Execução 7817/20.8T8SNT – Juízo de Execução de Sintra – Juiz 3

              Sumário:

              I – No requerimento de uma execução de valores decorrentes do incumprimento de um contrato abrangido pelo art. 2/1 do PERSI, o exequente tem de alegar que o executado foi integrado no PERSI, que as obrigações decorrentes deste regime para o credor foram observadas e que comunicou por escrito a extinção do PERSI e tem de fazer um início de prova documental de tudo isso (arts. 12 a 18 do DL 227/2012, 364 do CC e 574/2 do CPC).

              II – A falta de prova de que o credor cumpriu estas obrigações implica o preenchimento dos pressupostos de uma excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso conducente à extinção da execução.

              III – Pode haver mais de um PERSI no decurso de um mesmo contrato, pelo que o facto de a mutuária ter estado em incumprimento em 2015 não é impeditivo de um novo PERSI para um incumprimento em 2018.

              IV – O facto de o devedor invocar aquela excepção dilatória, porque o credor não cumpriu o regime imperativo do PERSI, que não pode ser substituído por um processo negocial paralelo, não o faz incorrer em abuso de direito.

              V – O facto de ter havido uma cessão de créditos para uma STC não tem influência no que antecede, pois que as limitações decorrentes do PERSI impõem-se ao cessionário do crédito.

              Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados:

              Em 09/06/2020, a A-STC, S.A. intentou uma execução comum sob a forma de processo sumário para pagamento de 44.481,81€ que está a seguir contra AI, AM e MR, por si e na qualidade de herdeiros de MJ, sendo certo que os dois últimos tinham sido executados enquanto comproprietários do imóvel hipotecado [1/8 de cada um dos executados e 5/8 deles todos como herdeiros] dando à execução uma escritura pública de mútuo com hipoteca, outorgada em 19/11/2008.

              No requerimento executivo, a exequente alegou o seguinte:

         1.º Por deliberação extraordinária do Conselho de Administração do Banco de Portugal, tomada em reunião extraordinária, no dia 03/08/2014, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 5 do art. 145-G do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo DL 298/92, de 31/12, foi aplicada uma medida de resolução ao Banco Espírito Santo S.A. e, nessa sequência, constituído o NOVO BANCO S.A.

         2.º Nos termos daquela mesma deliberação do CA do BdP, os créditos que eram da titularidade do BES, foram transferidas para a titularidade do NB, com efeitos à data daquela deliberação.

         […]

         4.º Mediante contrato de cessão de créditos celebrado em 18/03/2020, o NB, cedeu à exequente, um conjunto de créditos vencidos de que era titular, conforme resulta do contrato de cessão de créditos que ora se junta e aqui dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais como documento nº 1.

         […]

         6.º A referida cessão incluiu a transmissão de todos os direitos, garantias e acessórios inerentes ao(s) crédito(s) cedido(s), designadamente da(s) hipoteca(s) constituída(s) sobre o (s) prédio(s) em causa, nos termos do disposto no art. 582 do Código Civil.

         7.º O que faz com que, nos termos e para os efeitos do DL 42/2019 de 28/03, a exequente seja a actual titular dos créditos sub judice e ora peticionados.

         8.º No exercício da sua actividade, o BES, através de um contrato de mútuo com hipoteca celebrado em 19/11/2008, concedeu um empréstimo aos ora executados, no valor de 50.000€ – doc. 3 que aqui se junta e se dá por reproduzido e integrado para todos os efeitos legais.

         9.º Para garantia das obrigações assumidas, foi constituída hipoteca voluntária sobre o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Q sob o número 0000 da freguesia de Q.

         10.º A aludida hipoteca foi registada na referida CRP através da AP. 61 de 2008/10/23, conforme resulta da certidão predial permanente identificada que ora se junta e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais como doc. 4.

         11.º O imóvel dado de hipoteca ao banco mutuante é também propriedade dos dois últimos executados, os quais, de acordo com o referido na escritura de hipoteca, deram de hipoteca o imóvel para garantia do empréstimo concedido às mutuárias.

         12.º Conforme resulta do documento complementar anexo à escritura pública, ficou convencionado que o pagamento do referido mútuo seria efectuado em 204 prestações mensais, sucessivas e constantes, de capital e juros.

         13.º Ora, sucede que as executadas faltaram ao pagamento das prestações contratadas e devidas ao banco mutuante, não tendo pago as prestações que se venceram em 31/08/2018, tal como as prestações subsequentes.

         14.º À data do incumprimento, a taxa de juro contratual de 10,92% (7,92%, taxa juros remuneratórios de acordo com os critérios fixados no título executivo acrescida de 3% de sobretaxa de mora).

         15.º Apesar de instados para o respectivo pagamento, os executados jamais o efectuaram.

         [não tem os números 16 e 17]

         18.º O pagamento não se presume e a falta de pagamento de qualquer das prestações implica o vencimento de toda a dívida – cfr. artigos 781.º e 817.º do CC.

         19.º Assim, tendo os executados deixado de cumprir as obrigações emergentes do contrato acima referido, mostra-se em dívida, à data de 30/05/2020, as seguintes quantias: Capital em dívida: 37.493,48€; Juros de mora: 6.988,33€.

         […]”

              Com o requerimento executivo não foram juntas quaisquer cartas/comunicações aos executados.

              Por despacho de 01/06/2022, a exequente foi convidada, nos termos do artigo 734/1 do CPC, tendo por referência o artigo 726/2-b do CPC, “a documentar nos autos, no prazo de 10 dias, a abertura, tramitação e encerramento do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) e sua efectiva comunicação ao executado mutuário (cfr. artigos 2/1-b, 14 e seguintes e 18/1-b, do DL 227/2012, de 25/10, e 576/2 e 578, primeira parte, do CPC).”

              Nessa sequência, a exequente apresentou a 13/06/2022 três documentos [dois deles serão transcritos abaixo, de Nov2015 e Jan2016; um terceiro tem o seguinte teor, em síntese: é de 05/02/2016 e trata-se de uma comunicação dirigida à executada AI, de extinção do PERSI, por terem decorrido mais de 90 dias desde a integração em PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo].

              A executada AI, a 15/06/2022, veio responder que os documentos juntos respeitam apenas a 2015 e 2016 e que tinha feito um acordo com o NB e que o estava a cumprir, pelo que impugna os documentos. Por outro lado, releva que os documentos não dizem respeito aos demais executados ao contrário do imposto pelos artigos 2, 14 e 18 do DL 227/2012. Pelo que não estavam reunidas as condições / não estavam verificados os pressupostos legais para intentar a presente execução.

              Em 07/07/2022, foi proferido o seguinte novo despacho:

         As cartas ora juntas respeitam a um período anterior ao alegado incumprimento, que alegadamente ocorreu em 31/08/2018 (cfr. artigo 13.º do requerimento executivo), pelo que, antes de mais, deve a exequente esclarecer, em 10 dias, o que tiver por conveniente.

              A 14/07/2022 a exequente veio informar que:

         “O incumprimento do contrato por parte da executada foi reiterado ao longo dos últimos anos, tendo, por diversas vezes, sido negociado e alcançado acordo com o banco mutuante no sentido da regularização do incumprimento, como aliás decorre dos embargos de executado deduzidos.”

              Por despacho de 15/09/2022, foi facultado às partes o contraditório quanto à eventual verificação da excepção dilatória inominada de preterição de sujeição da executada ao PERSI.

              Os executados pronunciaram-se (seguindo de perto o que se diz no ac. do TRL de 21/05/2020, proc. 5585/15.4T8FNC-A.L2-2 que invocaram), em síntese, defendendo a verificação da excepção e a exequente pronunciou-se, em suma, defendendo a sua improcedência (o teor desta pronúncia é praticamente idêntico às alegações de recurso, transcritas abaixo).

                                                                 *

              Por despacho de 30/10/2022 o tribunal recorrido julgou verificada a excepção dilatória inominada de preterição de sujeição dos executados ao PERSI e, consequentemente, decidiu rejeitar a execução.

              A exequente vem recorrer deste despacho, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem na parte útil:

B. O intuito do DL 227/2012 é estabelecer princípios e regras a observar pelas instituições de crédito na prevenção e regularização das situações de incumprimento, criando uma rede extrajudicial de apoio aos clientes bancários no âmbito da regularização dessas situações através do mecanismo do PARI e PERSI.

C. Tanto assim é que, conforme comprovado documentalmente pela exequente no seu requerimento de 13/06/2022, o NB remeteu aos executados as cartas de integração no PERSI.

D. Tendo o referido procedimento acabado por ser extinto em virtude de não ter sido possível chegar a acordo com os devedores.

E. Não obstante, ao longo dos anos, o banco mutuante enviou várias cartas de interpelação aos mutuários, tendo igualmente encetado diversos contactos telefónicos com os mesmos, procurando sempre alcançar uma resolução extrajudicial do litígio que fosse vantajosa para ambas as partes.

F. Pelo que os executados têm perfeita consciência da situação de incumprimento, não se conseguindo extrair dos presentes autos qualquer elemento que permitisse concluir pela não recepção de qualquer comunicação da exequente no sentido de interpelar os executados.

G. A actuação da exequente sempre se baseou na observância dos ditames da boa-fé e no cumprimento dos deveres de diligência e transparência que lhe são aplicáveis, tendo encetado todos os esforços com vista à obtenção da regularização do empréstimo em situação de incumprimento, tendo reiteradamente interpelado todos os executados para o efeito.

H. A actuação do exequente constitui no plano substancial um procedimento extrajudicial de regularização da situação se incumprimento da executada, equiparado ao PERSI e que na tentativa de lograr solução para o problema, permitiu à executada manter o contrato em incumprimento.

I. Nenhum direito legítimo dos executados ficou prejudicado, tendo os mesmos completa consciência da situação de incumprimento aqui em crise.

J. Tem sido entendimento unânime na jurisprudência que tal conduta por parte [do credor] consubstancia, no plano substancial, um procedimento extrajudicial de regularização da situação de incumprimento dos devedores equiparado ao PERSI, na tentativa de encontrar uma solução para o problema, o que não aconteceu por culpa exclusiva dos próprios.

