Processo do Juízo de Família e Menores de Cascais

              Sumário:

           I- Não constando dos factos provados quase nada quanto às necessidades do menor e às possibilidades dos progenitores, também porque quase nada foi alegado, o cálculo da pensão de alimentos deve ser feito com base em presunções de necessidades e despesas mínimas, não se tendo que ordenar a ampliação da matéria de facto.

              II- Os filhos de subsequentes relações, que nasceram depois do menor em relação ao qual se estão a calcular os alimentos, também têm de entrar no cálculo das despesas dos progenitores.

              Acordam no tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados:

 

         I. A requereu, a 24/11/2016, a regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente a C, nascido a 12/04/2014, filho da requerente e de B.

              II. Foi agendada conferência de pais, de acordo com o art. 35/1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, para 21/02/2017, tendo comparecido a mãe e a mandatária do pai, com poderes especiais para o representar. Por ter sido informado que o pai estava em estado de ansiedade que o impossibilitava de comparecer, foi agendada nova data para a realização da conferência.

             III. Nessa segunda data, que apenas se concretizou a 18/05/2017, compareceu a mãe e a mandatária do pai que antes tinha enviado uma declaração de uma psicóloga, que diz que o pai tem sido seguido pela signatária em psicologia e aconselha o seu afastamento de situações ansiogénicas. Nessa data foram tomadas declarações à mãe (diz que aufere 640€ + 150 de subsídio de alimentação; vive com dois filhos, o outro de 14 anos de idade; o pai ganhará entre 1200 e 1300€ mensais; a pensão deve ser fixada pelo menos em 200€, mais despesas médicas, medicamentosas e escolares) e pela mandatária do pai, em representação deste, foi dito que irá impugnar a paternidade do menor; concorda que se fixe a residência do menor com a mãe e que esta exerça as responsabilidades parentais; não pretende conviver com o menor; até se apurar se o menor é seu filho não deve ser fixada pensão de alimentos. O MP promoveu que se apurasse o vencimento do pai na base de dados da segurança social, o que foi deferido.

              IV. Depois de ter sido junto aos autos uma consulta àquelas bases de dados onde constava como valor da última remuneração 1025€, foi fixado a 30/05/2017, mais ou menos nos termos da promoção do MP, o seguinte regime provisório do exercício das responsabilidades parentais: este seria exercido pela mãe, com quem o menor residiria; os alimentos seriam de 140€/mês [o MP promovia que fossem de 150€], mais 50% das despesas médicas e medicamentosas do menor [o MP falava destas despesas mas não comparticipadas e incluía despesas com livros e material escolar e visitas de estudo].

                V. Foi solicitado ao Instituto de Segurança Social um relatório sobre a integração do menor no agregado da mãe.

                VI. A 16/06/2017, a mãe veio requerer que o regime provisório fosse completado de modo a, entre o mais, se referir às despesas escolares.

               VII. A 19/06/2017, o pai veio requerer que o processo ficasse suspenso enquanto se decidia a acção de impugnação da perfilhação (a 05/07/2017 foi junta prova de que a acção tinha sido intentada a 19/06/2017); à cautela veio dizer que: o valor fixado era excessivo; não se sabe nada sobre a sua situação económica e despesas que tem; o requerido pela mãe quanto a despesas escolares não se justifica porque os alimentos já as compreendem; para o caso de o processo não ser suspenso pede prazo para apresentar todas as suas despesas.

               VIII. A 20/06/2017 a mãe opôs-se ao pedido da suspensão (a acção de impugnação não é prejudicial, como diz o ac. do TRL de 20/05/2014, proc. 139/12.2T2AMD-B.L1-2) e à alteração do valor fixado para os alimentos e juntou documento para prova de que paga 48,50€ para o ATL, 9€ para música e 9€ para ginástica.

               IX. O pai foi notificado para fazer prova das despesas mensais.

             X. A 05/07/2017, a mãe veio requerer que se fizessem as diligências necessárias, conforme previsto no art. 48 do RGPTC, para tornar efectiva a prestação de alimentos provisoriamente fixada e que esta fosse completada como requerido anteriormente (neste requerimento volta a dizer que aufere 640€ + 150€ de subsídio de alimentação).

             XI. Por despacho de 10/07/2017 foi determinado que a pensão de alimentos fosse paga por transferência bancária para a conta da mãe e que a mãe deveria enviar ao pai documento referente às despesas em que este tenha de comparticipar.

              XII. A 12/07/2017 o pai fez alegação escrita quanto às suas despesas, protestando juntar documentos para prova em 10 dias e disse auferir cerca de 990,35€, reiterando o requerimento anterior.

              XIII. A 17/07/2017 a mãe faz alegações escritas quanto às suas despesas e junta prova documental para o efeito.

            XIV. A 13/09/2017, o MP promoveu que a pensão fosse agora fixada em 120€ mensais, que o pai viesse comprovar o pagamento da pensão com a advertência de que se não o fizer se requererá o desconto no seu vencimento como pedido pela mãe e que se suspendesse a acção enquanto não fosse decidida a impugnação da perfilhação.

                  XV. A 14/09/2017, a mãe reitera os requerimentos anteriores. 

              XVI. Por despacho de 18/09/2017, foi suspendido o andamento dos autos, com a nota de que tal suspensão não isentará o progenitor do pagamento das pensões fixadas e foi-lhe dado o prazo de 10 dias para fazer prova do pagamento das pensões em que foi provisoriamente condenado, bem como para juntar aos autos os documentos que protestou juntar no seu último requerimento.

               XVII. A 02/10/2017, o pai requereu a prorrogação do prazo por 5 dias.

            XVIII. A 09/10/2017, sem que nada fosse junto até então, foi, nos termos do disposto no art. 48/1-b-2, do RGPTC, determinada a notificação da entidade patronal do pai para: (i) mensalmente, proceder ao desconto no vencimento deste do montante da pensão devida ao menor e que remetesse as quantias descontadas à mãe, (ii) informar qual o montante do vencimento do pai e (iii) fazer prova do primeiro desconto que efectuar.

