que consta do título constitutivo da propriedade horizontal quanto ao que se segue:

  1. O edifício é dito ter 105 estacionamentos distribuídos por 3 caves; a cave -3 tem 39 estacionamentos, 9 deles duplos (o simples é de 12,50m2 e os duplos de 25m2); a cave -2 tem 40 estacionamentos, 7 deles duplos; a cave -1 tem 26 estacionamentos, 1 deles duplo e 1 outro triplo [os parqueamentos são por isso 124, cada um deles com 12,50m2].
  2. O edifício tem 106 fracções, 6 delas destinadas a parqueamento automóvel: A [na cave-3 com 39 estacionamentos, 9 deles duplos], AE [cave-1 com 1 estacionamento, que é duplo], AF [cave-1 com 1 estacionamento], AG [cave-1 com 1 estacionamento], AI [cave-1 com 1 estacionamento] e AL [cave-1 com 1 estacionamento]; 37 destinadas a arrecadação [13 na cave-3, 9 na cave-2 e 15 na cave-1], 21 destinadas a comércio [todas no rés-do-chão, todas com 1 estacionamento simples na cave-1, à excepção de uma que tem 3 estacionamentos], 42 destinadas a habitação [todas nos pisos acima do rés-do-chão, todas com estacionamentos na cave-2 ou na cave-1, alguns deles duplos e outros triplos].
  3. As fracções para habitação são 18 T3, 15 T2 e 9 T1.

                                   *

                                   I

Da impugnação da decisão da matéria de facto

                                                      *

            […]

                                                      II

                            Do recurso sobre matéria de direito

i)

Da convocação de meia em meia hora

            Com base no acórdão do STJ de 26/05/2015, proc. 741/09.7YXLSB.L1.S1, e em parte dos acórdãos (do STJ de 04/07/2002, proc. 4064/01, publicado nos sumários do sítio do STJ; e do TRP de 04/05/2010, proc. 680/07.6TBLMG.P1) e doutrina que ele refere, a autora argumenta que a prática, corrente, adoptada pelo administrador do réu, de convocar as assembleias de condóminos por duas vezes (no caso três…), para o mesmo dia, com intervalo de meia hora, para o caso de falta de quórum na anterior, contraria frontalmente o pensamento legislativo do art. 1432/4 do Código Civil, por não acautelar, com isso, o interesse e o direito de participação de todos os condóminos: “na segunda assembleia o quórum é menos exigente [e] na prática as deliberações seriam tomadas com uma menor representatividade do capital investido, pelo que é conveniente evitar-se o recurso imediato a uma deliberação com quórum reduzido.” (a parte entre aspas é de Rui Vieira Miller, A propriedade horizontal no Código Civil, Almedina, Coimbra, 3.ª ed, p. 272, citado pelo ac. do STJ de 2015, que ainda refere no mesmo sentido, o ac. do TRL de 31/03/2011, proc. 1842/05.6TVLSB.L1-6).

            O réu e a sentença não dizem nada quanto a isto.

            Aqui aceita-se, sem qualquer dúvida, a posição do STJ e dos acórdãos e doutrina que cita, considerando-se ilegal a forma corrente de convocação da nova assembleia de condomínios.

            Este vício não dizia respeito à assembleia de Abril, mas só à assembleia de Maio de 2015.

            Como tudo o resto do que se segue também não diz respeito à assembleia de Abril, pode-se desde já concluir que não há qualquer razão para anular as deliberações tomadas nessa assembleia.

            Quanto às de Maio de 2015, vale o que se segue.

                                                      *

  1. ii)

Da falta de legitimidade para pedir a anulação

            Aceitou-se acima a ilegalidade invocada pela autora, só que a autora não atentou no que foi dito pela sentença recorrida, quer quanto à falta de convocação:

         […E]ntende-se que ainda que existisse falta de convocação da autora para a assembleia do dia 04/05/2015, a presença da mesma, sem protesto exarado em acta, sanaria qualquer irregularidade. Na verdade, considerando que a autora votou nessa mesma assembleia (favoravelmente quanto a alguns pontos), a alegação da falta de convocatória para a assembleia, nesta sede, raia o denominado abuso de direito – artigo 334 do CC e a nível jurisprudencial, o acórdão do STJ de 02/10/97, in BMJ 470, pág. 495, que “considerou abuso do direito de reclamar por em contradição com uma conduta anterior no sentido da conformação com uma deliberação tomada em assembleia de credores” [a propósito de uma assembleia de credores num processo de recuperação – tem um voto de vencido – este parenteses foi colocado por este ac. do TRL].