K. “A Lei não deve ser interpretada de forma absolutamente literal, devendo procurar-se reconstituir o pensamento legislativo a partir do seu texto, tendo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a Lei foi elaborada e as condições específicas em que é aplicada, conforme artigo 9 do CC.” – cfr. ac. do TRL de 06/06/2019.

L. Verifica-se assim que os executados beneficiaram materialmente de um conjunto de medidas da iniciativa do banco mutuante que deram plena concretização aos objectivos do PERSI.

M. Pelo que, não poderia o Juiz considerar, na decisão, factos principais diversos dos alegados pelas partes.

N. Não é ao exequente que compete alegar (e provar) encontrar-se o contrato de empréstimo em curso e o executado em mora, na data da entrada em vigor do DL 272/2015 [a exequente terá querido escrever 227/2012 – TRL], para efeitos de integração no PERSI, mas sim aos executados, enquanto matéria integradora na excepção dilatória inominada em causa nos autos.

O. Ao basear o conhecimento da referida excepção em factos principais não alegados nos autos pelos executados, o tribunal a quo violou o princípio do dispositivo.

              Os executados não contra-alegaram.

                                                                 *

              A fundamentação da decisão do tribunal recorrido foi a seguinte [em parenteses rectos este TRL colocou os números dos factos de que o tribunal recorrido se serviu como decorre do contexto; transcreveu também, quando relevante e na medida do relevante, as normas invocadas]:

         O DL 227/2012 de 25/10, que entrou em vigor em 01/01/2013 (cfr. artigo 40), estabelece, além do mais, os princípios e as regras a observar pelas instituições de crédito, na regularização extrajudicial das situações de incumprimento das obrigações de reembolso do capital ou de pagamento de juros remuneratórios por parte dos clientes bancários, respeitantes aos contratos de crédito referidos no n.º 1 do artigo seguinte (cfr. art. 1/1-b).

         Entre esses contratos de crédito encontravam-se os contratos de crédito garantidos por hipoteca sobre bem imóvel (cfr. art. 2/1-b, na redacção em vigor à data do alegado incumprimento, isto é, anterior àquela introduzida pelo DL 70-B/2021 de 06/08 – entrou em vigor em 07/08/2021, já após a propositura da presente execução).

         Analisando o caso concreto, verifica-se que:

         [1] Mediante outorga da escritura pública de 19/11/2008, o então BES concedeu um empréstimo a MJ e AI, no valor de 50.000€, empréstimo esse garantido por hipoteca.

         [2] O então BES, actualmente NB, é um banco e MJ e AI, pessoas singulares, eram clientes daquela instituição, sendo certo que a exequente não alegou que aquele contrato foi celebrado pelas mutuárias na prossecução de uma qualquer actividade comercial/ /profissional.

         Assim sendo, o contrato de mútuo supra referido estava abrangido pelo art. 2/1-b do DL 227/2012, na redacção originária.

         [3] Ora, de acordo com o alegado no requerimento executivo, as mutuárias deixaram de pagar as prestações desse empréstimo a partir de 31/08/2018.

         Deste modo, por força do disposto nos artigos 12 e 13 do DL 227/2012, o NB estava obrigado a desenvolver diligências no sentido de apurar as razões subjacentes ao alegado incumprimento e, mantendo-se o alegado incumprimento, deveria obrigatoriamente integrar a mutuária AI, ora executada e ainda, na qualidade de herdeiros da mutuária MJ, os três executados, no PERSI, nos termos previstos no art. 14/1 do DL

[12: As instituições de crédito promovem as diligências necessárias à implementação do PERSI relativamente a clientes bancários que se encontrem em mora no cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito.; 13: No prazo máximo de 15 dias após o vencimento da obrigação em mora, a instituição de crédito informa o cliente bancário do atraso no cumprimento e dos montantes em dívida e, bem assim, desenvolve diligências no sentido de apurar as razões subjacentes ao incumprimento registado. 14: 1 – Mantendo-se o incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito, o cliente bancário é obrigatoriamente integrado no PERSI entre o 31.º dia e o 60.º dia subsequentes à data de vencimento da obrigação em causa. […] 4 – No prazo máximo de cinco dias após a ocorrência dos eventos previstos no presente artigo, a instituição de crédito deve informar o cliente bancário da sua integração no PERSI, através de comunicação em suporte duradouro. […]]

         Efectivamente, apenas a demonstração do cumprimento daquela integração, por referência ao contrato de mútuo, e apenas após a extinção do respectivo PERSI, era permitido ao NB resolver o contrato em causa/declarar o vencimento antecipado da dívida e intentar a execução de que os presentes autos constituem um apenso para cobrança do direito de crédito emergente desse contrato (cfr. art. 18/1-a-b do DL)

[18/1 – No período compreendido entre a data de integração do cliente bancário no PERSI e a extinção deste procedimento, a instituição de crédito está impedida de: a) Resolver o contrato de crédito com fundamento em incumprimento; b) Intentar acções judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito; c) Ceder a terceiro uma parte ou a totalidade do crédito; ou d) Transmitir a terceiro a sua posição contratual. 2 – Sem prejuízo do disposto nas alíneas b), c) e d) do número anterior, a instituição de crédito pode: a) Fazer uso de procedimentos cautelares adequados a assegurar a efectividade do seu direito de crédito; b) Ceder créditos para efeitos de titularização; ou c) Ceder créditos ou transmitir a sua posição contratual a outra instituição de crédito. 3 – Caso a instituição de crédito ceda o crédito ou transmita a sua posição contratual nos termos previstos na alínea c) do número anterior, a instituição de crédito cessionária está obrigada a prosseguir com o PERSI, retomando este procedimento na fase em que o mesmo se encontrava à data da cessão do crédito ou da transmissão da posição contratual. […].

         Para além disso, tendo em conta que as mutuárias entraram em mora em 31/08/2018, o NB estava impedido de ceder, a totalidade ou uma parte do seu crédito ou transmitir a terceiro a sua posição contratual (cfr. art. 18/1-c-d do DL). Mas [4] tendo cedido o seu crédito, teria a cessionária de ser uma instituição de crédito e estaria ainda obrigada a prosseguir com o PERSI (cfr. art. 18/3 do DL).

         Apesar de convidada para o efeito, a exequente juntou aos autos apenas cópia de duas cartas:

         [5] a) uma carta datada de 06/11/2015, dirigida à executada AI, comunicando-lhe a sua integração no PERSI, na sequência de um incumprimento do contrato ocorrido em 02/10/2015;

         [6] b) uma carta datada de 15/01/2016, dirigida à mesma executada, comunicando-lhe:

             “(…) não obstante as diligências por nós já efectuadas, ainda se encontra por regularizar o contrato de reestruturação, do qual é Titular. Actualmente, o valor em dívida totaliza o montante de 307,91€, no qual se incluem juros vencidos, mora e penalizações (caso o pagamento seja efectuado antes da data limite, o valor em excesso ser-lhe-á creditado em conta).

             Informamos que, nesta data, o processo transitou para a gestão do Núcleo de Recuperação Externa, pelo que solicitamos que, com urgência contacte os nossos serviços […] por forma a, com o recuperador a quem a dívida está afecta, proceder à regularização da mesma.

             A manutenção do incumprimento, não nos deixará outra alternativa que não seja o envio do processo para o nosso departamento de contencioso, tomando-se as medidas julgadas adequadas à defesa dos legítimos interesses da instituição credora.

             […].”

         Estes documentos foram impugnados mas, de qualquer modo, dos mesmos apenas se extrai que, em 2015, só a executada AI terá sido integrada em PERSI e desconhece-se quando terá sido extinto tal procedimento, uma vez que a carta datada de 15/01/2016 não contém qualquer alusão à extinção do PERSI.

         Para além disso, esses documentos são anteriores à data do alegado incumprimento que deu origem à presente execução, ocorrido em 31/08/2018 e não foi junto qualquer documento demonstrativo do cumprimento das obrigações emergentes do DL 227/2012 após essa data, quer quanto à executada AI, quer quanto aos herdeiros da falecida MJ.

         Não estando demonstrado o cumprimento das normas legais imperativas supra aludidas, cujo ónus recaía sobre a exequente não poderia esta, sem mais, intentar execução contra os executados.

         A falta de verificação dessa condição objectiva de procedibilidade consubstancia uma excepção dilatória inominada (cfr. art. 278/-e do CPC), de conhecimento oficioso (cfr. art. 578 do CPC), que determina, nesta fase do processo, a rejeição total da execução (cfr. art. 576/2, art. 726/2-b e art. 734/1 do CPC) – neste sentido, vide entre a jurisprudência mais recente, o acórdão do TRL de 07/06/2018, proc. 144/13.9TCFUN-A.L1-2; o ac. do TRE de 31/01/2019, proc. 832/17.0T8MMN-A.E1; o ac. do TRP de 09/05/2019, proc. 21609/18.0T8PRT-A.P1; e o ac. do TRE de 16/05/2019, proc. 4474/16.9T8ENT-A.E1.

                                                                 *

              Apreciação:

              Antes de mais anote-se que (i) apesar do que diz em (J) a exequente só invocou ao longo das suas alegações um acórdão sobre a matéria e isso apenas para dele retirar uma frase que não é do acórdão, mas das alegações da exequente no caso daquele acórdão e que nada tem a ver com a questão dos autos; (ii) esse acórdão, que é o referido em (K) – que a exequente não identificou devidamente, sendo que em 06/06/2019 foram publicados 30 acórdãos; este TRL encontrou-o sob o processo 6470/14.2T8ALM.L1-6 – também não tem nada a ver com a questão dos autos, pois que ali o título executivo é uma livrança e, por isso, esse acórdão concluiu que “Não sendo necessário invocar e não tendo sido invocada a relação subjacente para prova da existência do crédito decorrente da livrança dada à execução, não podemos em rigor saber se tal relação subjacente se insere na previsão legal do art. 2 do DL 227/2012. Não pode também, de imediato, através da análise do título cambiário, retirar a conclusão de que os respectivos subscritores são ‘clientes bancários’, na definição legal. Assim sendo, concluímos que o tribunal a quo não dispunha de elementos suficientes para se pronunciar pela excepção dilatória inominada consubstanciada no não cumprimento do disposto no DL 227/2012.”