         XIX. Ao fim da tarde desse dia, o pai fez um requerimento a juntar cinco documentos (na certidão do acórdão, datado de 01/10/2013 de regulação do exercício quanto a outros dois filhos também a residir com a mãe, o montante da pensão está fixado em 50€ mensais para cada um deles, a elevar para 75€ mensais para cada um outro filho quando fizer 18 anos) e a dizer que apesar de não concordar com o facto da pensão de alimentos provisória não ser suspensa, não recorrerá e no decorrer do presente mês juntará ao processo o comprovativo do pagamento, passando, a partir do próximo mês a pagar no prazo estabelecido. No entanto, tendo em conta as suas despesas e existir o processo de impugnação requer que se reconsidere e reduza a pensão para 100€ mensais.

             XX. A 11/10/2017, a mãe diz, no essencial, que os documentos não podem servir para prova de que estejam a ser efectuados os pagamentos (das despesas do pai), ou que eles ainda existam e lembra que o pai é casado pelo que as despesas são partilhadas entre os dois.

              XXI. A 12/10/2017 é notificada a entidade patronal para fazer os descontos.   

           XXII. A 23/10/2017, o pai vem dizer que o tribunal ignorou o requerimento anterior e que ele está chocado com tal situação e sente-se envergonhado perante a sua entidade patronal, receando até que esta não o considere sério, pondo em risco o seu posto de trabalho e por isso requer que se reconsidere o valor a ser pago, sendo que após esse despacho o pai fará a transferência voluntariamente, não tendo a entidade patronal que intervir nesta questão.

            XXIII. A mãe e o MP opuseram-se à alteração do valor e a mãe também a que os descontos deixassem de ser feitos como ordenado.

               XXIV. Por despacho de 31/10/2017 indeferiu-se a alteração do valor.

             XXV. A 15/11/2017 o MP promoveu que o pai fosse notificado para efectuar prova do pagamento da pensão e a 20/11/2017 o tribunal deu ao pai 5 dias para o fazer, do que foi notificada a sua advogada, que nada disse, pelo que, depois, o MP promoveu que se notificasse o próprio pai, o que foi determinado, tendo a carta sido devolvida por não reclamada.

            XXVI. A 12/01/2018, é proferido despacho em que se consigna que “estão em curso os descontos das prestações vincendas. Notifique os pais para contabilizarem as quantias em dívida.”

            XXVII. A 23/01/2018, a mãe veio dizer que o despacho que fixou o valor provisório foi proferido em 30/05/2017; se se considerar que o pai estava obrigado a proceder ao pagamento daquele valor no mês seguinte, ou seja, a partir de Junho de 2017, e que a entidade patronal iniciou os descontos com o vencimento de Outubro, tendo chegado à conta da requerente no dia 01/11/2017, o valor em dívida contabiliza-se em 700€.

          XXVIII. A 07/02/2018, foi proferido o seguinte despacho “apense a estes autos o processo nº 2036/17.3T8CSC. Notifique as partes para, face ao teor do relatório do INML junto ao supra referido processo, requererem o que tiverem por conveniente.”

            XXIX. A 21/02/2018, a mãe veio dizer que em face do relatório do INML junto ao processo apenso, que concluiu que a probabilidade de o requerido ser pai biológico do menor é de 99,9999999999994%, vem requerer que os presentes autos sigam os seus trâmites normais, tendo em vista a regulação definitiva das responsabilidades parentais.”

           XXX. A 12/04/2018 despachou-se no sentido de se insistir “pelo envio do relatório social solicitado.”

            XXXI. A 09/10/2018, a mãe veio requerer de novo que o regime provisório sobre o exercício das responsabilidades parentais fosse alterado de modo a abranger as despesas escolares (infantário) do menor.

         XXXII. A 29/11/2018, o ISS comunicou que tinha sido deferido o pedido de apoio judiciário ao requerido na forma de pagamento faseado da taxa de justiça e demais encargos com o processo.

             XXXIV. A 20/03/2019, o ISS junta um relatório social complementar.

           XXXV. A 29/04/2019, o MP promoveu que se convertesse em definitivo o regime provisório, aditando-se uma cláusula em que o pai pague metade das despesas com livros e material escolar no início da cada ano escolar.

            XXXVI. A 02/05/2019, despachou-se no sentido de se notificarem os pais, com cópia da promoção que antecede para, querendo, em 10 dias, se pronunciarem, com menção expressa de que, nada dizendo no referido prazo, ter-se-á o seu silêncio como uma concordância com o parecer do MP.

              XXXVI. A 16/05/2019, a mãe disse, quanto ao que agora importa, que aceita que se converta em definitivo o fixado quanto ao valor da pensão de alimentos, ou seja, 140€/mês; e que o pai deverá suportar 50% das despesas médicas e medicamentosas; e propõe que seja aditado que o pai suportará 50% das despesas de educação do menor, onde se incluem as actividades extracurriculares.

            XXXVII. No mesmo dia, o pai disse que: A prova da situação económica do pai já se encontra no processo; tendo este, nestes meses todos, considerado o valor dos 140€ manifestamente excessivo face às suas possibilidades económicas. Ora, se acrescentarmos às despesas de saúde também as despesas com livros e material escolar de início de ano lectivo, tal valor torna-se insustentável. Ainda mais que em 20/11/2018, foi pai de uma menina – D – fruto do casamento com a sua actual mulher. Ora, o nascimento da bebé, fez uma grande diferença nos já parcos recursos do pai. Sendo certo que, mesmo sem ainda ter nascido a criança, o MP já promovia, face às despesas do pai apresentadas, que a pensão deveria ser reduzida para 120€ mensais (promoção de 13/09/2017); assim sendo, não concorda que o regime provisório se converta em definitivo, propondo que a pensão de alimentos seja reduzida para o montante de 100€, acrescida das despesas médicas e medicamentosas na proporção de metade, bem como as de início de ano lectivo na mesma proporção.

              XXXVIII. A 17/05/2019, a mãe veio pronunciar-se sobre o que foi dito pelo pai, entre o mais dizendo que tal facto não constitui uma nova circunstância para o fim visado pelo mesmo (ac. do TRE de 12/07/2012); com efeito, nas novas responsabilidades parentais assumidas pelo requerido através do nascimento de outra filha não o podem desobrigar ou servir de pretexto para diminuir as suas responsabilidades em relação a outro filho que já existia. Acrescentando que é incompreensível que o requerido que priva o seu filho da sua companhia, da sua assistência e do seu afecto, ainda queira prejudicá-lo mais fundando o pedido de redução do valor da pensão no nascimento recente de uma irmã, com que, em detrimento do outro, vai estar todos os dias, acompanhando-a e apoiando-a a todos os níveis no seu crescimento.

