Proc. 852/08.6TMLSB-C.L1 do Juízo de família e menores de Lisboa – Juiz 4

              Sumário:

        I- Um despacho que dá sequência a um pedido de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais e marca uma conferência de pais, não é susceptível de recurso.

      II- Os pais não podem faltar sem justificação à conferência para que foram convocados pelo tribunal.

        III- Não é justificação da falta, o facto de discordarem da convocação da conferência, por entenderem que a mesma é ilegal ou inútil.

              Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados:

      Este processo diz respeito a uma alteração à regulação do exercício das responsabilidades parentais relativa a F, filho de P, que é o requerente, e de M, que é a requerida.

              A regulação foi feita num acordo de 13/05/2008 (tinha o filho um ano de idade) e já foi alterada em 29/09/2010.

              Na conferência de pais, que ocorreu a 21/10/2016, foram decididos, por acordo (homologado) entre mãe e pai, todos os aspectos da regulação, à excepção dos alimentos a prestar pelo pai ao filho, tendo o processo prosseguido com o fim de fixar esses alimentos, com julgamento que acabou por ser marcado para 10 e 11/04/2018.

              A 19/03/2018, o pai veio requerer a alteração do acordo homologado, alegando que, por decisão da sua entidade patronal (que é a M-Portugal) a partir de 01/06/2018 seria transferido para Portugal, passando de novo a trabalhar e a viver aqui (juntou comprovativo do alegado), o que se pode prolongar por vários anos ou tornar-se mesmo definitivo, pelo que, se e enquanto assim sucedesse, não se justificaria que se mantivesse o regime em vigor (o qual devia vigorar apenas se e enquanto ao pai estivesse a viver no estrangeiro), devendo o menor passar a ficar a viver com ambos, em semanas alternadas; isto teria necessariamente efeitos nos alimentos a prestar, que deixavam de se justificar, passando antes a haver despesas a comparticipar.

              Em consequência, o Sr. juiz, por despacho de 22/03/2018, considerou prejudicada a realização do julgamento e em sua substituição designou uma nova conferência de pais, para 10/04/2018, a fim de ser apreciada a pretensão do requerente.

              A mãe, a 03/04/2018, veio dizer entre o mais, que: foi acordado e homologado, com trânsito em julgado, o regime da regulação à excepção da questão dos alimentos; para se poder requerer uma alteração ao regime regulado têm de ocorrer factos supervenientes à fixação de tal regime que, pela sua importância e significado, aconselhem a alteração do mesmo; o pedido formulado pelo pai é inepto pela existência do referido trânsito em julgado; a poder ser feito, teria que o ser num outro incidente de alteração, que não neste; só pode ser formulado quando, efectivamente, ocorrerem alterações relativamente aos pressupostos de facto que estiveram subjacentes ao acordo e não perante a mera previsão de tais factos acontecerem; assim será óbvia a inutilidade do agendamento da conferência de pais para apreciar tal pedido; a mãe manifesta, desde já, o seu total desacordo à proposta apresentada pelo pai, porque, para além do que antecede, é absolutamente desajustada da realidade e atentatória dos interesses do menor; por isso e a fim de evitar a realização de uma diligência absolutamente inútil e ilegal, informa desde já que não comparecerá à referida conferência de pais (registe-se que a mãe dizia que o julgamento designado o dia 10/04/2018, foi dado sem efeito tendo em conta as razões apresentadas pela requerida no seu requerimento com a referência n.º 28584706, do passado dia 20/03/2018. Não se vê que possa ter sido assim, mas este apenso de recurso não contém elementos suficientes para elucidar a afirmação que, de qualquer modo, não interessa desenvolver e que se registou apenas para o que se dirá mais à frente).

              No dia 10/04/2018, data para que estava designada a conferência, a mãe não compareceu e por isso foi condenada em 2 UC multa; quanto às questões levantadas pela mãe, o tribunal disse que:

             [Tê]m aqui aplicação os arts 986 e seguintes do Código de Processo Civil, por força do art. 33 do Regime Geral do Processo Tutelar Civil.

         Estamos perante um processo de jurisdição voluntária, em que o juiz poderá adequar as formalidades da lei ao caso concreto, desde que respeite os direitos das partes, nomeadamente, o princípio do contraditório.

          Ora, no caso concreto, estando a correr um incidente de alteração da regulação das responsabilidades parentais proposto pelo pai e tendo surgido uma circunstância superveniente na sua vida, ainda que “futura”, faz todo o sentido aproveitar este mesmo apenso e apreciar estes novos factos e intenções do pai.