              Por outro lado, atento o relatório deste acórdão, vê-se que o despacho recorrido não considerou a carta de 05/02/2016, onde o NB dirigiu uma comunicação à executada AI, de extinção do PERSI, por terem decorrido mais de 90 dias desde a integração em PERSI sem que tenha sido possível chegar a acordo. De qualquer modo, o relevo desta desconsideração é nulo: o incumprimento que está em causa, isto é, aquele que foi invocado pela exequente, reporta-se a 2018, sendo inócuo o que se passou para trás (como se verá melhor mais à frente).

              Por fim, note-se que no recurso – sendo que as conclusões são praticamente iguais ao corpo das alegações do recurso – não há um único facto impugnado, uma única pretensão de aditamento de factos, uma única referência concreta a um qualquer documento, uma única afirmação concreta de uma qualquer comunicação. Tudo isto, naturalmente, é decorrente da posição da exequente que é uma simples cessionária do crédito no âmbito de uma titularização, não a mutuante do contrato.

              Posto isto,

              Quanto ao que é dito pela exequente em (M) e (O) – consideração pelo tribunal recorrido de factos principais diversos dos alegados -, há apenas que constatar que todos os factos que o tribunal usou foram os alegados pela própria exequente.

                                                                (I)

              Da excepção dilatória da falta de prova do cumprimento das obrigações decorrentes do PERSI

              O que o tribunal fez, para além disso, foi considerar que era à exequente – ao contrário do que é dito pela exequente em (N) – que competia alegar os factos necessários à prova da verificação dos pressupostos necessários para poder requerer uma execução contra as mutuárias (ou seus herdeiros). Isto tendo também em consideração – consideração que, essa sim, é reiterada pela jurisprudência – de que a falta de verificação desses pressupostos se trata de uma excepção de conhecimento oficioso.

              Ou seja, visto que a extinção do PERSI, depois do cumprimento do respectivo regime, é uma condição objectiva da exequibilidade dos créditos previstos no art. 2/1 do DL 227/12, uma instituição de crédito que queira executar uma dívida proveniente de um mútuo destinado à aquisição de um imóvel para habitação garantido por hipoteca, terá de alegar que o cliente devedor, que entrou em incumprimento, foi integrado no PERSI, que no âmbito deste se fizeram as diligências legalmente impostas e que o PERSI se extinguiu nos termos legais, e terá também de juntar pelo menos um início de prova documental (suporte duradouro) que potencialmente comprove tudo isso e, entre o mais, que o PERSI se extinguiu. Isto tendo em conta que a produção de efeitos da extinção do PERSI só ocorre depois da comunicação da extinção, feita em suporte duradouro (artigos 17/1-3-4 do DL 227/12, 364 do CC e 574/2, 713 e 715 do CPC, o último por aplicação analógica já que não existe disposição expressa para a situação).

              [art. 17. 1 – O PERSI extingue-se: a) Com o pagamento integral dos montantes em mora ou com a extinção, por qualquer outra causa legalmente prevista, da obrigação em causa; b) Com a obtenção de um acordo entre as partes com vista à regularização integral da situação de incumprimento; c) No 91.º dia subsequente à data de integração do cliente bancário neste procedimento, salvo se as partes acordarem, por escrito, na respectiva prorrogação; ou d) Com a declaração de insolvência do cliente bancário. 2 – A instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que: […] 3 – A instituição de crédito informa o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento. 4 – A extinção do PERSI só produz efeitos após a comunicação referida no número anterior, salvo quando o fundamento de extinção for o previsto na alínea b) do n.º 1. […].

              (quanto à verificação da excepção dilatória oficiosa e de o ónus da prova dos factos correr por conta da exequente/credor, e de ser necessário pelo menos um início de prova documental da observância do regime do PERSI, para além do acórdão invocado pela executada e dos acórdãos citados pelo despacho recorrido, também os mais antigos acórdãos do TRL de 15/07/2016, proc. 2072/15.4TF8NC-A, do TRE de 06/10/2016, proc. 4956/14.8T8ENT-A.E1; e do TRL de 07/12/2016, proc. 681/15.0T8FNC-A; o primeiro e o terceiro não publicados, mas com passagens citadas no ac. do TRL de 07/06/2018, proc. 144/13.9TCFUN-A.L1-2; alguns dos acórdãos referidos a seguir parecem ser mais exigentes a nível da prova – como é o caso do ac. do TRC 494/14 referido abaixo, mas este acórdão do TRC, quando se refere a aviso de recepção, tem o cuidado de fazer uma restrição: é assim na ausência de prova sobre o efectivo recebimento da carta – mas o que interessa é o mínimo denominador comum que é o de documento/suporte duradouro.

              e os mais recentes acórdãos do STJ:

              de 28/02/2023, proc. 7430/19.2T8PRT.P1.S1: I – A expressão “suporte duradouro” usada nos arts. 14, 15 e 17 do DL 227/2012 – diploma que criou o PERSI – é correspondente ao conceito de documento do art. 362 do CC, pelo que a prova da existência do procedimento e dos termos em que teve lugar, desde a sua instauração à sua extinção, só pode ser feita através da sua exibição. II – Sendo o PERSI um procedimento pautado pela negociação tendente à regularização das situações de incumprimento a comunicação da sua instauração, integração dos clientes e extinção tem natureza receptícia. III – O regime criado pelo DL 227/2012, não exige, porém, que a prova da comunicação aos destinatários dirigida para o endereço conhecido do remetente e sobre o efectivo conhecimento pelos destinatários do teor da instauração do PERSI e sua integração nele bem como da extinção do procedimento tenham lugar unicamente através de prova documental, sendo admissível o recurso complementar a outros meios de prova e a presunções judiciais nos termos do art. 351 do CC.

              de 02/02/2023, proc. 1141/21.6T8LLE-B.E1.S1III. Verificando-se os pressupostos do PERSI, é obrigatória a integração do cliente bancário nesse regime, caso em que a acção/execução judicial destinada a satisfazer o crédito só poderá ser intentada pela instituição de crédito contra o cliente bancário, devedor mutuário, após a extinção desse procedimento. IV. A omissão da informação ou a falta de integração do devedor no PERSI, pela instituição de crédito, constitui violação de normas de carácter imperativo, que configura, também, excepção dilatória atípica ou inominada, conducente à absolvição do executado da instância executiva.

              de 15/12/2022, proc. 3364/18.6T8CBR-A.C2.S1 III. Também deve ser respondida negativamente a questão de saber se o vencimento antecipado da dívida quanto a um dos co-obrigados e a venda de imóveis hipotecados em sede de processo de insolvência prejudica a possibilidade de o outro co-devedor (neste caso, o ex-cônjuge, aqui executado) se opor à execução da dívida, por incumprimento pelo banco exequente do PERSI previsto nos arts. 12 a 21 do DL 227/2012, e sobretudo no seu artigo 18/1-b, bem como no artigo 27 do DL 74-A/2017.  IV. Concluindo-se, assim, que o vencimento antecipado da dívida e a determinação da venda de imóveis hipotecados em sede de processo de insolvência não impede que se extraia, quanto ao ora executado embargante, a consequência legal decorrente da não observância, por parte do banco exequente, dos deveres de comunicação no âmbito do PERSI, que é a extinção da instância de execução. Diz-se no texto do ac.: Impendia, pois, sobre a instituição bancária o ónus de comunicar ao devedor a sua integração no PERSI (cfr. o n.º 4 do citado artigo 14) e, ainda, o ónus posterior de o informar da extinção do procedimento, sem o que não se tem o mesmo como extinto (cfr. artigo 17/3-4 do mesmo DL).

              de 09/12/2021, proc. 4734/18.5T8MAI-A.P1.S1: IV – Sendo obrigatória a integração do devedor no PERSI, a sua omissão implica a ocorrência de uma excepção dilatória inominada, que conduzirá à absolvição do executado da instância executiva.

              de 19/11/2021, proc. 21827/17.9T8SNT-A.L1.L1.S1; II – Dada a integração automática do cliente-devedor em mora no PERSI (e o dever do Banco proceder à mesma), tem de se considerar que os executados estão abrangidos por este regime de regularização da dívida, que só se extingue em situações tipificadas na lei (artigo 17/1-2 do DL 227/2012) e mediante comunicação aos clientes bancários-devedores, nos termos do artigo 17/3 do diploma que criou o PERSI. III – Não constando da matéria de facto que tenha ocorrido a extinção do PERSI, nem que a exequente tenha comunicado aos executados, nos termos da lei, essa eventual extinção, conclui-se que o Banco exequente instaurou a execução durante o período de vigência do PERSI, numa fase em que estava impedido de o fazer, por força da lei (artigo 18/1-b do DL 227/2012).

              de 13/04/2021, proc. 1311/19.7T8ENT-B.E1.S1: I – A comunicação de integração no PERSI, bem como a de extinção do mesmo, constituem condição de admissibilidade da acção (declarativa ou executiva), consubstanciando a sua falta uma excepção dilatória insuprível, de conhecimento oficioso, que determina a extinção da instância (art. 576/2 do CPC). II – Tais comunicações têm de lhe ser feitas em suporte duradouro, ou seja, a sua representação através de um instrumento que possibilite a sua reprodução integral e inalterada, e, portanto, reconduzível à noção de documento constante do art. 362 do CC. III – Tratam-se de declarações receptícias, constituindo ónus da exequente demonstrar a sua existência, o seu envio e a respectiva recepção pela executada; IV – A simples junção aos autos das cartas de comunicação e a alegação de que foram enviadas à executada, não constituem, por si só, prova do envio e recepção das mesmas pela executada. Todavia tal apresentação pode ser considerada como princípio de prova do envio a ser coadjuvada com recurso a outros meios de prova.

              de 16/12/2020, proc. 2282/15.4T8ALM-A.L1.S1: O PERSI, enquanto instrumento para a prevenção de incumprimento no crédito bancário, não se basta com o cumprimento formal, pela instituição de crédito, do dever de integração do cliente bancário no procedimento, antes lhe sendo exigida a observância de deveres específicos e a realização de diligências concretas, ut artigo 15 do DL 227/2012.

              de 19/05/2020, proc. 6023/15.8T8OER-A.L1.S1: 1. A instituição de crédito que move acção executiva contra o mutuário consumidor, que se encontra em mora, tem o ónus de demonstrar que cumpriu as obrigações impostas pelos artigos 12 e seguintes do DL 227/2012, que prevê o regime jurídico do PERSI. 2. Enquanto o mutuante não proporcionar ao devedor consumidor a oportunidade para encontrar uma solução extrajudicial, tendo em vista a renegociação ou a modificação do modo de cumprimento da dívida, não lhe é permitido o recurso à via judicial para fazer valer o seu crédito (como se extrai do art.18 daquele diploma).  3. O cumprimento prévio dos deveres impostos pelo regime do PERSI constitui um pressuposto específico da acção executiva movida por uma entidade financeira contra um devedor consumidor, cuja ausência se traduz numa excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância.