              XXXIX. A 20/05/2019, é dada de novo vista ao MP que diz que mantém a promoção anterior, devendo acrescentar-se ao regime a cláusula de actualização da pensão de alimentos. E depois acrescenta: requerimento de 23/01/[2018] a suscitar incidente de incumprimento da pensão de alimentos no valor de 700€: promovo se declare verificado e se condene o pai no pagamento da importância reclamada.

         XL. A 22/05/2019, quanto ao requerimento de 23/01/2018 é determinada a notificação do pai para se pronunciar – cfr. art. 41/3 do RGPTC -, com a cominação habitual. E depois determina-se que se pesquise na base de dados da Segurança Social valor actualizado dos vencimentos do pai e da mãe. Isto deu o resultado de 800€ para a mãe em Junho de 2018 e nenhum resultado para o pai.

             XLI. A 27/05/2019 é proferida sentença determinando-se que a criança ficará a residir com a mãe, competindo a esta em exclusivo o exercício das responsabilidades parentais, e fixando-se um regime de visitas do pai; e ainda o seguinte: (4) o pai da criança contribuirá com 140€ mensais, a título de alimentos, quantia que pagará até ao dia 8 de cada mês, mantendo-se o desconto no vencimento mensal do pai, já em curso; e que será actualizada anualmente, com início em Junho de 2020, de acordo e na proporção do índice de inflação publicado pelo Instituto Nacional de Estatística; (5) o pai suportará 50% das despesas médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada, do filho, bem como, no início de cada ano escolar, 50% das despesas com livros e material escolar do filho, valores que a mãe remeterá para a morada ou para o email do pai no prazo de 15 dias depois de efectuada a despesa e que o pai fica obrigado a pagar à mãe até 8 dias depois do conhecimento da despesa.

              XLII. Nesse mesmo dia, a mãe vem informar que o pai já procedeu ao pagamento dos 700€ referentes à pensão de alimentos que estavam em falta.

             O pai recorreu da sentença, impugnando parte da decisão da matéria de facto e para que (i) o valor da pensão seja fixado em 100€ mensais, (ii) não seja ordenado o desconto pela entidade patronal porque o pai pagará voluntariamente, (iii) as despesas tenham de ser comprovadas com recibo e ter anexas receita médica ou recomendação/lista da escola e (iv) apenas tenham de ser pagas caso a mãe as remeta no prazo de 15 dias.

              A mãe contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso e, ao abrigo do art. 636/2 do CPC (ex vi do art. 32 do RGPTC), requer a ampliação do objecto do recurso, de modo a que seja eliminada a parte do ponto 8 dos factos provados, em que se diz que o pai tem mais um filho, com quem vive, nascido da relação actual, porque o pai não juntou o respectivo assento de nascimento; e tal impedirá que o pai invoque a alteração de circunstâncias decorrente desse facto, para fazer reduzir o valor da pensão; e recorreu subordinadamente para que (i) a pensão fosse fixada em 155€ mensais; (ii) as despesas com livros e material escolar não ficassem limitadas ao início do ano escolar (mas aceita que elas tenham de ser comprovadas como pretendido pelo pai com a recomendação/lista emitida pela escola); (iii) e nessas despesas ficassem incluídas uma actividade extracurricular e o ATL.

                                                                 *

              Questões que importa decidir: a alteração da decisão da matéria de facto, pretendida pelo pai e pela mãe; e as alterações na decisão de direito, relativas ao valor da pensão e abrangência da mesma.

                                                                 *

              Foram dados como provados os seguintes factos com interesse para a decisão daquelas questões:

  1. C nasceu no dia 12/04/2014 e é filho de A e de B.
  2. O menor viveu sempre com a mãe.
  3. O pai não o procura, não se interessa por ele e não quer ter qualquer contacto com este filho.
  4. O menor vive com a mãe e um irmão uterino, com 16 anos de idade, estudante, agregado familiar onde está bem integrado, onde tem um quarto só para ele e que providencia pelos seus cuidados e bem-estar físico e emocional.
  5. O menor C frequenta o Jardim de Infância, onde está bem integrado e é descrito como um menino meigo e simpático.
  6. Em face de dificuldades pedagógicas diagnosticadas, beneficia de terapia da fala.
  7. A mãe trabalha de forma remunerada, auferindo cerca de 706€ mensais, paga 525€ mensais de renda de casa e conta com o apoio, nomeadamente financeiro, da família materna alargada.
  8. O pai trabalha, aufere cerca de 990€ mensais, vive com uma companheira/cônjuge, tem mais dois filhos [E e F] de outra relação, com quem não vive e relativamente aos quais está fixada pensão de alimentos [50€ para cada um dos menores, valor que passará para 75€ no mês em que o filho G completar 18 anos de idade], e, entretanto, mais um filho nascido da relação actual, com o qual vive [D]. [os dois primeiros parenteses foram colocados por este TRL com base na certidão da Conservatória do Registo Civil junta a fls. 149 a 154 e ao abrigo dos arts. 663/2 e 607/4, ambos do CPC]
  9. A mãe sempre decidiu as questões referentes à criança.
  10. O C tem os gastos normais para uma criança da sua idade.

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           Da impugnação da decisão da matéria de facto

           O pai dedica a esta impugnação as seguintes conclusões:

IV. O tribunal dado como provado que “a mãe trabalha de forma remuneratória, auferindo cerca de 706€ mensais, paga 525€ mensais de renda de casa e conta com o apoio, nomeadamente financeiro, da família materna alargada”.

V. No entanto, e apesar dos documentos apresentados, o tribunal apenas deu como provado que “8. O pai trabalha, aufere cerca de 990€ mensais, vive com uma companheira/cônjuge, tem mais dois filhos de outra relação, com quem não vive e relativamente aos quais está fixada pensão de alimentos, e, entretanto, mais um filho nascido da relação actual, com o qual vive”;

VI. Ou seja, o tribunal desvalorizou por completo, quer os documentos apresentados pelo pai, nos quais este comprovava as suas despesas, nomeadamente: – renda de casa, no montante de 425€; – empréstimo de veículo automóvel, no montante de 162,86€; – consultas de psicologia: quer a declaração apresentada a 17/05/2017, quer o recibo junto aos autos; – o valor pago a título de alimentos aos filhos mais velhos, conforme acordo da regulação das responsabilidades parentais que se juntou.