quer mais genericamente quanto a eventual vício na convocação, invocando Sandra Passinhas – a pag. 223 da obra A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, 2ª ed., de Janeiro de 2002 – nos seguintes termos [que aqui se passa a citar na 1.ª edição, 2000, Almedina, pág. 216]:

         “Obviamente que a participação dos condóminos na reunião sana a irregularidade ou a falta de convocação. [Mas n]ão basta a mera presença na assembleia; o condómino pode dirigir-se ao local da reunião numa tentativa de adiar a assembleia, pois apesar de ter tomado conhecimento da sua realização, não beneficiou do prazo mínimo concedido por lei e que, no caso concreto, seria indispensável, por exemplo, para aconselhamento jurídico ou tão só para ponderar sobre uma correcta tomada de decisão. É necessário que os condóminos manifestem a vontade de que a assembleia se constitua e delibere sobre determinado assunto” [e em nota invoca vários lugares paralelos e doutrina no mesmo sentido].

            Ou seja, e como diz o ac. do TRP de 04/05/2010 invocado pela própria autora (já identificado acima), a anulabilidade (art. 1433/1 do CC) das deliberações tomadas só pode ser invocada pelos condóminos que não tiverem estado presentes na assembleia (arts. 287 e 288, ambos do CC). Aqueles que estiveram presentes e participaram nas deliberações não a podem invocar.

            Ora, a autora esteve presente, participou e aprovou as três primeiras deliberações da assembleia de Maio de 2015 (factos provados sob 14 e 16), pelo que não as pode impugnar.

                                                      *

                                                     iii)

O regulamento do condomínio e o título constitutivo

            Diz a autora que o regulamento do condomínio do Edifício A é parte integrante do título constitutivo da propriedade horizontal, o que por si só determinaria que, ao abrigo do disposto no artigo 1418/2-b do CC e 95/1-q do Código de Registo Predial, para a modificação devesse existir acordo de todos os condóminos (vide artigo 1419/1, in fine do CC), isto é, unanimidade, o que não se verificou nas deliberações tomada em assembleia de condóminos de 04/05/2015.

            A autora esquece três coisas: primeiro que, por surpreendente que seja, ela nunca apresentou aos autos – nem o fez o réu, diga-se – o regulamento do condomínio; segundo: o regulamento do condomínio não faz parte (nem é obrigatório que faça, como decorre do art. 1418/2-b do CC) do título constitutivo da propriedade horizontal o que se pode afirmar porque, esse sim, encontra-se junto aos autos (na forma de objecto de uma deliberação camarária, a fls. 136 a 163); terceiro, que, como diz a sentença recorrida, ela aprovou a alteração do regulamento (factos 12/3 e 16).

            De qualquer, o relevante no caso é o seguinte: esta argumentação da autora não tem razão de ser, porque o regulamento não faz parte do título constitutivo.

            De qualquer modo, mais à frente apreciar-se-á a questão da necessidade de aprovação por unanimidade e ver-se-á que a autora tem parcialmente razão quanto a tal, mas sem as consequências que pretende tirar.

                                                     iv)

            Das deliberações que modificaram a repartição de despesas

            Segundo a autora, as deliberações sobre a alteração dos encargos de conservação ou fruição sempre exigiria a aprovação sem oposição por maioria representativa de dois terços (66,67%) do valor total do prédio, o que resulta do artigo 1424/2 do CC e ainda do artigo 18, n.ºs 6 e 7 do próprio regulamento interno do condomínio do Edifício A; e a forma de actuar do administrador do réu, ao fazer aprovar tal alteração, através da forma de convocação da assembleia, por uma minoria menor que a maioria exigida, representa um abuso do direito.

            A argumentação da autora está errada a vários títulos (por exemplo, a exigência lega para a alteração referida pela autora é a unanimidade e não a maioria, de 2/3, sem oposição) e é contraditória com a posição por ela assumida, já que, como a sentença recorrida disse, como também já referido, a autora aprovou a deliberação em causa, como resulta dos pontos 12, n.ºs 1, 2 e 3, e 16 dos factos provados, pelo que não tem legitimidade para arguir a sua anulabilidade; não se podendo pôr a questão da anulabilidade destas deliberações, fica prejudicado o conhecimento do abuso de direito para as obter.