            E das Relações:

              do TRE de 16/03/2023, proc. 5264/22.6T8STB.E1: […] II. -Encontrando-se o devedor em mora, está a instituição de crédito obrigada a cumprir o regime previsto no DL 227/2012 – PERSI – ainda que a mora tenha ocorrido antes da entrada em vigor do mesmo diploma.

              do TRE de 16/03/2023, proc. 570/22.2T8ELV.E1: I.- O PERSI – DL 227/2012 – aplica-se obrigatoriamente sempre que o cliente da entidade bancaria é consumidor, nos termos dos artigos 2/1 e 14/1. II.- Se a entidade bancária juntou meras fotocópias de cartas que não se sabem terem sido recepcionadas pela executada, não deu cumprimento ao PERSI, o que constitui excepção dilatória inominada – falta de condição objectiva de procedibilidade da execução – e determina a extinção da instância executiva.

              do TRL de 02/03/2023, proc. 65/22.4T8SNT-A.L1-2.

              do TRE de 09/02/2023, proc. 1096/14.3TBSTR-E.1.

              do TRL de 09/02/2023, proc. 20746/21.9YIPRT.L1-8: 1 – Nas situações de incumprimento de contrato de crédito bancário a que seja aplicável o regime do DL 227/2012, o PERSI constitui um procedimento extrajudicial obrigatório e qualquer acção judicial destinada a satisfazer o crédito só poderá ser intentada depois da sua extinção (art. 18/1-b). 2 – A comunicação de integração no PERSI, bem como a sua extinção constituem uma condição de admissibilidade da acção (declarativa ou executiva) e a sua falta consubstancia uma excepção dilatória insuprível, de conhecimento oficioso, que determina a absolvição do réu da instância. 3 – A instituição bancária que decaiu em acção proposta contra o devedor, por falta de verificação de tal condição de procedibilidade, pode instaurar nova acção contra o mesmo devedor, com base na mesma causa de pedir e formular o mesmo pedido, mas terá de alegar, nessa nova acção, os factos novos, susceptíveis de demonstrar o cumprimento daquela obrigação e consequentemente, a verificação da condição anteriormente não preenchida (cf. art. 621/1 do CPC), sob pena de não o fazendo, ocorrer a tríplice identidade, de sujeitos, do pedido e da causa de pedir (art. 581/1 do CPC), com a anterior acção, e consequentemente, caso julgado, a determinar a absolvição do réu da instância.

              do TRC de 07/02/2023, proc. 171/20.0T8VLF-C.C1: II – […] as questões de conhecimento oficioso invocadas pelos reclamados apenas nas alegações de  recurso, como sucede relativamente à falta de observância pela exequente/reclamante dos procedimentos a que obriga o PERSI antes da instauração da  execução,  devem ser apreciadas, desde que os autos contenham elementos para tanto e que essas questões não tenham sido objecto de decisão transitada. III –  Se a exequente não devia ter interposto execução por não ter cumprido as exigências prévias decorrentes do PERSI, não poderá tirar partido da penhora que nessa execução obteve para efeito de reconhecimento e graduação do correspondente crédito. IV – Por isso, relativamente a […] crédito […que] se enquadra nos referidos na al e) do art 2/1 do DL 227/2012 […] tem de se entender como procedente a excepção dilatória inominada decorrente da não observância daquelas exigências.

              do TRL de 12/01/2023, proc. 3735/17.5T8LRS-B.L1-6: 3- As normas procedimentais relativas ao PERSI tem natureza de normas imperativas. E o art. 18 do DL 227/2015, estabelece mesmo que enquanto não ocorrer a comunicação de extinção do PERSI a instituição de crédito está impedida de: (i) resolver o contrato de crédito com fundamento no incumprimento; (ii) intentar acções judiciais com vista à satisfação do crédito. Quer dizer, a inobservância dessas normas impede a instituição de crédito de solicitar judicialmente a satisfação do seu crédito. 4- A esta luz, cabe à instituição de crédito alegar e provar que enviou, rectius, remeteu efectivamente para o domicílio do cliente devedor, as cartas a comunicar a inclusão e, posteriormente a extinção do PERSI. 5- Se não provar esse envio, fica sujeita à procedência da excepção dilatória inominada e insanável, por a sua falta não poder ser preenchida na pendência da acção, o que leva à procedência da oposição à execução.

              do TRL de 15/12/2022, 23116/16.7T8SNT-C.L1-8: I. O cumprimento prévio dos deveres impostos pelo regime do PERSI constitui um pressuposto específico da acção executiva cuja ausência se traduz numa excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância. II. E como tal a sua invocação pela parte, ou a sua apreciação oficiosa, está subtraída ao prazo concedido para apresentação da defesa, regendo, por isso, a última parte do art. 573/2 do CPC que descarta a aplicação do princípio da preclusão.

              do TRP de 14/12/2022, proc. 3047/20.7T8MAI-B.P1.

              do TRE de 24/11/2022, proc. 824/22.8T8ENT.E1: I. Tendo a instituição bancária indicado genericamente como fundamento legal da extinção do PERSI, o DL 227/2012, e tendo também indicado genericamente a causa da inviabilidade da manutenção do procedimento, referenciando tão só a falta de colaboração com a instituição de crédito e a falta de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, nada de concreto referiu quanto aos fundamentos da extinção do referido procedimento, seja por via da descrição dos factos que a tal determinaram, seja pela concretização dos fundamentos que, no seu entender, a tal levaram. II. Essa forma de comunicação viola a ratio legis do citado diploma, bem como o disposto no artigo 17/3 do mesmo, e artigo 8/-a do Aviso 17/2012, do Banco de Portugal, aplicável ao caso dos autos, impedindo os clientes bancários de se defenderem, quer no plano factual, quer no plano legal, caso a entidade bancária venha instaurar procedimento judicial contra os mesmos para cobrança do crédito incumprido. III. A violação do art. 17/3 do PERSI nos termos sobreditos, determina a ineficácia da comunicação da extinção do PERSI (art. 17/4), mantendo-se o impedimento de instauração da acção executiva.

              do TRG de 24/11/2022, proc. 1779/19.1T8CHV-A.G1.

              do TRL de 13/09/2022, proc. 45739/21.2YIPRT.L1-7: I – A integração do devedor (consumidor) no PERSI e a extinção deste consubstanciam condição de admissibilidade da acção declarativa ou executiva (atenta a natureza imperativa das normas em causa), consubstanciando a sua falta uma excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, que determina a absolvição do réu da instância. […].

              do TRL de 14/07/2022, proc. 6804/14.0T8ALM-C.L1-2.

              do TRP de 27/06/2022, proc. 5480/16.0T8PRT-A.P1.

              do TRC de 14/06/2022, proc. 172/20.8T8VLF-A.C1.

              do TRP de 08/06/2022, proc. 4204/20.1T8MAI-A.P1: […] III – Destarte, se previamente a acção para cobrança de um concreto crédito (procedimento judicial) não tiver havido integração em PERSI, com vista à obtenção de pagamento do mesmo (prévio procedimento extrajudicial), verifica-se tal excepção dilatória conducente à absolvição da instância. IV – E a comunicação de integração no PERSI, bem como a de extinção do mesmo, ao cliente/devedor tem de ser feita, pela instituição bancária, em suporte duradouro, isto é, tem de estar materializada em instrumento que possibilite a sua integral e inalterada reprodução (documento – cfr. art. 362 do CC). V – Sendo condição de admissibilidade da acção judicial, incumbe ao banco/exequente, que pretende lançar mão do procedimento judicial, o ónus da prova do envio (por si) e da recepção (pelo cliente) de tais declarações receptícias, cabendo-lhe demonstrar, para além da sua existência e envio, a recepção pelo cliente, não constituindo a mera junção aos autos de simples cartas de comunicação prova quer do seu envio quer da sua recepção e, não demonstrada esta, ocorre excepção dilatória, insuprível, que determina a extinção da instância executiva.

              do TRP de 08/06/2022, proc. 9290/20.1T8PRT-A.P1.

              do TRE de 07/04/2022, proc. 451/21.7T8ENT.E1: Uma carta em que a instituição bancária comunica ao cliente que o PERSI em que o mesmo havia sido integrado se extinguiu por terem decorrido 91 dias, sem qualquer outra menção, não tem eficácia extintiva desse procedimento.

              do TRE de 07/04/2022, proc. 364/21.2T8ENT.E1: II. Desconhecendo-se qual foi afinal o fundamento legal da extinção do PERSI ocorre uma excepção dilatória inominada que determina a absolvição da instância executiva.

              do TRE de 07/04/2022, proc. 741/21.9T8ENT.E1.