              A mãe diz, no essencial, aquilo que já tinha dito na sua resposta de 11/10/2017 ao requerimento de apresentação de documentos pelo pai.

              O tribunal recorrido disse que “para prova do valor referido pelo pai a título de renda de casa, não foi junto documento bastante.”

              Decidindo:

              O pai, segundo decorre das conclusões (e também do corpo das alegações) não põe em causa os factos que se referem à mãe; o que quer é que os factos que lhe dizem respeito sejam parcialmente aditados.

              O pai invoca como prova das despesas os documentos que apresentou. Não diz quando nem onde eles estão. Tendo em conta o relatório deste acórdão, sabe-se, no entanto, que o pai se está a referir aos documentos juntos com o requerimento de 09/10/2017; o documento que no caso interessa é o doc.5 (fl. 158), mas trata-se de uma simples talão de uma transferência através do multibanco, em que o pai terá escrito, à mão, “renda casa”. Ora isto, sem mais, não é suficiente para comprovar que se trata do pagamento de uma renda de casa, nem que ela ainda se mantém, etc.

              Quanto ao empréstimo para compra de veículo automóvel, no montante de 162,86€; está junto um documento, extracto integrado, a fls. 155, dirigido ao pai pela I, que se refere a um crédito automóvel, contrato celebrado a 29/09/2016, pelo capital inicial de 10.556€, a pagar a 96 meses, com uma TAN de 9,169%; refere-se à 11.ª prestação de Agosto de 2016, tendo já sido pagos 764,09€; este valor corresponde, por isso a, mais ou menos (dividido por 10 prestações anteriores), 76,41€ mensais; o valor de 162,86€ diz respeito a 79,78€, mais 74,83€ de juros. Assim, o documento apenas dá conta que o pai tem de pagar uma mensalidade de 162,86€ por um crédito automóvel, durante mais 85 prestações mensais. O facto de a mãe dizer que o documento não comprova que os pagamentos estejam a ser feitos, não evita que a obrigação exista.

              Quanto às consultas de psicologia: a declaração apresentada para a conferência de Maio de 2017 e os documentos juntos a fl. 156 com o requerimento de Out2017, comprovam que o pai teve 14 consultas em psicologia até 24/05/2017 e a declaração sugere que poderá vir a ter mais, mas não o comprova. Não tem pois interesse para os autos.

              Quanto ao valor pago a título de alimentos aos filhos mais velhos, conforme acordo da regulação das responsabilidades parentais: este acordo serviu para provar a existência da obrigação, mas, como a mãe diz, não serve para provar o pagamento, que é o que o pai quer que se dê como provado.

              Assim, quanto a tudo isto, é apenas parcialmente procedente a pretensão do pai, devendo ser acrescentado que o pai tem de pagar uma mensalidade de 162,86€ por um crédito automóvel, durante mais 85 prestações mensais (até até Set2024).

                                                                 *

Parte final do ponto 8 dos factos provados

              O facto de não ter sido junta a certidão de nascimento da última filha do requerido, não impedia, ao contrário do que refere a mãe, que o tribunal desse tal facto como provado.

              É certo que os factos que estejam sujeitos a registo, como é o caso, se provam, normalmente, com certidão do registo, mas tem sido entendido que quando o facto em causa não é, ele próprio, o objecto do processo, o mesmo pode ser tido em consideração se houver outra prova dele.

              Ou seja, e nos termos práticos como a questão normalmente se coloca, tem-se admitido que as partes podem reconhecer determinadas situações jurídicas; assim, por exemplo, têm-se admitido que se dê como provado que A é casado com B, quando essa situação não é, ela própria, precisamente o objecto do processo.

              Neste sentido, apenas por exemplo, veja-se, com citação de vários outros acórdãos no mesmo sentido, o ac. do TRG de 05/07/2007, proc. 1092/07-2: “O estado civil ou o parentesco podem alcançar-se mediante acordo das partes ou confissão, sempre que os respectivos factos jurídicos não constituam o thema decidendum da acção, antes constituindo relações jurídicas prejudiciais ou condicionantes, meros pressupostos da decisão a proferir […]. E o ac. do TRC de 20/01/2009, proc. 5924/06.9TVLSB.C1: 4. “Desde que não seja esse o thema decidendum, a prova do casamento não necessita de ser feita por documento autêntico, bastando, para tanto, a ausência de impugnação do estado civil.”

              Ora, no caso dos autos a mãe, que está necessariamente em contacto com o pai (devido ao filho em comum) e que tem conhecimento das condições de vida deste, não pôs em causa a existência desta filha e que ela naturalmente viva com o casal formado pelo pai e pela mulher actual, tanto que até utilizou como argumento contra o pai, o facto de este estar com a filha e não com o filho, na sua “resposta” de 17/05/2019.

              Improcede a impugnação.

                                                                 *

              Da falta de dados para a fixação da pensão alimentar

              O pai dedica a esta matéria as seguintes conclusões do seu recurso:

XX. A fixação da prestação de alimentos deve ter em conta a necessidade de quem os recebe; contudo não devem ser ignoradas as reais possibilidades de quem os presta.

XXI. A sentença recorrida é omissa quanto às necessidades do menor cuja quantificação é imprescindível para tornar possível a repartição das responsabilidades dos progenitores de acordo com a capacidade económica de cada um deles.

XXII. A medida dos alimentos a prestar por cada um dos progenitores, para além de ser determinada em função das necessidades do filho, não pode deixar de ser proporcional aos rendimentos e despesas de cada um dos pais.

XXIII. E, como já vimos, as despesas do pai, não foram dadas como provadas.

              A mãe responde, a isto, que: a sentença não é omissa quanto à quantificação das necessidades do filho.

              Decidindo:

              Na fixação da pensão alimentar, devem ser realmente ponderados “os meios daquele que houver de prestá-los e a necessidade daquele que houver de recebê-los (art. 2004/1 do Código Civil).