            De qualquer modo, ver-se-á já de seguida a questão da necessidade da maioria qualificada referida e ver-se-á que a autora tem parcialmente razão quanto a tal, mas sem as consequências que pretende tirar.

                                                      v)

            Da aprovação das deliberações que ratificaram as deliberações de 2005

            Apesar de a sentença ter razão em dizer que a autora não pode arguir a anulabilidade das deliberações dos pontos 1, 2 e 3 da assembleia de 04/05/2015, por as ter votado favoravelmente, as questões que a autora levantou levam à conclusão de que a deliberações em causa não foram aprovadas com os votos necessários, ou seja, não observaram as condições legais exigidas para o efeito, segundo o que resulta do disposto no art. 1424/1 e 2 do CC (o que é mais uma razão para desconsiderar a questão do abuso de direito invocado pela autora: como se entende que as deliberações não foram validamente aprovadas, não vale a pena estar a discutir a forma como foram obtidas).

            As deliberações em causa referem-se a todas as despesas orçamentadas, sem qualquer especificação. Ou seja, referem-se a todas as despesas que estão em causa no art. 1424/1 do CC.

            Enquanto se podem referir às despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício, há que ter em conta que só uma disposição em contrário, aprovada por unanimidade dos condóminos, permitiria uma repartição delas diferente da estabelecida no critério supletivo legal do art. 1424/1 do CC (neste sentido, Aragão Seia, pág. 121: “o acordo tem de resultar da vontade unânime dos condóminos, consubstanciada em escritura pública, pois trata-se de modificação do título constitutivo – art. 1419/1 do CC. ”; no mesmo sentido, Rui Vieira Miller, obra citada, pág. 203; no mesmo sentido, ainda, veja-se o ac. do STJ de 12/11/2009, 5242/06.2TVLSB.S1; a autora desta acção refere vários outros autores no mesmo sentido, com inúmeras citações).

            Ora, não existe essa unanimidade no caso dos autos. Mesmo a possibilidade consagrada no n.º 5 do art. 1432 do CC para facilitar a obtenção dessa unanimidade, exigiria que a aprovação tivesse tido a unanimidade de todos os presentes desde que eles representassem 2/3 do capital investido. Ora, na assembleia de 04/05/2015 só estavam presentes 56,49% do total do prédio (e já agora, nas de 2005 só estavam 38% e 63%).

            Não havendo unanimidade, a repartição de despesas aprovada não poderá assumir a forma legal exigida (art. 1419, n.ºs 1 e 2, do CC), pelo que não poderá produzir efeitos como tal (seria nula: art. 220 do CC), isto é, não poderá ser vista como disposição modificativa do título constitutivo da propriedade horizontal.

                                                      * 

            Enquanto as deliberações se podem referir às despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum, há que ter em conta que o n.º 2 do art. 1424 do CC só permite que elas possam ficar a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição, desde que devidamente especificadas e justificados os critérios que determinam a sua imputação e mediante disposição do regulamento de condomínio aprovada sem oposição por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, possa. 

            Ora, as deliberações/ratificações de 04/05/2015 não foram aprovadas por maioria representativa de 2/3 do valor total do prédio, como já foi visto e o n.º 4 do art. 1432 do CC não permite que estas maiorias sem oposição e de 2/3 sejam substituídas por maiorias representativas de ¼ do valor total do prédio (neste sentido, Sandra Passinhas, obra citada, pág. 240: “Esta possibilidade de as deliberações serem aprovadas por uma maioria menor, concedida pelo n.º 4 do art. 1432, refere-se ao n.º 3, id est, às deliberações tomadas por maioria dos votos representativos do capital investido. Não abrange, assim, as deliberações em que exige a maioria qualificada de 2/3 […]. Se o legislador quisesse adoptar tal solução, tê-la-ia referido expressamente, como o fez no n.º 5, a propósito das deliberações que careçam de ser tomadas por unanimidade.”

            E para além de não terem sido aprovadas pela maioria necessária, também não observaram a exigência de especificação (das despesas) e justificação (dos critérios). De tal modo é genérica a deliberação, que foi entendida, aparentemente desde 2005, como dizendo respeito a todas as despesas referidas no n.º 1 do art. 1424 do CC, e não só à parte daqueles que estão em causa também no n.º 2. Não tendo observado a exigência de especificação e justificação não podem ser eficazes como tal (neste sentido, Aragão Seia, pág. 122).