              do TRE de 10/03/2022, proc. 1340/21.0T8ENT.E1: O regime do PERSI, aprovado pelo DL 227/2012, é obrigatório mesmo no caso em que o início do incumprimento do contrato dado à execução tenha ocorrido em data anterior à vigência do referido diploma desde que o contrato se mantenha em vigor depois da sua entrada em vigor.

              do TRP de 10/03/2022, proc. 8027/14.7T8PRT.P1.

              do TRC de 08/03/2022, proc. 824/20.2T8ANS.C1.

              do TRP de 07/03/2022, proc. 121/20.3T8VLG-A.P1.

              do TRL de 17/02/2022, proc. 29942/20.5YIPRT.L1-6.

              do TRG de 10/02/2022, proc. 5978/19.8T8VNF-A.G1: 3 – As normas que consagram a obrigatoriedade das comunicações da integração do cliente bancário no PERSI e da extinção deste têm carácter imperativo e estabelecem condições objectivas de procedibilidade, que operam, na sua ausência, como excepções dilatórias atípicas ou inominadas, de natureza insuprível e de conhecimento oficioso, conduzindo, no caso de se verificarem os respectivos pressupostos, à absolvição da instância – arts. 576/2, 578 e, especificamente quanto à acção executiva, 726/2-b do CPC.[…].

              do TRC de 15/12/2021, proc. 930/20.3T8ACB-A.C1: […] IV – O incumprimento do regime legal da integração obrigatória do cliente bancário no PERSI traduz-se numa falta de condição objectiva de procedibilidade que é enquadrada, com as necessárias adaptações, no regime jurídico das excepções dilatórias (atípicas ou inominadas). V – As comunicações de integração dos executados no PERSI e de extinção do PERSI têm de ser feitas num suporte duradouro (que inclui uma carta ou um e-mail) – arts. 14/4 e 17/3 do dito DL 227/2012 – e não se podem provar com recurso a prova testemunhal (arts. 364/2 e 393/1, ambos do CC) excepto se houver um início de prova por escrito (que não seja a própria alegada comunicação). VI – Acresce que é critério legal, acautelado no art. 607/5 do CPC, que também é vedado ao juiz declarar provados determinados factos para os quais a lei exija determinada formalidade especial ou por documentos sem que essa exigência legal se mostre satisfeita.

              do TRE de 25/11/2021, proc. 17026/20.0T8PRT.E1: 1- A extinção do PERSI com o fundamento legal de terem decorrido 91.º dias subsequentes à data da integração do cliente bancário nesse procedimento, não exime a entidade bancária de lhe comunicar, para além daquele fundamento legal, as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento, sob pena de ineficácia da comunicação da extinção do PERSI. 2- A ineficácia da extinção do PERSI impede a entidade bancária de intentar acção executiva contra o cliente bancário tendente à satisfação do seu crédito, por faltar uma condição de admissibilidade da execução, que correspondente a uma excepção dilatória inominada insuprível, de conhecimento oficioso, determinante da extinção da instância executiva caso a mesma tenha sido instaurada.

              do TRL de 04/11/2021, proc. 5633/18.6T8FNC- A.L1-6: 2 – A arguição pela executada embargante, fiadora da obrigação exequenda, da excepção inominada de omissão de condição de procedibilidade da execução por incumprimento das normas de aplicação do PERSI é de conhecimento oficioso, podendo ser arguida só em sede de recurso, cabendo ao exequente embargado o ónus de alegar e provar que cumpriu as referidas normas. 3 – Não provando o exequente embargado ter cumprido as referidas normas, procede a excepção dilatória de omissão de condição de procedibilidade da execução, devendo a executada embargante ser absolvida da instância executiva.

              do TRL de 21/10/2021, proc. 12205/18.3T8SNT-A.L1-2.

              do TRL de 12/10/2021, proc. 4270/21.2T8SNT-B.L1-1.

              do TRE de 13/05/2021, proc. 2774/18.3T8ENT.E1 (com voto de vencido): 1 – Recai sobre a instituição de crédito, de acordo com o disposto nos artigos 14/4 e 17/3, do DL 227/2012, conjugados com o disposto no artigo 342/1-3 do CC, o ónus de alegar e provar o cumprimento do PERSI junto dos clientes bancários em incumprimento, designadamente o encargo de comprovar o envio aos mesmos da comunicação da sua integração no PERSI e da comunicação da extinção do mesmo, não sendo, por isso, suficiente a junção aos autos de duas cartas alegadamente enviadas pela apelante aos apelados informando da integração destes últimos no PERSI, sem que resulte minimamente demonstrado nos autos por que modo, ou meio, lhes foi dado conhecimento das ditas comunicações; 2 – A ausência de prova de comunicação ao cliente bancário da extinção e, por maioria de razão, da integração no PERSI, obsta à instauração de acção executiva por parte da instituição de crédito contra o mesmo uma vez que aquela comunicação de extinção funciona como uma condição de admissibilidade da dita acção.

              do TRP de 26/04/2021, proc. 19728/19.5T8PRT-A.P1: […] V – Este impedimento legal ao exercício do direito de acção constitui uma verdadeira causa legal de inexigibilidade da obrigação e opera entre a data de integração do cliente bancário ou do fiador no PERSI e a extinção deste procedimento e, por identidade de razão e até por maioria de razão, o regime deve ser o mesmo nos casos em que não chega a ser instaurado PERSI, pois que, a não se entender deste modo, facilmente se frustrariam os propósitos do legislador de sujeitar as instituições bancárias a um dever de tentarem a regularização dos contratos de crédito incumpridos, beneficiando-se as instituições infractoras desse dever legal em confronto com aquelas que dessem início a esse procedimento. […].

              do TRP de 23/02/2021, proc. 8821/19.4T8PRT-A.P1.

              do TRC de 15/12/2020, proc. 6971/18.3T8CBR-A/B.C1: IV – O regime estabelecido no PERSI insere-se no âmbito da tutela do consumidor, integrando a chamada “ordem pública de protecção” e, por isso, em face da obrigatoriedade legal da integração prévia e automática no PERSI nos termos dos arts 14/1 e 39 do DL 227/2012, constitui a mesma uma condição objectiva de procedibilidade da acção executiva, cuja omissão consubstancia excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, implicante da absolvição da instância executiva. V- Pode a mesma ser invocada nas alegações de recurso, satisfazendo o necessário contraditório a possibilidade que a embargada mantém de contrariar aquela invocação nas contra-alegações.

              do TRG de 29/10/2020, proc. 6/19.6T8GMR-A.G1.

              do TRL de 13/10/2020, proc. 15367/17.3T8SNT-A.L1-7: I- Devendo a instituição de crédito informar o cliente bancário (através de comunicação em suporte duradouro) da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento, nos termos do nº 3 do art. 17 do DL 227/2012, deve considerar-se como inexistente ou inválida tal comunicação se a mesma não indicar qualquer fundamento para a extinção do procedimento; II- A comunicação de extinção do PERSI funciona como uma condição de admissibilidade da acção executiva, constituindo a sua falta excepção dilatória insuprível que determina a extinção da instância executiva quanto ao crédito correspondente.

              do TRE de 10/09/2020, proc. 1834/17.2T8MMN-A.E1: A lei não exige que as comunicações da integração do cliente bancário no PERSI e da extinção deste sejam efectuadas através de carta registada com aviso de recepção. Não obstante, a instituição de crédito tem o ónus da prova de que efectuou tais comunicações em suporte duradouro, entendido este, nos termos do artigo 3/-h do DL 227/2012, como qualquer instrumento que permita armazenar informações durante um período de tempo adequado aos fins a que as informações se destinam e que possibilite a reprodução integral e inalterada das informações armazenadas.

              do TRL de 07/05/2020, proc. 2282/15.4T8ALM-A.L1-6 entre o mais diz-se: Ora, no caso dos autos, além de não ter demonstrado ter iniciado a segunda fase do PERSI, a exequente não comunicou a extinção do procedimento. Por isso, estava impedida de resolver os contratos de crédito, como fez em 09/10/2013, bem como estava impedida de instaurar a execução de que estes embargos são apenso. O mesmo é dizer, após a integração do cliente no PERSI, a instituição de crédito apenas pode resolver o contrato de crédito e executar o cliente após a comunicação de extinção do PERSI. A comunicação de extinção do PERSI funciona como uma condição de admissibilidade da acção executiva. As normas procedimentais relativas ao PERSI tem natureza  de  normas imperativas.

              do TRE de 16/05/2019, proc. 4474/16.9T8ENT-A.E1.

              do TRE de 02/05/2019, proc. 10/14.0TBTVR-A.E1: Do regime legal constante do DL 272/2012, de 25/10 resulta a proibição de o credor resolver o contrato ou instaurar acção judicial tendo em vista a satisfação do seu crédito no «período compreendido entre a data de integração do cliente bancário no PERSI e a extinção deste procedimento».

              do TRC de 28/11/2018, proc. 494/14.7TBFIG-A.C1: I – Nos termos do artigo 14/4 do DL 227/2012, que instituiu o PERSI, a instituição de crédito deve informar o cliente bancário da sua integração no PERSI, através de comunicação em suporte duradouro.; II – O envio de uma carta, desacompanhada de aviso de recepção, na ausência de prova sobre o efectivo recebimento da carta, é insuficiente para provar que a mencionada comunicação do banco ao cliente foi feita.

              do TRE de 28/06/2018, proc. 2791/17.0T8STB-C.E1.

              do TRE de 08/03/2018, proc. 2267/15.0T8ENT-A.E1.)  

              No mesmo sentido, Carlos Filipe Fernandes de Andrade Costa – Incumprimento de contratos de crédito pelos consumidores, Estudos de Direito do Consumo, vol. 18, 2022, do CDC/FDUC, págs. 391-395.