              E, efectivamente, o processo fornece poucos dados relativamente a isso, pelo que a questão colocada com aquelas conclusões poderia ter a ver com a necessidade de ampliação da matéria de facto (art. 662/2c do CPC).

              Mas tal corresponde ao que o mais das vezes acontece neste tipo de processos, em que as partes quase nada alegam de concreto sobre as necessidades do menor e possibilidades e despesas dos progenitores e, mesmo quando alegam alguns factos, quase nada provam daquilo que alegam.

              Isto contra aquilo que decorreria da aplicação das normas gerais de que aquele que pede alimentos, ou em nome de quem eles são pedidos, tem de fazer a prova dos elementos que fundamentam a sua pretensão, isto é, que contribuam para o aumento do seu valor (art. 342/1 do CC) e aqueles que são chamados a pagar os alimentos, têm de fazer prova dos encargos que sirvam para diminuir esse valor (art. 342/2 do CC) (neste sentido, por exemplo, Rute Teixeira Pedro, CC anotado, Almedina, 2017, pág. 906).

              O que em quase todos estes casos leva a que o tribunal de 1.ª instância – e depois o tribunal de recurso – decida com base em considerações genéricas, correspondentes a necessidades e despesas mínimas de todos os intervenientes. Ou seja, se quase nada se alega e prova, parte-se do princípio de que, pelo menos, as necessidades e as despesas são as mínimas.

              E isto porque elas, como corresponde à natureza das coisas, existem sempre, pelo menos no mínimo, pelo que era a sua não existência (algo de extraordinário), ou o valor para além do mínimo, aquilo que se teria de alegar e provar.

            Neste sentido (para a questão paralela dos rendimentos indisponíveis no CIRE e com recurso ao SMN), vão, por exemplo, os acs. do TRP de 06/03/2012, proc. 1719/11.6TBPNF-D.P1, do TRP de 19/09/2013, proc. 3123/11.7TBVLG, do TRP de 05/05/2016, proc. 5757/15.1T80AZ (estes dois últimos publicados em https://outrosacordaostrp.com), do TRL de 22/03/2018, proc. 24815/15.6T8LSB-2, e do TRP de 08/03/2019, proc. 5017/17.3T8OAZ-B.P1 (para além de outros citados por estes).

              No caso dos autos, aliás, isto é notório, pois que no ponto 10 dos factos provados se diz que o C tem os gastos normais para uma criança da sua idade e nenhuma das partes disse nada contra isso.

              Sendo que aquilo que se diz sobre as necessidades e possibilidades da mãe é quase nada, e nem esta nem o pai o puseram em causa, apesar de o terem podido fazer, sendo por exemplo fácil de ver que se a mãe disse, por duas vezes, em ocasiões diversas, que recebia 640€ + 150€ e depois ainda se obteve uma informação de que ela recebia, em Junho de 2018, 800€, não devia fazer sentido que se desse como provado que ela recebia 706€ e apesar disso essa decisão de facto não foi impugnada.

              E sobre o pai ainda existe menos, sendo que aquilo que o pai tentou que ficasse agora provado é praticamente inútil, como decorrerá do que se dirá mais à frente.

              Para além de que as partes se conformaram com o facto de no processo apenas se ter produzido prova documental.

              Pelo que, aquilo que existe é o que normalmente existe e no caso não se justifica que se averigúe mais nada, pois que, com o que existe, será, apesar de tudo, possível decidir as questões colocadas.

                                                                 *

Do desconto das pensões no vencimento do pai

              Nas conclusões IX a XVII o pai impugna a decisão de as pensões continuaram a ser descontadas no seu vencimento pela sua entidade patronal, dizendo:

[…]

X. Apenas não pagou as pensões fixadas a título provisório porque, em primeiro lugar, pretendia que esta acção fosse suspensa até à sentença da acção que estava a correr em apenso da acção de impugnação de perfilhação.

XI. E porque ainda estava na esperança que esse valor fosse reduzido.

XII. Precisamente devido às suas despesas e ao facto da regulação ser provisória.

XIII. Nunca foi sua intenção não pagar, a menos que a criança não fosse sua filha, o que não é o caso.

XIV. Logo, não se vislumbra o motivo de a pensão se manter a ser descontada no seu vencimento.

XV. A própria entidade patronal não vê tal desconto com bons olhos, sentido que os colegas o vêem como incumpridor.

XVI. Para além disso, tal “desconto” tem-lhe dificuldade a vida pois, já por diversas vezes, tentou recorrer ao crédito bancário e tal solicitação foi-lhe negada precisamente, segundo lhe explicaram, porque estava “marcado” com a questão da “penhora” no vencimento!

XVII. Ora, é um homem trabalhador, não poderá fazer, como aliás, já faz com as despesas médicas, a transferência para o NIB indicado pela mãe?

              A mãe responde que:

     A decisão do desconto resulta de um incumprimento por parte do requerido/recorrente, incumprimento esse que se prolongou por cerca de dois anos e só cessou porque aquele se viu na iminência de ser feita uma nova comunicação de desconto à entidade patronal.

              Decidindo

              Ora, (i) o que consta de XV e XVI são factos que não constam dos provados e o pai não tenta demonstrar que eles estão provados; (ii) não se entende que alguém com a obrigação de pagar alimentos a pelo menos 4 filhos e tem um vencimento de apenas 990€, ainda pense recorrer a crédito bancário para além daquele que já tem; (iii) as explicações constantes de X e XI para não pagar a pensão provisória não têm cabimento, muito menos a partir do momento em que ela foi fixada apesar disso, bem como partir do momento em que foi dito expressamente ao pai o contrário do que ele pensava (ponto XVI do relatório deste acórdão); (iv) o filho nasceu em Maio de 2014, a mãe veio requerer a regulação em fins de Novembro de 2016 e o pai ainda em fins de Out2017 não tinha iniciado, voluntariamente, o pagamento dos alimentos fixados em Maio de 2017, apesar de saber que a isso estava obrigado perante o seu filho perfilhado voluntariamente, sendo que as conferências de pais que teriam permitido uma fixação de alimentos anterior a Maio de 2017, não se realizaram por motivos imputáveis à esfera jurídica do pai; (v) apesar de estarem acumuladas, desde Outubro de 2017, pensões por pagar no valor de 700€ e de as ter podido pagar voluntariamente, demonstrando ser bom pagador, o pai só as veio pagar em Maio de 2019; (vi) o pai sabe que a mãe diz que não há prova de que ele está a pagar alimentos aos outros filhos, apesar de estar obrigado a isso; o pai, para tentar convencer de que, apesar de tudo o que antecede, pagaria voluntariamente os alimentos, deveria, ao menos para os efeitos da pretensão agora em análise, ter feito prova de que estava a pagar os alimentos aos outros filhos.

