Voto de vencido:
Tendo em conta os acórdãos que relatei – do TRL de 28/09/2017, proc. 418/13.9TBCDV, e do TRL de 13/09/2018, proc. 3181/14.2TBVFX-2 – embora com actualização de alguns factores dado a evolução das circunstâncias no tempo entretanto decorrido, entendo que a indemnização pelos danos patrimoniais podia ter sido fixada em, pelo menos, 152.355,59€, pelo que o valor de 120.000€ peca por defeito, não por excesso e, assim, julgaria o recurso improcedente.
Chego àquele valor com base no capital necessário à obtenção, durante o resto da vida do lesado (determinado não com base na duração da vida activa, mas com base na esperança média de vida – acs. do STJ de 19/02/2004, revista 4282/03; de 27/05/2004, revista 1694/04; de 04/06/2005, proc. 1166/10.7TBVCD.P1.S1; de 20/05/2010, proc. 103/2002.L1.S1; de 15/03/2012, proc. 4730/08.0TVLG.L1.P1; de 09/11/2017, proc. 2035/11.9TJVNF.G1.S1, e do TRP de 23/10/2014, 148/12.9TBVLP.P1), de um rendimento anual igual ao perdido (de facto ou potencialmente) e que se esgote no fim desse período.
E isso considerando, no caso, a remuneração base média à data do acidente, isto é, 13/11/2013, ou seja, no caso, 911,50€ (https://www.pordata.pt/Portugal/Sal%C3%A1rio+m%C3%A9dio+mensal+dos+trabalhadores+por+conta+de+outrem+remunera%C3%A7%C3%A3o+base+e+ganho-857)
O que dá uma perda anual de 911,5€ x 12 [apenas 12, no caso] = 10.938€ x 23,266% = 2544,84€.
Para obter o valor indemnizatório desta perda anual futura, pode-se utilizar a seguinte forma de cálculo – base de um posterior juízo de equidade -, fórmula também utilizada pela lei (por exemplo na Portaria 377/2008, de 26/06, embora com outra aparência e com factores concretizados de forma diferente), que é a seguinte:
C = [(1 + i)N – 1 / (1 + i)N x i] x P
em que
C = capital;
P = prestação a pagar no 1º ano;
n = o nº. de anos de esperança de vida; e
i = taxa de juro, sendo esta, por sua vez, calculada, assim:
i = (1 + r / 1 + k) – 1
em que:
r = taxa de juro nominal líquida.
k = taxa anual de crescimento de P (inflação + ganhos da produtividade + promoções profissionais).
Isto para que a variável i não seja a taxa de juro nominal líquida da aplicação financeira, mas sim a taxa de juros real líquida.
[Quanto ao cálculo do i:
r = taxa de juro nominal líquida, que é actualmente, quando muito, de 0,03% (resulta, por alto, da média da taxa de 2013 a 2020: Qual a percentagem que os particulares recebem pelo dinheiro que depositam nos bancos, à ordem ou a prazo?: https://www.pordata.pt/Portugal/Taxas+de+juro+de+dep%C3%B3sitos+(m%C3%A9dia+anual)+de+particulares+total+e+por+tipo-2850🙂
k = taxa anual de crescimento de P (inflação de 0,56% [tendo em conta a média da verificada de 2013 a 2021 : https://www.inflation.eu/pt/taxas-de-inflacao/portugal/inflacao-historica/ipc-inflacao-portugal.aspx] + ganhos da produtividade de 0,1% + promoções profissionais de 0,1%) = 0,76%
Assim:
i = (1 + r / 1 + k) – 1
= 0,0072%
Quanto a N: o autor tinha, à data do acidente, 17 anos, pelo que, partindo-se de uma esperança média de vida de 77,4 anos (grosso modo, a esperança média de vida de um homem em Portugal), o autor tinha uma esperança de vida de 60 anos.
Ora, com base nesta fórmula, o valor obtido seria o de:
C = [(1+ 0,0072%)60 – 1 / (1+0,0072%)60 x 0,0072%] x 2544,84€
C = 152.355,59€
E, obtido este resultado, segundo esta fórmula, não há que fazer a redução de 1/3, como o disse, por exemplo, o ac. do STJ de 14/04/2015, proferido no processo 723/10.6TBCHV.P1, não publicado mas com sumário em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2015.pdf, que censura essa dedução no caso do cálculo da indemnização ser fixado como acima, isto é, com base na consideração de que este “valor não representa já a soma de todos os rendimentos que o lesado iria previsivelmente auferir ao longo do período considerado, caso em que se justificaria essa redução (como no cálculo sugerido por Sousa Dinis [na CJ.STJ.IX.1.5] […S]eria contraditório [com o critério de cálculo seguido] operar a aludida redução: com esta, o capital obtido deixaria de cumprir o referido objectivo [de produzir um rendimento que se extinga no fim do previsível período de vida da vítima e que garanta as prestações periódicas correspondentes], não garantindo as aludidas prestações (ou de todas estas prestações, esgotando-se antes do termo do período considerado)”.
Não me pronuncio quanto ao valor dos danos não patrimoniais, porque o acórdão manteve o valor atribuído na 1.ª instância e o autor não recorreu.