         Não faria sentido que o pai tivesse que propor um novo incidente com todos os custos que isso implica, nomeadamente, temporais, quando o que está aqui em causa são os superiores interesses da criança, que tem direito a ver a sua situação com os progenitores resolvida com a brevidade necessária.

         Porém, ainda que assim não fosse, teríamos de ter em conta o disposto no art. 6 do CPC e o dever de gestão processual (aí consagrado) que incumbe ao juiz, nomeadamente, em providenciar pelo andamento célere do processo, respeitando sempre os direitos das partes.

          Ora, no caso concreto na sequência do requerimento apresentado pelo pai em 19/03/2018 […], o tribunal diligenciou pela marcação desta diligência, tendo as partes sido notificadas em devido tempo para o efeito […].

          Mais se diga que relativamente à invocada ineptidão citada pela mãe, a mesma não colhe porquanto, por qualquer uma das partes, perante factos supervenientes e o que aqui nos traz é que um deles poderá suscitar ao tribunal a sua apreciação e obter uma decisão por parte deste último.

           Pelo exposto, indefere-se o invocado pela requerida e condena-se a mesma pela falta na presente diligência em 2 UC.

              A mãe vem (depois de 20/04/2018) recorrer deste despacho – querendo que ao recurso fosse atribuído efeito suspensivo, o que não justificou – terminando as suas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem na parte minimamente útil, cortando-se apenas algumas das muitas repetições e fazendo-se algumas simplificações):

         a- Pelo presente recurso, vem impugnar a legalidade do despacho do Sr. Juiz de 10/04/2018, porquanto o mesmo violou: a) o princípio do caso julgado, consignado nos arts. 580/1, 619/1 e 612, todos do CPC; b) a contrario, o consignado no art. 42/1 do RGPTC; c) e ainda o disposto, conjugadamente, no art. 7/2 e 417/2 do CPC e 27/1 do Regulamento das Custas Processuais.

         b- Termos em que se deverá – verificadas e confirmadas as ilegalidades de que o despacho recorrido enferma -, decretar a sua imediata revogação, com todos os efeitos legais.

         […]

         i- O Sr. Juiz recorrido em vez de ter marcada nova conferência de pais, devia ter considerado absolutamente inepto o requerimento de 19/03/2018, por não ser admissível a pretensão nele formulada, atento o disposto no art. 42/1 do RGPTC

         […]

         k- Encontrando-se regulado o exercício das responsabilidades parentais, por decisão judicial já transitada em julgado, não podia o Sr. Juiz alterar tal decisão por despacho ou sentença a proferir neste processo, pois que está esgotado o seu poder jurisdicional.

         […]

         m- Foi essa chamada de atenção que a mãe se permitiu fazer ao Sr. Juiz, lembrando-lhe que a marcação da conferência de pais para apreciar tal pedido de alteração do regime em vigor, para além de ser um acto inútil, era também ilegal.

         n e u- Por isso, a mãe informou o Sr. Juiz que não compareceria a tal conferência de pais, assim justificando a sua anunciada falta à mesma, até para que não se pudesse concluir que ela acabava por validar tal decisão do Sr. Juiz,

         […]

         p- Para além disso, o pedido de alteração só poderia ser formulado e ter cabimento legal se, efectivamente, tivessem ocorrido alterações relativamente aos pressupostos de facto subjacentes ao acordo que foi celebrado, que, pela sua importância, impusessem tal alteração.

         […]

         q- O que, em todo o caso e isso é extremamente importante frisar, terá de ser apreciado e tramitado noutro apenso.

         s/t- Tal pedido de alteração não se pode fundamentar na ocorrência futura de tais factos, ainda que a mesma seja certa.

         […]

         w- Na nova conferência, o Sr. juiz, para além de ter determinado uma alteração ao regime em vigor – [a mãe diz no art. 31 das alegações que “nem sequer se pronunciará quanto à justeza da alteração ao regime que se encontrava em vigor […] porque, a montante da sua prolação, o processo não era o próprio, nem o Sr. Juiz tinha competência para proferir tal decisão] -, condenou a recorrente no pagamento de 2 UCs por ter faltado à diligência em causal.

           […]

      y- Nenhum dos argumentos utilizados no despacho recorrido é susceptível de justificar a opção do Sr Juiz:

        z- Em primeiro lugar, não ocorreu na vida do pai “uma circunstância superveniente, ainda que futura”

       aa- Essa conclusão só expressa um raciocínio absurdo e contraditório nos seus próprios termos, pois que um facto ou circunstância superveniente só se pode temporalmente localizar no passado e nunca no futuro. É absolutamente destituído de sentido, sustentar a possibilidade de ocorrer “uma circunstância superveniente, ainda que futura”

          […]

     cc- tal pedido de alteração, fundado em tal circunstância, nunca poderia ter sido deduzido e apreciado no apenso em referência, o qual está definitivamente terminado, excepção feita à pensão alimentar a prestar ao menor pelo pai.