              Tendo tudo isto em consideração, entende-se que este tribunal não deve arriscar, à conta do menor dos autos, a possibilidade de, se fosse ordenada a cessação dos descontos, o pai deixar de pagar voluntariamente a prestação, ao menos em momentos em que tivesse mais dificuldades – que são prováveis de acontecer -; por outro lado, a ordem do desconto já foi feita e o eventual descontentamento da entidade patronal, ou vergonha do pai perante esta, já aconteceu e não é algo que agora se possa apagar.

              Pelo que se entende que não deve ser ordenada a cessação dos descontos.

                                                                 *

                                                  O valor da pensão

              Finalmente, quanto ao valor da pensão.

              O pai diz que devem ser 100€ em vez de 140€.

              Para isso diz, no essencial, aquilo que consta das conclusões VII e XXV a XXX, ou seja, que:

         Depois da fixação da pensão em 140€ nasceu mais uma sua filha, em Novembro de 2018, o que implicou uma diminuição substancial do seu rendimento disponível, face ao aumento inevitável de despesas, sendo-lhe muito difícil, com tantas despesas — juntas no processo, mas não consideradas provadas — o pai suportar o que veio a ser fixado na decisão recorrida, parecendo-lhe, face às necessidades da criança e à alteração da situação económica do pai, mais adequado e proporcional que a sua contribuição seja fixada em 100€ mensais.

              A mãe opõe-se à pretendida redução dos 140€ para os 100€ e pretende mesmo que a pensão seja aumentada para 155€, dizendo, para isso, o seguinte:

         Os 140€ não são excessivos e o pai não provou a existência das despesas alegadas; mesmo que essas despesas existissem, seriam, na sua maioria, partilhadas entre ele e a sua actual mulher, não se justificando, pois, de todo o modo, a alteração; o nascimento de outro filho, não constitui uma nova circunstância a ter em conta, pelo que não pode justificar também a alteração da pensão de alimentos (ac. do TRE de 12/07/2012 [proc. 580/08.8TMSTB-A]); tal alteração, a existir, consubstanciaria uma discriminação do menor, privado da sua presença e carinho, em relação à outra filha; a sentença teve em consideração a proporcionalidade entre as necessidades do filho e as possibilidades do pai; a pensão deve ser fixada em 155€ mensais atendendo ao valor do vencimento do pai, que é superior ao da mãe, e ao facto de não terem sido dadas como provadas as despesas pelo mesmo apresentadas.

                                          *

              Posto isto,

                                           Da medida dos alimentos

              Quer a sentença recorrida, quer as partes, não tentam demonstrar porque é que os 100€, 140€ ou 155€ são o valor correcto para a pensão alimentar.

              O art. 2004/1 do CC, quanto à medida dos alimentos, diz que: Os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los.

              Perante os factos provados e se a prestação tivesse de ter em conta as necessidades concretas do menor e as possibilidades reais do pai e da mãe, seria impossível, dada a escassez dos factos, chegar ao valor correcto da pensão.

              Mesmo quanto ao valor do que seria necessário para a habitação do menor, não se pode partir do facto provado relativamente ao que a mãe gasta com a renda da casa para o respectivo agregado familiar, dado que essa renda é nitidamente excessiva para as condições económicas da mãe. Um agregado familiar com três pessoas com um rendimento mensal de 706€ (ou pouco mais como se verá de seguida) não pode contratar um arrendamento de 525€, no qual gastará quase 75% daqueles 706€ (costuma dizer-se isto em relação às despesas dos obrigados a alimentos – veja-se, por exemplo, Clara Sottomayor, Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais nos casos de Divórcio, 2016, 6ª edição, reimpressão de 2014, Almedina, em várias passagens das págs. 336-339, Rute Teixeira Pedro, obra citada, pág. 905 -, mas como as despesas dos progenitores com a guarda também têm de ser consideradas, isto também vale quanto a estes).

              Mas, como se disse acima, isto pode ser ultrapassado considerando o seguinte:

                                         Das necessidades do menor

              A nível das prestações alimentares, em que normalmente poderão estar em causa, também, prestações da segurança social, pode-se considerar que um IAS (indexante de apoios sociais, regulado na Lei 53-B/2006, de 29/12, com alterações posteriores – segundo a Portaria n.º 24/2019, de 18/01, o valor do IAS para o ano de 2019 é de 435,76€) representa o mínimo económico para uma vida minimamente digna de um adulto. Por uma razão de economias de escala, tem-se considerado que os menores que vivam com um adulto precisam, para esse mesmo nível de vida minimamente digna, de 0,5 IAS (no art. 5 do DL 70/2010, de 16/06, na redacção actual, dispõe-se que no apuramento da capitação dos rendimentos do agregado familiar, a ponderação de cada elemento é efectuada de acordo com a escala de equivalência seguinte: requerente, peso 1; por cada indivíduo maior, peso 0,7; por cada indivíduo menor, peso: 0,5).

              Remédio Marques (Algumas Notas Sobre Alimentos – devidos a menores -, Coimbra Editora, 2.ª edição revista, 2007, nota 270 da página 202) em vez do IAS (que ainda não existia) utiliza o valor muito mais baixo do rendimento social de inserção (actualmente, pelo 1.º adulto 189,66€, pelo 2.º adulto e seguintes: 132,76€; por cada menor: 94,83€), mas considera-se que é mais correcto atender ao valor do IAS porque é a este que a lei tem em conta quando está em causa, por exemplo, a intervenção do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores [veja-se o art. 1/1 da Lei 75/98, de 19/11, na redacção actual, praticamente igual ao art. 3/1 do DL 164/99, de 13/05 (que regulamenta esta Lei), e o acórdão do TRL de 26/09/2019, proc. 1116/17.0T8SXL-C.L1.L1].