            Assim sendo, estas deliberações/ratificações não poderão ser vistas como tendo dando origem a uma modificação do regulamento do condomínio.

                                                     vi)

                               Da (ir)relevância da ratificação

            A sentença recorrida, seguindo o réu, entende que não houve qualquer alteração dos critérios de distribuição dos encargos, o que houve foi uma ratificação dos já vigentes, de facto, desde 2005.

            E isto, a nível das deliberações, é exacto.  

            O que tem o sentido de estender as conclusões anteriores às deliberações de 2005. Aliás, tudo o que antecede é directamente aplicável a elas.

            Por isso, também estas não passaram a fazer parte do título constitutivo da propriedade horizontal nem do regulamento do condomínio.

                                                     vii)

                            A falta de votos não é causa de nulidade

            Repete-se, entretanto, que a falta de aprovação com os votos exigidos por lei, não conduz à nulidade das deliberações, mas sim à sua anulabilidade. Voltando a Sandra Passinhas, obra já citada pela sentença recorrida, pág. 240 da 1ª edição: “a ilegalidade ocorrida no processo formativo de uma deliberação [por exemplo: forma-se apenas uma maioria simples quando a lei exige maioria qualificada] determina apenas a sua anulabilidade. Não estão aqui em jogo senão interesses disponíveis dos condóminos que o forem no momento da deliberação, interesses que, portanto, podem ser defendidos através da acção anulatória.”

            Pelo que a anulabilidade tem de ser arguida e só o pode ser por quem não tiver votado as deliberações. Ora, as deliberações que até agora foram chamadas à colação (as três primeiras da assembleia de Maio de 2015) foram todas aprovadas pela autora.

                                                    viii)

Da anulabilidade da deliberação que aprovou o orçamento de 2015

            A autora diz que o orçamento aprovado na assembleia de 04/05/2015 não aplicou correctamente os critérios de repartição das despesas aprovados nessa mesma assembleia.

            Note-se desde já que toda esta argumentação corresponde a um comportamento absolutamente contraditório da autora: por um lado, pede a anulação de todas as deliberações das assembleias de Abril e Maio de 2015, inclusive das deliberações que teriam repartido as despesas entre as fracções, que ela própria, autora, tinha aprovado, mas por outro lado, pede a anulação do orçamento de 2015 por não ter observado as deliberações de repartição dessas despesas. E pior ainda, na petição inicial queixava-se dos critérios de repartição das despesas aprovados também por ela – dizendo no art. 50 da petição inicial, por exemplo, que “a administração alterou a fórmula de cálculo de pagamento das quotas para um ponto equitativo tendo em conta a permilagem” – mas agora está a queixar-se do orçamento aprovado por não ter respeitado os critérios aprovados.

            Seja como for, o que agora está em causa é o saber se a deliberação que aprovou o orçamento para 2015/2016 é uma deliberação anulável porque esse orçamento não observava os critérios aprovados nas deliberações que tinham acabado de ser tomadas (na própria assembleia de 04/05/2015).

            Posto isto,

            Esta questão tinha sido parcialmente objecto de um julgamento na decisão da matéria de facto que já condicionava a resposta de direito, ao dizer, no ponto 20 dos factos provados, que o orçamento referido em 18, atendeu aos critérios deliberados e aprovados em 2005 (ou melhor: os critérios de 2005 ratificados na assembleia de 04/05/2015).

            Mas é agora que a questão tem de ser resolvida, para o que importa, antes de mais, saber quais foram os critérios.

                                                     ix)

Os critérios de repartição das despesas de 2015

            Aparentemente a questão é simples: os critérios que as partes trouxeram a estes autos são os critérios que constam do ponto 12 dos factos provados, ou seja, são os critérios resultantes de duas deliberações de 2005, ratificados na assembleia de 04/05/2015.

            A complicar a questão, no entanto, os condóminos deliberaram alterar o regulamento do condomínio, em parcial contradição com o que tinham acabado de ratificar.

            Com efeito, na deliberação referida no ponto de facto provado sob 12/1, a assembleia aprovou o seguinte, na parte que agora interessa: “que fosse alterado para 10%, o montante distribuído para as arrecadações e 90% para os parqueamentos.”

            Ora, no ponto de facto provado sob 12/3 a alteração ao regulamento foi no sentido de “nas caves as despesas são repartidas em 85% pelo número de parqueamentos e 15% pelo número de arrecadações.”