        […]

       ff- O facto do processo ter uma natureza de jurisdição voluntária, não pode permitir ao Sr. Juiz recorrido ampliar o seu poder jurisdicional para se pronunciar num caso que está definitivamente julgado nesse processo.

         […]

       hh e ii- O princípio do caso julgado, para além de ser estruturante, tem dignidade constitucional, pelo que nunca poderá ser postergado com a invocação dos princípios da celeridade processual e o de economia processual e de meios.

         […]

         mm- Atento o que se deixou referido anteriormente, a realização da conferência de pais tem de se considerar como absolutamente ilegal, razão, pela qual, ninguém pode ser sancionado por não comparecer a tal diligência.

              O pai contra-alegou, tendo apresentado a seguinte síntese das suas contra-alegações (também com algumas simplificações):

      1- Ao presente recurso deve ser atribuído efeito meramente devolutivo – artigo 32/4 do RGPTC.

          2- Apesar de a mãe não ter delimitado objectivamente o recurso, especificando expressamente a parte do despacho de 10/04/2018 de que recorre, o pai assume que o objecto do recurso se circunscreve à parte da decisão que indefere o requerimento por si apresentado em 03/04/2018 e a condena em 2 UC por ter faltado à conferência de pais.

          3, 6 e 7. A decisão do tribunal a quo na parte em que indefere a pretensão da mãe de ver declarada a ineptidão do pedido/requerimento e a inutilidade da conferência de pais, não é uma “decisão que admita um articulado (…) ou meio de prova”, nos termos previstos no art. 644/2-d do CPC, nem se enquadra em nenhuma das outras alíneas desse artigo, pelo que apenas pode ser impugnada com o recurso que venha a ser interposto a final (art. 644/3 do CPC), pelo que o recurso não deve ser admitido, por ser intempestivo.

           4- O requerimento apresentado pelo pai em 19/03/2018 foi admitido liminarmente mediante despacho de 22/03/2018.

           5- O despacho de 22/03/2018 é irrecorrível – art. 630 do CPC.

          8- A admissibilidade do recurso não pode ser apreciada nos termos do art. 32/1 do RGPTC, porquanto a mãe não impugna a decisão do tribunal que definiu o regime provisório de regulação das responsabilidades parentais.

          9- A única decisão recorrível e que pode ser apreciada pelo tribunal ad quem é a que condenou a mãe em multa.

       10- Por mera cautela de patrocínio, refira-se que o despacho proferido pelo tribunal a quo em 10/04/2018 não viola o princípio do caso julgado.

      11- As decisões proferidas no âmbito de processos de jurisdição voluntária não adquirem a imutabilidade do caso julgado, própria da generalidade das decisões judiciais – art. 988/1 do CPC.

         12- O acordo alcançado em 21/10/2016 […] não tem força de caso julgado, pelo que o poder jurisdicional do juiz não está esgotado.

         13- Tendo o tribunal a quo que tomar uma decisão quanto à pensão de alimentos devida ao menor, faz todo o sentido que, ao abrigo dos princípios da actualidade (art. 4 da Lei da Promoção e Protecção aplicável aos processos tutelares cíveis: art. 4 do RGPTC) e da adequação à evolução da situação de facto (arts 28, 42 e 43 do RGPTC), a pretensão do pai de alterar o regime de exercício das responsabilidades parentais, seja apreciada nos presentes autos.

         14- O despacho recorrido não viola o disposto no art. 42 do RGPTC:

         15- O regime de visitas actualmente em vigor (o pai passa até 6 dias consecutivos por mês na companhia do menor) apenas se justifica pelo facto do pai trabalhar e viver na Polónia.

         16- O regresso do pai a Portugal a partir de 01/06/2018 é um facto certo e superveniente.

         17- A aplicação do art. 42 do RGPTC não pressupõe que as novas circunstâncias se verifiquem no momento em que é tomada a decisão de alterar o regime de regulação das responsabilidades parentais, tanto mais que o regime provisório fixado pelo Tribunal apenas produz efeitos a partir de 01/06/2018.

         18- A decisão do tribunal a quo foi tomada com base em critérios de conveniência e oportunidade – art. 987 do CPC — privilegiando o superior interesse do menor.