              Assim, as necessidades do menor podem ser consideradas como de 217,88€.

                                                                 *

              Possibilidades do pai (descontadas as despesas indispensáveis)

              Quanto às despesas do pai, o raciocínio tem de ser o mesmo: ele precisaria de 1 IAS como valor mínimo. Mas, como ele vive com uma companheira, em razão da respectiva economia de escala, o respectivo agregado familiar, só composto por eles os dois, precisaria de 1 + 0,7 = 1,7 IAS, pelo que cada um deles precisa de 0,85 IAS. 

              (no sentido de as necessidades dos progenitores terem de ser tomadas em conta, veja-se Clara Sottomayor, obra citada, págs. 344-346, falando da reserva mínima de subsistência; e Remédio Marques, obra citada, págs. 196-197; no sentido de os/as companheiros/as dos/as progenitores/as também terem que ser levados em conta, veja-se Clara Sottomayor, obra citada, págs. 338, 342 e nota 763, 346 e Remédio Marques, obra citada, nota 254, págs. 196-197).

              Assim, ele precisa, para si, de 370,40€.          

              Mas como ele tem outros 3 filhos (a precisarem de alimentos; sabe-se que o pai tem outros 4 filhos – num total de 5 filhos (C, D, E, F e G) de 4 mulheres (mas em relação a um deles nunca referiu precisar de lhe pagar alimentos actualmente), presume-se que ele precisa de mais 1/2 (apenas 1/2 porque se terá de presumir que a mãe do filho também poderá pagar 1/2) daqueles 217,88€ (= 1/2 IAS) para o último deles, ou seja, 108,94€; em relação aos outros dois sabe-se que está obrigado a pagar 75€ para cada (seriam 50€ para cada, se ainda estivesse a pagar alimentos ao outro 5.º filho, o que já se viu que não é de presumir; e não interessa se estão ou não a ser pagos; o que interessa é que existe a obrigação de os pagar e há mesmo título executivo desses alimentos).

              (no sentido de considerar as obrigações do progenitor para com outras pessoas, veja-se Clara Sottomayor, obra citada, págs. 336-337, e Remédio Marques, obra citada, pág. 197-198;

              Assim, para alimentos dos outros 3 filhos, ele precisa de 108,94€ + 75€ + 75€ = 258,94€.

              Pelo que as necessidades totais do pai, as suas despesas que não podem deixar de ser satisfeitas, num nível mínimo, são de 629,34€.

              Como possibilidades, ele tem um rendimento de trabalho por conta de outrem de 990€ presumivelmente líquidos vezes presumivelmente 14 meses ao ano, ou seja, dividindo por 12 meses, um valor líquido mensal de 1155€.

              (os rendimentos incluem os 14 meses de salários/subsídios recebidos – neste sentido, Clara Sottomayor, obra citada, págs. 335/336, e Remédio Marques, obra citada, pág. 198 -, sendo regra geral o seu recebimento; a alegação e prova do contrário é que teria de ser feita; mas depois eles são distribuídos por 12 meses por ano, já que as pensões não são pagas em 14 meses).

              Assim, descontando às suas possibilidades de 1155€ as suas despesas de 629,34€, fica com um rendimento disponível de 525,66€ mensais.

                                                                 *

              Possibilidades da mãe (descontadas as despesas indispensáveis)

              Quanto às despesas da mãe, o raciocínio tem de ser o mesmo: ela precisa de 1 IAS como valor mínimo (já que vive sem outro adulto), ou seja, 435,76€; mais 1/4 de IAS para o outro filho que vive com ela; num total de 544,70€.

              Como possibilidades, ela tem um rendimento de trabalho por conta de outrem de 706€ presumivelmente líquidos vezes presumivelmente 14 meses ao ano, ou seja, dividindo por 12 meses, um valor líquido mensal de 823,67€.

              Descontando às suas possibilidades de 823,67€ as suas despesas de 544,70€, fica com um rendimento disponível de 278,97€ mensais.

                                                                 *

              A soma das possibilidades do pai com as da mãe, dá 804,63€ (= 525,66 + 278,97).

              Pelo que, proporcionalmente, ele pode suportar 65,33% [= se 804,63 => 100, 525,66 => x] das necessidades do filho e ela 34,67%.

              Como essas necessidades, já se viu, são de 217,88€, o pai deverá pagar 142,34€ e não os 140€ fixados.

                                                                 *

A filha entretanto nascida deve entrar nas contas

              Como resulta do que antecede, está-se a considerar que a última filha deve ser tida em consideração nestas contas das despesas. Desde logo, porque não há qualquer razão para assim não ser. As necessidades do pai englobam os alimentos a pagar a todos os filhos, incluindo aqueles que ele presta à nova filha no âmbito do dever de assistência (art. 1874 do CC).

              A posição da mãe, e do tribunal, de desconsiderar a existência desta nova filha, porque ela nasceu depois da fixação dos alimentos provisórios, por um lado esquece que estes são fixados segundo critérios (art. 2007 do CC) que não são coincidentes com os dos definitivos e que, por outro lado, a fixação daqueles não estabelece uma obrigação de alimentos transitada em julgado que só pudesse ser modificada com base numa alteração de circunstâncias (art. 2012 do CC).

              Os alimentos definitivos foram fixados depois do nascimento da filha, pelo que a existência desta já tinha que ser tomada em conta, no cálculo das possibilidades do pai (que têm de ter em conta as suas necessidades/despesas no momento em que são fixados).

              Isto serve também para afastar a pretensão do pai de alterar o valor fixado para os alimentos provisórios com base no nascimento posterior da filha.