              (quanto à exigência de tais factos serem alegados no requerimento executivo:

              Acórdão do TRP de 15/06/2022, proc. 1112/20.0T8LOU-A.P1: I – O cumprimento prévio dos deveres impostos pelo regime do PERSI constitui um pressuposto específico da acção executiva para cobrança do crédito em mora cuja ausência se traduz numa excepção dilatória inominada de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância. II – Se no requerimento executivo não é mencionado o cumprimento dos deveres impostos pelo regime do PERSI, deve ser proferido despacho a convidar ao aperfeiçoamento do requerimento. Isto depois de no texto do acórdão se ter dito: Cabia ao exequente o ónus de invocar no próprio requerimento executivo o preenchimento daquelas condições para justificar a possibilidade de instaurar a acção executiva.

              do TRE de 27/01/2022, proc. 1373/13.0TBBNV.E1: Não permitindo a lei o recurso aos tribunais sem que, antes, se mostrem cumpridas as formalidades de PERSI (nos termos do artigo 18/1 do DL 227/2012), no momento em que a instituição de crédito opta por ir a tribunal exigir o cumprimento coercivo da dívida tem concomitantemente de fazer a prova de ter cumprido tais formalidades.) 

              do STJ de 19/05/2020, proc. 6023/15.8T8OER-A.L1.S1: no texto do acórdão esclarece-se: A demonstração de que a entidade financeira/exequente integrou o consumidor/exe-cutado no PERSI ou lhe proporcionou a oportunidade para tal, nos termos dos artigos 12º e seguintes do DL 227/2012, constitui um pressuposto específico da acção executiva para pagamento de quantia certa (quando a obrigação exequenda respeita a financiamento de uma entidade financeira a um consumidor), equiparável à existência do título executivo, cuja ausência constitui uma excepção dilatória inominada (dado o carácter não taxativo do art. 577 do CPC) de conhecimento oficioso (como se extrai da regra estabelecida no art. 578), que nos termos do art. 576/2 e art.726/2-b do CPC determina a absolvição da instância executiva. […] Ao mover a presente acção executiva, a exequente tinha o ónus de ter logo demonstrado que havia cumprido as obrigações impostas pelo regime do PERSI, demonstrando, assim, que o seu acesso à via judicial não se encontrava bloqueado pelo art.18. Ora, da factualidade provada nada consta que permita concluir que a exequente tenha cumprido as obrigações que lhe eram impostas pelo DL 227/2012. No ponto 14 das conclusões das suas alegações de revista a exequente/ recorrente afirma que: “deu pleno cumprimento ao PERSI, tendo integrado e informado a executada da existência do referido procedimento, o qual veio a ser extinto por falta de colaboração daquela, nos termos legais”. A ser assim, quando moveu a acção executiva, devia a exequente ter dado cumprimento ao ónus que resulta do art.18 do DL 227/2012, de demonstrar que, por ter integrado a devedora no PERSI (sem obter sucesso na regularização extrajudicial da dívida), lhe assistia o direito de mover a acção executiva. Não o tendo feito, são-lhe assacáveis as consequências da inobservância desse ónus, como decorre do princípio da auto-responsabilidade das partes. Não assiste, assim, razão à recorrente quando alega que o cumprimento do regime do PERSI era uma questão nova, e uma questão que tinha necessariamente de ter sido suscitada pela executada no requerimento dos embargos. Conclui-se, pelo exposto, que o acórdão recorrido não merece censura, pois fez a correcta aplicação do direito ao caso concreto, ao absolver a executada da instância.

                                                                (II)

              Note-se que a dívida relativa ao incumprimento invocado pela exequente e que está a ser executada no caso dos autos é implicitamente a dívida resultante da opção pelo cumprimento antecipado do contrato depois do incumprimento; daí a referência ao resto do capital que então estava em dívida e aos juros de mora vencidos e a falta de qualquer referência à resolução do contrato e ao valor da relação da liquidação subsequente à resolução do contrato (mas não há qualquer prova da tomada dessa opção, nem da comunicação da mesma, nem que ela tenha sido regularmente feita, nem se sabe quando e se ela ocorreu, apesar de tudo isso depender de pressupostos legais específicos: por exemplo, se for aplicado o regime do DL 74-A/2017, o art. 27 impõe a verificação da falta de pagamento de 3 ou mais prestações sucessivas e a concessão de prazo suplementar, com advertência, para a perda do benefício do prazo ou para a resolução e prevê-se um direito à retoma do contrato: art. 28 do DL – o ac. do STJ de 15/12/2022, proc. 3364/18.6T8CBR-A.C2.S1, tem o cuidado de fazer referência a esta questão). De qualquer modo, as proibições decorrentes do regime do PERSI não têm a ver só com a procedibilidade do crédito, mas também com a resolução do contrato: art. 18/1 do DL – No período compreendido entre a data de integração do cliente bancário no PERSI e a extinção deste procedimento, a instituição de crédito está impedida de: a) Resolver o contrato de crédito com fundamento em incumprimento; b) Intentar acções judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito. Portanto, a impossibilidade de executar o crédito diz respeito não só à dívida antecipadamente vencida pelo incumprimento, mas também à dívida pelo valor subsequente a uma resolução, pois que, sem a prova da extinção do PERSI, a resolução não pode sequer ser invocada.

                                                               (III)

              Do conhecimento oficioso da excepção na execução

             Quando, apesar de o exequente não ter cumprido o ónus de alegar e provar o cumprimento das obrigações que o regime do PERSI lhe impunha, entre elas a extinção regular do PERSI e a execução prosseguir, o juiz deve, quando de tal se aperceber, fazer o que foi feito pelo tribunal recorrido e pelo menos então o exequente terá de alegar e juntar um mínimo de prova documental do cumprimento daquelas obrigações.

              (vejam-se, por exemplo, os acórdãos

              do TRL de 26/01/2023, proc. 5807/20.0T8SNT-B.L1-6: […] Em face do disposto no art. 734/1 do CPC [o qual reza que pode o juiz “conhecer oficiosamente, até ao primeiro acto de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo”], nada obsta a que o Tribunal da Relação venha a conhecer de questão recursória – v.g. de  excepção dilatória inominada decorrente da inobservância do PERSI e enquanto causa impeditiva do direito do credor a instaurar acção executiva – que não foi pelo tribunal a quo apreciada/resolvida.

              do TRE de 24/11/2022, proc. 277/22.0T8ELV.E1: I.- Não tendo a entidade bancária demonstrado que notificou o beneficiário do PERSI e o garante do cumprimento (fiador) de que o procedimento se encontrava extinto, apesar de para tal ter sido convidada, o procedimento de protecção do devedor mantém-se em vigor, com as consequências a que alude o artigo 18/1-b do DL 227/2012. II.- Nesta circunstância, impõe o artigo 726/2-b do CPC que o juiz indefira liminarmente o requerimento executivo, quando ocorra esta excepção dilatória inominada, não suprível e de conhecimento oficioso.

              do TRL de 15/09/2022, proc. 2160/20.5T8ALM-B.L1-2: Suscitada a falta de PERSI no âmbito do incidente de oposição à penhora, tal excepção dilatória inominada deve ser judicialmente apreciada e decidida no âmbito dos autos principais de execução, observado que se mostre o normativo jurídico-processual que a situação justifique.

              do TRL de 14/07/2022, proc. 6804/14.0T8ALM-C.L1-2: III – A preterição de sujeição do devedor ao PERSI é questão de conhecimento oficioso pelo Tribunal, não dependendo de invocação da correspondente excepção – de não integração no PERSI – no prazo concedido para a apresentação da defesa (tendo plena aplicação, a parte final do n.º 2 do art. 573 do CPC, que descarta a aplicação do princípio da preclusão). IV – Considerando que a questão é de oficiosa apreciação, em linha com o que se dispõe no artigo 734/1 do CPC, em que o juiz pode conhecer oficiosamente, “até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo”, a possibilidade de ocorrência de abusiva invocação dos executados sobre uma tal questão não preclude a possibilidade de, não o tendo feito em sede de despacho liminar, o Tribunal conhecer dessa questão até ao momento da transmissão dos bens penhorados. V – Uma vez que, a integração do devedor no PERSI e a ulterior extinção daquele procedimento constituem verdadeiras condições da acção executiva – condições objectivas de procedibilidade da execução – a instauração desta determina que seja verificado se tal condição da acção se mostra reunida. VI – A prova da integração do devedor no PERSI, a extinção do procedimento e a sua comunicação a este, realizada em suporte duradouro (designadamente, carta ou email) recai sobre o exequente. VII – A instauração de acção executiva sem que se mostrem verificada a referida condição objectiva de procedibilidade gera a verificação de uma excepção dilatória inominada, que, como se viu, é de oficioso conhecimento, conduzindo à absolvição da instância (cfr. artigos 576/1-2, 577 e 578 do CPC). […] X – A condição em causa – a integração dos executados em PERSI – tem de estar verificada à data de instauração da acção, pelo que, não tem sentido determinar a suspensão dos autos executivos, com vista a proporcionar que fosse viabilizado à exequente proceder – no decurso destes autos – ao desencadear do procedimento do PERSI.

              do TRP de 15/06/2022, proc. 1112/20.0T8LOU-A.P1: II – Se no requerimento executivo não é mencionado o cumprimento dos deveres impostos pelo regime do PERSI, deve ser proferido despacho a convidar ao aperfeiçoamento do requerimento.

              Para um caso paralelo, ainda o ac. do TRL de 22/02/2022, proc. 94570/20.0YIPRT.L1-7: I – Constituem factos essenciais nucleares a celebração do contrato de mútuo, o seu incumprimento e subsequente resolução (alegados) e factos complementares (ou essenciais complementares), condicionantes da procedência da injunção, a prévia observância das disposições injuntivas do regime do PERSI. II – Não tendo sido alegados os factos complementares, desde logo, no formulário do requerimento injuntivo, cabe ao tribunal a quo proferir despacho de aperfeiçoamento tendo em vista facultar à autora a alegação dos mesmos (cf. artigo 10/2-d-3 do DL 269/98, de 01/09, 549/1, 590/3-4 do CPC. Só após a prolação de tal despacho e da sua (in)observância, é que o tribunal a quo poderá formular ilações sobre a (in)existência da apontada excepção dilatória inominada.)