         19- Os presentes autos são autos de alteração da regulação das responsabilidades parentais e encontram-se pendentes, pelo que não faz qualquer sentido, por razões de celeridade e economia processual, a pendência de novo processo com o mesmo âmbito.

         20- Os motivos invocados pela mãe no requerimento de 03/04/2018 não são susceptíveis de justificar a sua falta à conferência de pais […]

              O MP aderiu às alegações do pai.

              A mãe foi notificada – por força dos arts. 654 e 655 do CPC – para se pronunciar sobre a questão do efeito do recurso e sobre a inadmissibilidade do mesmo e nada disse.

                                                                 *

            Questões que importa decidir: as questões prévias da inadmissibilidade de parte do recurso e do efeito do recurso; a ilegalidade do despacho de 10/04/2018; a condenação da mãe em multa.

                                                                 *

          Os factos que interessam à decisão destas questões são os que constam do relatório que antecede.

                                                                 *  

                                       Da admissibilidade do recurso

           O que o juiz fez no despacho subsequente de 10/04/2018 foi apenas explicar à mãe que as razões dela contra o despacho de 20/03/2018 não eram procedentes. No despacho de 10/04/2018 não se decide admitir o incidente de alteração, nem fazer a conferência que a mãe considera inútil. Assim, o recurso da mãe, nesta parte, dirige-se contra um despacho que não contém as decisões que a mãe lhe imputa.

              É no despacho de 20/03/2018 que se decidem as questões que a mãe aqui põe em causa.

        Mas esse despacho limita-se a mandar seguir um incidente de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais, marcando a conferência para ela.

              Ora, um despacho que manda seguir um incidente processual não é uma decisão recorrível autonomamente (art. 644/2, do CPC, e art. 33/1 do RGPTC, ambos a contrario). Tal como não é susceptível de recurso um despacho que admite uma petição inicial e manda citar o réu para ela (art. 226/5 do CPC). Querendo impugnar tal decisão, é no recurso da decisão final que o deve fazer (art. 644/3 do CPC).

            Não sendo admissível recurso de tal despacho, muito menos poderia ser recorrível o despacho que, depois dele, se pronunciasse sobre razões invocadas contra o mesmo.

              Assim sendo, não se admite o recurso em causa, nessa parte.

                                                                 *

              E não importa que a mãe se pudesse queixar – mas não se queixa – de não ter sido observado o contraditório (já que o pedido de alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentes devia ter sido notificado à mãe antes de se marcar a conferência de pais – art. 42/3 do RGPTC – e não o foi). Mas o facto de não o ter sido corresponde a uma nulidade (art. 195 do CPC) que teria de ser arguida e não o foi.

                                                                 *

Do caso julgado

              Apesar do que antecede e porque o caso julgado é uma excepção dilatório de conhecimento oficioso (art. 577/-i e 578, ambos do CPC), diga-se que a mãe não tem nenhuma razão na afirmação de que esta se verifica.

              Nos processos de jurisdição voluntária, como é o caso das alterações de regulação do exercício das responsabilidades parentais (art. 12 do RGPTC), as resoluções podem ser alteradas, sem prejuízo dos efeitos já produzidos, com fundamento em circunstâncias supervenientes que justifiquem a alteração, dizendo-se supervenientes, no que interessa ao caso dos autos, aquelas ocorridas posteriormente à decisão (arts. 988/1 do CPC e 42/1 do RGPTC, este na perspectiva dos pressupostos para se poder pedir a alteração).

              Ora, sendo a regulação que estava em vigor destinada à situação de facto em que o pai estava a viver no estrangeiro, é evidente que, quando essa situação se alterar, passando o pai a viver em Portugal, se justifica a alteração da regulação, quanto à questão da residência, da guarda, eventualmente das visitas, etc.

              É certo que a mãe pode dizer que à data essa situação ainda não se tinha verificado.

              Mas o pai não pediu a alteração com efeitos de imediato, mas apenas para quando a alteração se verificasse. E foi isso que acabou por ser decidido pelo tribunal, fixando um regime provisório a vigorar apenas a partir do dia 01/06/2018, naturalmente no pressuposto da alteração da situação do pai nessa data.

              A isto, a mãe pode responder duas coisas: uma é que não se justifica que se esteja a alterar uma regulação apenas para quando a situação se alterasse. Outra é que, assim sendo, não se justificaria que se desse sem efeito a designação da data de julgamento da questão dos alimentos, pois que a decisão desta questão teria utilidade enquanto a situação não se alterasse (tanto mais, podia acrescentar, que a questão de alimentos deve ser decidida também em relação ao passado, pois que a fixação dos alimentos por norma retroage à data do pedido, da fixação ou da alteração).