              Tudo isto já é suficiente para fundamentar o facto de, no caso, se ter tido em conta, acima, a última filha, mas acrescente-se que dir-se-ia que parece evidente que o nascimento de um novo filho não pode nunca deixar de ser considerado uma alteração de circunstâncias, por implicar um aumento das despesas do pai e por isso uma redução das suas possibilidades, quando as prestações são estabelecidas por valores mínimos. O ac. do TRE citado pela mãe, se for lido no sentido da irrelevância do novo filho, não convence do contrário. As duas obras referidas acima, nas páginas dedicadas à fixação dos alimentos (334 a 350 no caso de Clara Sottomayor, e 185 a 204 de Remédio Marques), têm sistematicamente em consideração os filhos subsequentes e a obra de Clara Sottomayor (obra citada, pág. 347, na nota 775) chega mesmo a referir (sem estar a concordar com ela) a posição de uma autora estrangeira que, inclusive, opta por fazer prevalecer a família actual do progenitor sem a guarda, vivendo os filhos cujos alimentos se estão a determinar da segurança social, posição com a qual não se concorda (neste sentido, também, Remédio Marques, obra citada, pág. 201), mas que dá bem a ideia de que os progenitores não ficam impedidos de ter novos filhos, nem dispensados de lhes pagar alimentos/prestar assistência e, por isso, estes traduzem um acréscimo de necessidades/despesas e, por isso, uma diminuição de possibilidades, que, nos casos de estarem em causa valores mínimos, indicia, suficientemente, só por si, uma alteração de circunstâncias.

                                                                 *

Despesas com livros e material escolar

              A mãe defende que as despesas com livros e material escolar não devem ficar limitadas ao início do ano escolar, porque elas se verificam ao longo do ano.

              E nessas despesas também pretende que sejam incluídas uma actividade extracurricular e o ATL, uma vez que sendo mãe solteira, que nunca contou nem contará com o apoio do pai, nomeadamente para ir buscar o menor à escola, ver-se-á na necessidade de recorrer ao ATL.

              O art. 2003/2 do CC, diz que os alimentos compreendem também a instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor.

              Isto não quer dizer, como pretende a mãe, que, para além dos alimentos, deva ser também fixada uma prestação para a instrução e educação do menor, mas antes que, no cálculo dos alimentos para um menor, deve ser incluído o necessário para a instrução e educação do mesmo.

              Ora, como as despesas invocadas pela mãe são despesas regulares e periódicas, que ocorrem todos os meses, elas já estão incluídas nos alimentos fixados, para mais tendo este cálculo sido feito com base em presunções de necessidades e despesas.

              Tal só não é assim para as despesas extraordinárias (neste sentido, a contrario, Clara Sottomayor, em relação às despesas regulares, obra citada, pág. 349), isto é, aquelas que sejam imprevisíveis e não periódicas, como se presume que o serão as médico e medicamentosas não comparticipadas.

              Tal já não seria o caso das despesas escolares de início de ano – pois que elas se verificam todos os anos e na mesma altura, pelo que são previsíveis e periódicas, mas os progenitores estão de acordo com que estas sejam pagas à parte, pelo que a questão não tem de ser discutida aqui.

              Mas, assim sendo, não se justifica que, como pretende a mãe, para além das já “acordadas”, ainda se tenham em conta todas as despesas escolares ao longo do ano e ainda, logicamente que também ao longo do ano, as despesas com o ATL e actividade extracurricular.

                                                                 *

              Se as despesas devem ser comprovadas com recibo, se as medicamentosas devem ser comprovadas com receita médica e se as escolares devem ser comprovadas com recomendação/lista da escola

              Em parte trata-se de um preciosismo do pai, já que logicamente as despesas deverão ser comprovadas pela mãe com recibo, porque a elas deverá corresponder um recibo e para dar conhecimento delas ao pai nada mais natural do que apresentar um recibo. No entanto, como a mãe não disse nada contra, isso já está implícito na decisão e esta terá de ser acrescentada pelo que se dirá a seguir, não se vê inconveniente em que também isto seja aditado.

              A mãe aceitou que as despesas escolares tenham de ser comprovadas como pretendido pelo pai com a recomendação/lista emitida pela escola, e nada disse quanto ao pedido de apresentar receitas quanto aos medicamentos, pelo que se incluirá tal na alteração da decisão.

              O pai, ao pretender alterar o ponto 5 da decisão, acrescenta que as despesas apenas tenham de ser pagas caso a mãe as remeta no prazo de 15 dias. Se não se trata de uma redacção menos feliz e se o pai pretendeu estabelecer um termo essencial para o envio da prova das despesas, não fundamentou minimamente essa pretensão, nem ela se justifica, pelo que não se defere esta pretensão.

                                                                 *

                     Quanto ao decaimento para efeitos de custas:

              O pai pretendeu diminuir o valor da pensão em 40€ mensais e improcedeu totalmente nessa parte; quis a alteração do ponto 5 da decisão por uma questão de transparência e foi-lhe dada parcial procedência à pretensão; a mãe ampliou o objecto do recurso do pai quanto à impugnação da decisão da matéria de facto e improcedeu nessa impugnação. Considera-se que a improcedência do pai, no recurso dele, respeita a 95% e a da mãe de 5%.

              A mãe pretendeu o aumento da pensão em 72,5€ mensais em relação à decisão recorrida (15€ para além dos 140€, mais 48,50€ de ATL e 9€ para uma actividade extracurricular). Só obteve ganho de causa em 2,34€, logo o seu decaimento é de 96,78€ e o do pai de 3,22%.

                                                                 *

              Pelo exposto, julga-se:

            a) parcialmente procedente o recurso principal (do pai) alterando-se o ponto 5 da sentença recorrida nestes termos: o pai suportará 50% das despesas médicas e medicamentosas, na parte não comparticipada, do filho, bem como, no início de cada ano escolar, 50% das despesas com livros e material escolar do filho, valores que a mãe remeterá para a morada ou para o email do pai no prazo de 15 dias depois de efectuada a despesa, com o recibo da mesma e receita médica para os medicamentos e recomendação/lista da escola para os livros e material escolar, e que o pai fica obrigado a pagar à mãe até 8 dias depois do conhecimento da despesa.

              Custas do recurso, na vertente de custas de parte (não há outras) pelo pai e pela mãe, na proporção do decaimento (95% o pai e 5% a mãe).

               b) parcialmente procedente o recurso subordinado (da mãe) alterando-se no ponto 4 da sentença recorrida o valor da pensão que passa a ser de 142,34€ mensais e não de 140€.

              Custas do recurso, na vertente de custas de parte (não há outras) pela mãe e pelo pai, na proporção do decaimento (96,78% a mãe e 3,22% o pai).

              Lisboa, 10/10/2019

              Pedro Martins

              1.º Adjunto

              2.º Adjunto