              Ora, no caso, a exequente não juntou sequer um início de prova documental relativo a qualquer PERSI iniciado depois do incumprimento verificado em 2018, de quaisquer diligências subsequentes em cumprimento do regime do PERSI e da subsequente extinção deste – sendo irrelevante tudo o que alega de (B) a (D) por ser relativo a momento anterior, isto é, a incumprimento verificado em 2015, aliás entretanto regularizado no âmbito de um acordo (alegação da executada a 15/06/2022, aceite pela exequente a 14/07/2022; o que aliás decorre do facto de o incumprimento invocado no requerimento executivo dizer respeito ao período subsequente a 31/08/2018; note-se, entretanto, no valor muito reduzido da dívida de 2015).

              Tanto basta para que não se possa ter por verificada, entre o mais, a extinção do PERSI e por isso não se poderia considerar verificada a condição de procedibilidade que dependia a instauração da execução.

                                                               (IV)

              Dos processos negociais paralelos e equivalentes ao PERSI ao abuso de direito

              De qualquer modo, quanto ao que é alegado de (E) a (M), a exequente quererá referir-se à posição daquela jurisprudência que admite, apesar da imperatividade do regime legal do PERSI, a estranha figura de um processo negocial paralelo e equivalente ao PERSI, que permitiria o acesso à execução ou impediria, sob pena de abuso de direito, que os mutuários devedores pudessem invocar a excepção dilatória da inexistência do PERSI ou da falta de prova da extinção do PERSI (desenvolvida com base na situação muito particular objecto do acórdão do STJ de 09/02/2017, proc. 194/13.5TBCMN-A.G1.S1, ou situações e acórdãos análogos que nada têm a ver com os casos normalmente em causa e, muito menos, com o caso dos autos).

              Ora, primeiro, um processo imperativo não pode ser substituído por um processo ad hoc que não cumpra aquele regime imperativo – e no caso nada foi alegado de concreto que sequer permita ter como indiciado que realmente existiu qualquer processo ad hoc – e, segundo, o abuso de direito tem pressupostos exigentes (art. 334 do CC) que, no caso, não estão minimamente alegados nem indiciados.

              (demonstrando a inexistência de qualquer processo negocial paralelo e equivalente ao PERSI, veja-se o ac. do STJ de 02/02/2023, proc. 1141/21.6T8LLE-B.E1.S1, que revoga o ac. do TRE que defendia que um cessionário podia promover execução, desde que no relacionamento com o devedor lhe tivesse assegurado garantias idênticas às que o PERSI prevê; o ac. do STJ entre o mais chama a atenção que “não ressalta, de todo, dos factos provados que a exequente tenha “antes da entrada da execução”, encetado um procedimento extrajudicial de resolução, em tudo decalcado àquele que está contemplado na legislação PERSI”; veja-se ainda, entre outros, o ac. do TRP de 14/12/2022, proc. 3047/20.7T8MAI-B.P1: I – Não está na disponibilidade das partes, entidade bancária e cliente bancário, afastar as regras do PERSI, ainda que de mútuo acordo, que repetimos, são imperativas. […] no corpo do acórdão escreveu-se: Portanto, a matriz deste regime é imperativa, na obrigatoriedade das regras impostas, e o sancionamento do seu incumprimento com impossibilidade de recorrer às vias judiciais com objectivo de satisfação dos créditos – artigo 18/1-b do citado diploma. Como decorre do preambulo, o legislador impôs este regime, com base em razões de interesse público – protecção dos consumidores bancários. Sendo este o fim visado com esta legislação, estamos perante normas imperativas ou injuntivas, onde podemos identificar a protecção de interesses gerais ou individuais muito fortes, que no entender do legislador, implicam uma necessidade inderrogável de acatamento.; e o ac. do TRL de 04/11/2021, proc. 9509/15.0T8ALM-A.L1-6: VII – Não cumpre as finalidades do PERSI a indicação pela credora do modo de sanar o incumprimento, unilateralmente e sem análise da situação concreta dos devedores; não pode considerar-se tal comunicação unilateral como substitutiva informal do PERSI.)

              (quanto à não verificação do abuso de direito, para além de vários dos acórdãos já referidos acima, vejam-se ainda, especificamente, os acórdãos  

              – do STJ de 02/02/2023, proc. 1141/21.6T8LLE-B.E1.S1: XI. A aplicação do instituto do abuso do direito tem uma natureza subsidiária, só a ele sendo lícito recorrer na falta de uma norma jurídica que resolva, de forma adequada, a questão em causa, exigindo-se a prova rigorosa dos seus elementos constitutivos e a ponderação dos valores sistemáticos em jogo, sob pena de se tratar de uma remissão genérica e subjectiva para a materialidade da situação.

              – do STJ de 19/11/2021, proc. 21827/17.9T8SNT-A.L1.L1.S1; I – A aplicação do instituto do abuso do direito tem uma natureza subsidiária, só a ele sendo lícito recorrer na falta de uma norma jurídica que resolva, de forma adequada, a questão em causa. II – Dada a integração automática do cliente-devedor em mora no PERSI (e o dever do Banco proceder à mesma), tem de se considerar que os executados estão abrangidos por este regime de regularização da dívida, que só se extingue em situações tipificadas na lei (artigo 17/1-2 do DL 227/2012) e mediante comunicação aos clientes bancários-devedores, nos termos do artigo 17/3 do diploma que criou o PERSI. III – Não constando da matéria de facto que tenha ocorrido a extinção do PERSI, nem que a exequente tenha comunicado aos executados, nos termos da lei, essa eventual extinção, conclui-se que o Banco exequente instaurou a execução durante o período de vigência do PERSI, numa fase em que estava impedido de o fazer, por força da lei (artigo 18/1-b do DL 227/2012). IV – Neste contexto, e na falta de factos indiciadores de má-fé, a invocação pelo cliente-bancário das normas jurídicas do regime jurídico do PERSI a seu favor não constitui um abuso do direito, mesmo que tal tenha sucedido após a alienação do imóvel, garantia do mútuo. V – Não se pode esquecer, como se salienta no Preâmbulo do diploma legal que prevê o PERSI, que estamos perante uma relação jurídica caracterizada por uma acentuada assimetria informativa, em que a lei inculca uma especial responsabilidade nas instituições bancárias e considera o cliente bancário-consumidor como a parte mais fraca [o TRL tinha revogado a sentença e julgado os embargos improcedentes com base no abuso de direito, entendendo que uma resposta da exequente, nos termos da qual comunica as condições em que aceita analisar a reestruturação das dívidas, era uma proposta de regularização adequada à situação financeira dos clientes e/ou a avaliar propostas alternativas dos próprios clientes (artigos 15 e 16º), dado que a integração no PERSI é automática e, por isso, os devedores deviam ter apresentado contra proposta para chegar a acordo e não o tinham feito, chegando [sic] à situação de alienarem o imóvel. Este comportamento pode ser entendido como recusa da proposta apresentadas].

              – do STJ de 19/05/2020, proc. 6023/15.8T8OER-A.L1.S1: Por outro lado, alegou a recorrente, também a título subsidiário, que a executada teria incorrido em abuso de direito quando invocou o incumprimento do PERSI pela exequente. Pelo exposto nos pontos anteriores, é manifesto que não existiu qualquer abuso de direito da executada, pois esta limitou-se a clamar pela aplicação do regime do PERSI, que legalmente se impõe à exequente e que esta tinha o ónus de demonstrar que cumpriu para poder mover a acção executiva.

              – do TRL de 14/07/2022, proc. 6804/14.0T8ALM-C.L1-2: IX – Não se mostrando comprovado que tenha ocorrido a integração dos executados em PERSI, nos termos em que a isso a mutuante se encontra vinculada, a decisão recorrida, que indeferiu liminarmente o incidente suscitado pelos executados – invocando a sua não integração em PERSI – com fundamento em que a invocação dos executados era abusiva, não poderá, pois, subsistir, por a mesma contender com o regime jurídico vertido no DL 227/2012, que determinava a (prévia) inclusão dos executados no PERSI.

              – do TRP de 04/05/2022, proc. 3751/20.0T8MAI.P1: V – A arguição da referida excepção, com invocação, pelos devedores das normas jurídicas do regime jurídico do PERSI a seu favor, não constitui abuso do direito, antes o normal e legítimo exercício de direitos conferidos por lei em salvaguarda da parte mais fraca na relação contratual.

              – do TRC de 08/03/2022, proc. 824/20.2T8ANS.C1: IV – Na falta de factos indiciadores de má-fé, a invocação pelo devedor das normas jurídicas do regime jurídico do PERSI a seu favor não constitui um abuso do direito.

              – do TRG de 10/02/2022, proc. 5978/19.8T8VNF-A.G1: 3 – As normas que consagram a obrigatoriedade das comunicações da integração do cliente bancário no PERSI e da extinção deste têm carácter imperativo […]. 4 – Não constitui abuso do direito a invocação por consumidores clientes bancários de tais normas no âmbito da acção executiva contra si instaurada, numa situação em que “deixaram de cumprir as suas obrigações” em 30/12/2018, emergentes de contrato de crédito celebrado em 05/06/2002 para aquisição de habitação própria permanente, aquando da interpelação para pagamento (em 02/07/2019) deviam 1.514,03€, a resolução foi operada por comunicação de 11/09/2019, a execução foi instaurada em 25/09/2019 e em 21/04/2021 a dívida cifrava-se apenas em 994,59€, quando no período do incumprimento fizeram vários pagamentos de montantes em dívida e a instituição de crédito, para além da postura activa de interpela-ção para pagamento e de diligência para recuperar o crédito, limitou-se a esperar que fosse “convocada” pelos clientes bancários em dificuldades e a “analisar” as propostas que estes lhe fizeram chegar, sem integrar os consumidores no PERSI e cumprir as respectivas obrigações.