            Ora, isto, como se vê, é contraditório.

            Mas, ao mesmo tempo, é um erro evidente de escrita. Aquilo que tinha sido aprovado era que 10% seriam para as arrecadações e 90% para os parqueamentos. E na subsequente deliberação pretendia-se apenas consagrar, no regulamento, aquilo que tinha acabado de ser aprovado, e só por lapso é que se aprovou a distribuição que tinha acabado de ser rejeitada. Quer isto dizer que o ponto 3 do facto provado sob 12 deve ser lido como consagrando a repartição de 10% para as arrecadações e 90% para os parqueamentos.

            Esclarecida esta aparente divergência, sabe-se agora que os critérios de repartição de despesas são aqueles que constam do ponto 12/1 e 2 da deliberação do 04/05/2015.

            Ou seja, são os seguintes:

i) O orçamento era subdividido em três partes, habitação, comércio e caves.

ii) No da parte habitacional, seria repartido pelas fracções aplicando-se o critério da tipologia.

iii) No da zona comercial seria repartido pelo critério das permilagens.

iv) No das caves seria repartido em 90% pelo número de parqueamentos e 10% pelo número de arrecadações.

v) A cave -3 não pagava pelos parqueamentos por estar fechada;

vi) A cave -3 tinha de pagar parcialmente o consumo energético; ou seja, o consumo energético (apurado através de um contador) tinha de ser dividido equitativamente pelas três caves;

                                                      x)

            O orçamento de 2015/2016 não observou os critérios aprovados pelas deliberações anteriores

            Falta agora saber se estes critérios foram ou não observados, no orçamento para 2015/2016 que foi reproduzido no novo ponto 20 dos factos provados. 

            Ora, é desde logo evidente que o orçamento para 2015/2016 elaborado pela administradora do réu não aplicou estes critérios:

            Assim, as despesas do orçamento da parte habitacional, não foram repartidas pela tipologia – t1, t2 e t3 –, mas sim supostamente pela permilagem das fracções habitacionais somada às permilagens dos estacionamentos pertencentes a essas fracções. Permilagem que, aliás, não é coincidente com aquela que consta do título constitutivo da propriedade horizontal junta aos autos depois de apresentada pelo réu (a fls. 138 e segs).

            No que toca ao orçamento da parte comercial, a permilagem de uma das lojas teve também em conta o estacionamento triplo, quando só devia ter entrado a permilagem das lojas.

            E em relação às despesas do orçamento da parte das caves, a divergência com os critérios é mais que muita:

            – não foi observada a repartição de 10% para as arrecadações e 90% para os parqueamentos como devia, e nem sequer a repartição de 15% para aquelas e 85% para estas, mas foi tudo repartido tendo em conta as supostas permilagens [o que resulta de duas constatações simples: se se somarem os valores atribuídos às arrecadações e os valores atribuídos às garagens e estacionamentos, dá cerca de 23,54% para aquelas e 76,46% para estes; por outro lado, uma garagem com a permilagem de 3,94 corresponde a 75,85€, e uma arrecadação com a permilagem de 0,88 corresponde a 16,94€, tal como corresponderia se fosse a suposta permilagem o critério, com erros de cêntimos resultante de arredondamentos; mas as permilagens que constam não têm nada a ver com as permilagens do título junto aos autos: por exemplo, a fracção A é dita ter, como a fracção B, 3,94 de permilagem, quando a fracção A tem a permilagem de 45,58 e a fracção B tem 0,68];

            – os parqueamentos das fracções habitacionais não entraram nesta repartição (como até resulta de terem entrado na repartição de despesas da parte habitacional);

            – na repartição da zona das caves, em vez de entrarem os parqueamentos, ou os estacionamentos, o que entrou foram as fracções de estacionamento, que são coisas diferentes;

            – as fracções de estacionamento da cave -3 entraram no cálculo, como tais, e não no seu conjunto para a repartição equitativa do consumo energético.

            Ou seja, o orçamento de 2015/2016 não teve, manifestamente, a mais pequena preocupação que fosse em observar os critérios que tinham acabado de ser aprovados com a ratificação dos deliberados em 2005.

                                                     xi)

            Da irrelevância da desconformidade do orçamento com as deliberações/ratificações dos pontos 1, 2 e 3 da assembleia de 04/05/2015

            Mas como se disse acima, as deliberações/ratificações de 04/05/2015, não passaram a fazer parte, nem têm condições para passar a fazer parte, do título constitutivo da propriedade horizontal, nem do regulamento do condomínio. E o mesmo se verifica quanto às deliberações de 2005.