                Mas, quanto à primeira objecção, compreende-se bem que se o tribunal tivesse razões para levar a sério as alegações do pai – e parece haver razões para isso, tanto que a mãe não as pôs em causa no essencial -, então justificava-se, pelas razões invocadas pelo tribunal, que faltando apenas cerca de dois meses para que a situação se alterasse, o tribunal fizesse desde logo o necessário para que a nova regulação pudesse entrar em vigor no dia em que a situação se alterasse. É que a solução contrária daria azo a que a situação de facto se alterasse e a regulação se mantivesse a mesma por um período de tempo que pode ser mais ou menos longo, em prejuízo potencial da relação entre o pai e o filho.

              Quanto à segunda objecção, lembre-se, primeiro, que a mãe diz que o julgamento da questão dos alimentos foi dado sem efeito por requerimento seu e, fosse como fosse, ela não pôs em causa o facto de ele ter sido dado sem efeito. Segundo, alterando-se a situação do pai, que passava a viver em Portugal, e sendo possível que houvesse alteração na questão da residência e/ou do tempo que o pai passava com o filho, compreende-se que, sempre com a reserva de que as alegações do pai merecessem credibilidade, não se perdesse tempo a fazer o julgamento de uma questão – alimentos – que podia ser influenciada pela alteração das outras.

              Em suma, não se verifica a ofensa ao caso julgado, porque o caso julgado que se forma neste tipo de processos é um caso julgado sujeito à influência da alteração das circunstâncias e as decisões tomadas tiveram em vista alterar a regulação apenas para se e quando a situação de facto se alterasse.

                                                                 *

                                                Do efeito do recurso

              Resta assim o recurso contra a decisão de aplicação da multa.

              A mãe entende que o recurso tem efeito suspensivo, sem ao menos justificar tal entendimento.

              O tribunal recorrido atribui-lhe o efeito meramente devolutivo.

              Mas, limitado o recurso à questão da multa, este tem de ter efeito suspensivo da decisão que a aplicou, por força do art. 647/3-e do CPC, aplicável por força do art. 33/1 do RGPTC, a que não se opõe o art. 32 do RGPTC porque este rege apenas para as “decisões que se pronunciem definitiva ou provisoriamente sobre a aplicação, alteração ou cessação de medidas tutelares cíveis”.

                                                                 *

                                                          Da multa

              O art. 35/4 do RGPTC – aplicável ao incidente de alteração do regime, por força do art. 42/5 do RGPTC – dispõe que “os pais são obrigados a comparecer pessoalmente sob pena de multa, apenas podendo fazer-se representar por mandatário judicial ou por seus ascendentes ou irmãos, com poderes especiais para intervir no ato, no caso de estarem impossibilitados de comparecer ou de residirem fora do município da sede da instância central ou local onde a conferência se realize […].”

              O que tem especialmente por fim possibilitar o que se prescreve no art. 37/1 do RGPTC: “Estando ambos os pais presentes ou representados, o juiz procura obter acordo que corresponda aos interesses da criança sobre o exercício das responsabilidades parentais.”

              Assim, os pais não podem faltar – nem sequer, por norma, fazer-se representar – às conferências para que são convocados pelo tribunal, sem uma razão válida para o efeito.

         Ora, a discordância de uma pessoa com a decisão do tribunal, ou o seu entendimento pessoal de que o acto para que foram convocados é uma inutilidade, não são uma daquelas razões. O entendimento do tribunal, até que seja censurado por um tribunal de recurso, sobrepõe-se ao da parte.

              Pelo que se imponha que, como o fez, o tribunal condenasse a mãe em multa pela falta sem um motivo válido para o efeito.

                                                                 *

              A mãe não diz nada contra o montante da multa.

              A multa podia ser fixada entre os limites legais de 0,5UC a 5UC – art. 27/1 do RCP – e a multa ficou em menos de 2/5 do intervalo, sendo que a falta de mãe deu origem ao atraso no incidente e a culpa da mãe é elevada, por se tratar de um acto propositado.

              Assim, considera-se que não há razões para alterar o valor fixado.

                                                                 *

              Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso contra a multa e não se admite o recurso contra o resto do despacho de 10/04/2018.

              Custas, na vertente de custas de parte (já que não há outras), pela mãe que decaiu no decurso.

              Lisboa, 08/11/2018

              Pedro Martins

              1.º Adjunto

              2.º Adjunto