              – do TRL de 21/05/2020, proc. 5585/15.4T8FNC-A.L2-2: IV – Não configura abuso do direito a invocação pelos executados dessa excepção se, em face do factos provados, não se descortina nenhuma razão objectiva para que a exequente pudesse confiar que, caso instaurasse (como fez, em 01/10/2015) uma acção executiva contra os mesmos fundada no incumprimento, verificado a partir de 01/05/2015, dos contratos de mútuo (celebrados em 28/12/2012), eles se iriam abster de invocar na sede própria as garantias de que beneficiavam por força de lei imperativa, tão pouco se podendo considerar que estivessem manifestamente a exceder os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.

                                                               (V)

                                                     Um só PERSI?

              Na base daquelas concepções (do processo negocial paralelo ou da aplicação do abuso de direito) está ainda a também inaceitável tese de que não se pode verificar mais do que um incumprimento e um PERSI, o que não tem qualquer base legal – sendo que o caso dos autos demonstra a irrazoabilidade deste tese, como se um deslize da falta de um pagamento de 307,91€ em 2015 pudesse levar a que, depois de retomada a regularidade do pagamento do mútuo, a mutuária não pudesse beneficiar de novo PERSI por um incumprimento em 31/08/2018.

            (no sentido da exigibilidade de um novo PERSI, perante um novo incumprimento, vejam-se os acórdãos do STJ de 02/02/2023, proc. 1141/21.6T8LLE-B.E1.S1: V. O procedimento PERSI deve ser repetido sempre que ocorra futuro e sucessivo incumprimento: quer a letra da lei, quer o espírito que preside ao DL 272/2012, não dão sustento à interpretação que limita a um único PERSI o incumprimento pelo mutuário num contrato de mútuo em que se convencionou o reembolso do capital e juros em prestações mensais, em contratos em que o mutuário fica vinculado a reembolsar o empréstimo por períodos largos de tempo, que podem atingir as dezenas de anos, como sucede nos casos de empréstimos para a habitação. A diversidade de situações justifica o desencadear de diferentes procedimentos.; do TRP de 04/05/2022, proc. 3751/20.0T8MAI.P1: […] se previamente à acção para cobrança de um concreto/ /específico crédito (procedimento judicial) não tiver havido integração em PERSI, com vista à obtenção de pagamento do mesmo (prévio procedimento extrajudicial), mesmo que anteriormente tenha havido um PERSI que tenha conduzido ao pagamento de importâncias anteriormente em dívida do mesmo ou de outro contrato, verifica-se tal excepção dilatória conducente à absolvição da instância no caso. IV – Após sujeição de um cliente bancário a PERSI (por incumprimento), outra integração em PERSI pode ter lugar por um posterior incumprimento do contrato, surgindo, de novo, as razões que justificaram e impuseram o primeiro. V – A arguição da referida excepção, com invocação, pelos devedores das normas jurídicas do regime jurídico do PERSI a seu favor, não constitui abuso do direito, antes o normal e legítimo exercício de direitos conferidos por lei em salvaguarda da parte mais fraca na relação contratual.; do TRP de 07/03/2022, proc. 121/20.3T8VLG-A.P1; do STJ de 09/12/2021, proc. 4734/18.5T8MAI-A.P1.S1: III – Num contrato de crédito à habitação, em que se convencionou o reembolso do empréstimo em prestações mensais, ao longo de vários anos, perante a falha no cumprimento de duas prestações, a instituição bancária tinha a obrigação de integrar o mutuário em PERSI, não podendo invocar para o não fazer ter desencadeado um PERSI numa situação de incumprimento ocorrida três anos antes, que se extinguiu por falta de colaboração do mutuário.)

                                                               (VI)

                                             Da cedência do crédito

              O despacho recorrido disse ainda que o facto de a exequente ser uma cessionária não era razão para que o que antecede não se lhe aplicasse. A fundamentação apresentada não é inteiramente correcta, mas a exequente não disse nada contra ela. Seja como for, o que se passa é que, sendo a exequente uma STC – sociedade de titularização de créditos – o impedimento à cedência não existe. Assim, para este caso não é aplicável o que é dito em relação a outros terceiros que não são nem STC nem instituições de crédito, ou seja a inadmissibilidade da cessão.

            (no sentido da inadmissibilidade da cedência a esses outros terceiros veja-se, por exemplo: acórdão do STJ de 02/02/2023, proc. 1141/21.6T8LLE-B.E1.S1: VI. Considerando que o legislador do DL 227/12, teve o cuidado de plasmar todo um conjunto de garantias de defesa aos clientes em situações de mora ou incumprimento, máxime no artº 18º (Garantias do Cliente bancário), estando o mutuário/devedor em situação de lhe ser aplicado o PERSI, a entidade bancária não pode ceder o crédito a terceiro (instituição não bancária) sem ter previamente cumprido as exigências decorrentes do regime ínsito no regime decorrente do DL 227/2012. VII. De outro modo, estaria encontrada uma via expedita para as instituições de crédito se subtraírem à obrigatória sujeição ao regime decorrente do DL 227/2012 (bastando que, em violação desse diploma legal, se abstivessem de integrar obrigatoriamente o cliente bancário no PERSI e cedessem o seu crédito a um terceiro que não é uma instituição de crédito, o que permitiria que este (cessionário) não ficasse sujeito às proibições ou impedimentos elencados no art. 18º e pudesse obter de imediato a satisfação do crédito cedido), VIII. … o que representaria uma autêntica fraude à lei, pois era uma forma de deixar entrar pela janela o que o legislador proibiu que entrasse pela porta, frustrando-se completamente o objectivo prosseguido com a criação do PERSI.; No mesmo sentido, os mutuários do caso deste acórdão do STJ lembram os acórdãos do TRG de 30/01/2022, proc. 5520/18.8T8VNF-A.G1, e do TRC de 08/03/2022, proc. 824/20.2T8ANS.C1, que, perante situações exactamente iguais à dos autos, consideraram que a entidade bancária está proibida de ceder os seus créditos a terceiro que não seja uma instituição de crédito; ainda no mesmo sentido, o ac. do TRC de 15/12/2021, proc. 930/20.3T8ACB-A.C1: I – A falta de integração obrigatória do cliente bancário no PERSI [aprovado pelo DL 227/2012], quando reunidos os pressupostos para o efeito, constitui impedimento legal a que a instituição de crédito, credora mutuante, intente acções judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito. II- Assim como constitui impedimento legal a que a instituição de crédito, credora mutuante, ceda o seu crédito a quem não é uma instituição de crédito. III – De outro modo, a cedência ou a transmissão poderia importar uma desvirtuação do regime consagrado no DL 227/2012, na medida em que se a cessionária não for uma instituição de crédito abrangida pelo âmbito de aplicação daquele diploma legal não estaria obrigada a dar cumprimento ao PERSI.; neste sentido, também Carlos Costa, estudo citado, págs. 395-396).

              Mas, podendo ser feita a cedência a uma STC, por ela estar abrangida na excepção do art. 18/1-c-2-b do DL 227/12 e 5 do DL 453/99, de 05/11 (para efeitos de titularização), como é o caso dos autos, há que ter em conta o que é dito, com os mesmos efeitos que os invocados pelo despacho recorrido, pelo acórdão do TRL de 24/11/2022, proc. 21395/17.1T8SNT-A.L1-2:

1. Na circunstância do devedor não ter sido integrado no PERSI por parte da instituição bancária, quando o devesse ter sido, os efeitos desta falta impõem-se ao cessionário do crédito, designadamente na limitação de não poderem ser intentadas acções judiciais contra o devedor até à extinção de tal procedimento.

2. O crédito que é transmitido quando da cessão de créditos é o mesmo que existe na titularidade do cedente. Se o crédito já estava em incumprimento quando da cessão de créditos e o cedente estava limitado no exercício do seu direito por força do regime do PERSI, designadamente por estar obrigado a integrar o devedor no PERSI, não podendo intentar contra ele acções judiciais com vista à cobrança coerciva do seu crédito até à extinção deste procedimento, nos termos previstos no art. 18/1-b do diploma em questão, o direito de crédito que o mesmo transmitiu à cessionária não pode deixar de ter esta mesma limitação.

3. O regime geral da transmissão de créditos, de acordo com o disposto no art. 585 do CC, admite que o devedor venha a opor ao cessionário, ainda que este os ignorasse, todos os meios de defesa que lhe seria lícito invocar contra o cedente, com a única ressalva daqueles que provenham de facto posterior ao conhecimento da cessão.

4. Esta garantia ou protecção do devedor está também contemplada no art. 6 do DL 453/99 diploma que estabelece o regime jurídico das operações de transmissão de créditos com vista à subsequente emissão, pelas entidades adquirentes, de valores mobiliários destinados ao financiamento das referidas operações, onde se prevê que a titularização dos créditos não implica a diminuição de nenhuma das garantias do devedor que continua a manter os seus direitos com a instituição financeira cedente.

              E também pelo ac. do TRP de 24/01/2023, proc. 7228/21.2T8PRT-A.P1: I – O cumprimento prévio dos deveres impostos pelo regime do PERSI constitui um pressuposto específico da acção executiva, uma condição objectiva de procedibilidade, cuja ausência se traduz numa excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, insanável, que conduz à absolvição da instância. II – A exigência deste pressuposto não é afastada pela cessão do crédito, ainda que para efeitos de titularização. III – Aceitar-se que a cessionária do crédito possa resolver validamente o contrato por factos ocorridos antes da cessão traduzir-se-ia numa violação do regime jurídico da titularização de créditos previsto no DL 453/99, de 05/11, máxime das normas que visam assegurar a neutralidade dessa operação perante o devedor, bem como numa violação do regime jurídico do PERSI, máxime das normas que proíbem cessões de créditos que permitam às instituições de crédito subtraírem-se àquele regime, numa verdadeira fraude à lei, pelo que essa solução deve ser rejeitada.; e ainda pelo TRE de 24/11/2022, proc. 5/17.2T8ENT.E1.

                                                                 *

              Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente.

              A exequente/recorrente perde as suas custas de parte por ter perdido o recurso.  

              Lisboa, 20/04/2023

              Pedro Martins

              1.º Adjunto

              2.º Adjunto