            Pelo que, o facto de o orçamento de 2015/2016 não estar de acordo com tais deliberações (de 2015, que ratificaram as deliberações de 2005), como manifestamente não está, não é motivo de anulação da deliberação que o aprovou.

            As deliberações dos condóminos não são nulas ou anuláveis por serem contra outras. Elas só são anuláveis se forem contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados, não se forem contra outras deliberações anteriores, mesmo que estas tenham sido aprovadas por unanimidade (art. 1433/1 do CC – neste sentido, veja-se Sandra Passinhas, obra citada, pág. 80 e 239).

                                                     xii)

            Da impossibilidade de consideração de outra causa de pedir a anulação da deliberação que aprovou o orçamento

            É certo entretanto, que o orçamento de 2015/2016 pode estar em contradição com o regulamento do condomínio (faltaria saber se o aí estabelecido é válido, designadamente se não está nas mesmas condições do elaborado de forma abusiva pela promotora do empreendimento do caso decidido no ac. do STJ de 12/11/2009, 5242/06.2TVLSB.S12015, citado acima), mas quanto a isso nada se sabe em concreto, nem o tribunal recorrido ou este tribunal o tinham de averiguar, porque a causa de pedir a anulação da deliberação que aprovou o orçamento não era a desconformidade com o regulamento do condomínio (tanto que a autora nunca o apresentou para ser junto aos autos). E não sendo as causas de anulabilidade de conhecimento oficioso, o tribunal não pode averiguar as causas que puderem aparecer como relevantes, mas apenas aquelas que tiverem sido invocadas em concreto.

            É certo, por outro lado, que o orçamento não está em consonância com o critério supletivo do art. 1424/1 do CC, mas, sabendo-se que o regulamento do condomínio contém matéria sobre o assunto (conforme resulta do ponto 12/3 dos factos provados, com referência ao ponto 23/1 do regulamento), o critério supletivo legal não é aplicável sem mais (pode-o ser em parte, se o regulamento não regular toda a matéria).

            E como não se pode dizer que o orçamento aprovado por aquela deliberação estabelece uma forma de repartir as despesas que seja diferente do que consta do regulamento, também não se pode dizer que tivesse de ser aprovada pela maioria qualificada referida acima. Por isso também por esta via não pode ser anulada a deliberação.

                                                    xiii)

            Os condóminos não se podem excluir do pagamento das despesas comuns

            No seu recurso, a autora tece inúmeras considerações sobre as regras do art. 1424, n.ºs 1 e 2, do CC, entre elas dizendo que a lei não permite nunca a exclusão de algum dos condóminos de contribuir para o pagamento daquelas despesas e invoca os princípios da incindibilidade e da indivisibilidade das partes comuns, previsto no art. 1420 do CC, norma imperativa.

            Quanto a isto diga-se que, por um lado, de nada do que antecede resulta que algum dos outros condóminos tenha sido dispensado de pagar parte das despesas. Elas foram calculadas de outro modo e metidas noutro lado, mas todos eles pagam, como se vê nos quadros que constam do ponto 20.

            Por outro lado, os quadros do ponto 20, que se referem ao ano de 2005, demonstram que a autora, ela sim, foi dispensada de pagar (e isso, indiciariamente, de 2005 a 2015 e mesmo antes) quase tudo o que devia pagar como proprietária de toda a cave -3, pagando por ela apenas uma parte dita equitativa do consumo energético, a pretexto de que a cave -3 estaria fechada, como se vê do que se disse acima quanto aos critérios apurados.

            Ora, não havendo notícia de que o encerramento da cave -3 decorra de qualquer causa de força maior, aquela dispensa de pagamento terá, ela sim, violado aquela norma imperativa. O que seria tanto mais significativo se, como se vai referindo no processo, tiver sido a existência da cave -3 a originar a necessidade das bombas de extracção de água e de o inerente custo acrescido com a electricidade.

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            Em suma, também quanto às deliberações de Maio de 2015 não procede nenhum dos argumentos do recurso da autora.

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            Pelo exposto, julga-se totalmente improcedente o recurso.

            Custas pela autora.

            Lisboa, 19/01/2017

            Pedro Martins

            1º Adjunto

            2º Adjunto