Reclamação de Créditos do Juízo de Execução de Lisboa – Juiz 7

              Sumário:

              I- Não se pode arguir uma nulidade processual (necessariamente para o tribunal da 1.ª instância) e ao mesmo tempo recorrer da nulidade (como se fosse uma nulidade da sentença). É só do despacho que decidir a nulidade que se pode, se se puder (art. 630/2 do CPC), recorrer.

              II- Um recurso contra uma sentença de verificação e graduação de créditos não é um articulado onde se possam impugnar os créditos reclamados.

              III- Nos termos do art. 791/2 do CPC, se nenhum dos créditos for impugnado […] profere-se logo sentença que conheça da sua existência e os gradue com o crédito do exequente, sem prejuízo do disposto no n.º 4.

              Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados

  1. A M-SA, requereu uma execução contra a S-SA.
  2. Por apenso à execução, a CGD-SA, reclamou créditos contra a executada.
  3. A secção de processos elaborou e expediu carta para notificação da reclamação à executada – que não tinha advogado constituído – e à exequente (fls. 72 e 73 do processo em papel).
  4. A carta enviada para a executada veio devolvida (fl. 74 do processo em papel).
  5. A 09/05/2019 foi proferida uma sentença que verificou e graduou os créditos da CGD.
  6. A sentença entre o mais disse que “notificados [da reclamação] a executada e a exequente, não houve oposição. […] Os créditos reclamados estão devidamente documentados e não tendo sido impugnados tem-se por reconhecidos […].
  7. A executada apresenta então um requerimento de interposição de recurso, a que acrescenta, na mesma folha, o seguinte, em síntese:

         Ao abrigo do disposto nos artigos 195, 615 e 617 do CPC, vem, além disso, arguir a nulidade da sentença proferida, o que faz dizendo que: a executada, ao contrário do que se diz na sentença e do que impõe o art. 789 do CPC, não foi notificada da reclamação; tal corresponde a uma irregularidade processual com o efeito de nulidade por ter tido influência directa na sentença (por falta de oposição, os créditos reclamados não foram impugnados e por via disso foram reconhecidos).

  1. A seguir junta as alegações de recurso, em que nos 12 primeiros artigos repete, na íntegra, o que consta da arguição da nulidade, nos outros 2 artigos descreve o essencial da sentença e nos 3 artigos subsequentes (= às conclusões 8 e 9 do recurso), acrescenta:

         […], a executada desde já impugna o crédito reclamado.

         Sem embargo da análise da documentação alegadamente junta pela reclamante, a executada entende que, no âmbito dos contratos celebrados, à data de hoje, não são devidas quaisquer importâncias à reclamante.

         Por todo o exposto, entende-se que não deverá ser reconhecido o crédito reclamado, pelo que a decisão a quo deverá ser revogada, substituindo-se por outra que julgue a reclamação improcedente.

  1. Nem a reclamante nem a exequente contra-alegaram.
  2. Por despacho de 12/09/2019, o tribunal julgou improcedente a arguição da nulidade – entre o mais lembrou-se que: As notificações processuais em processos pendentes às partes que não tenham constituído mandatário são feitas por carta registada dirigida para a sua residência ou sede (…), presumindo-se feita no 3º dia posterior ao do registo (…), e a notificação não deixa de produzir efeito pelo facto de o expediente ser devolvido (…), art. 249 do CPC – e admitiu e mandou subir o recurso.
  3. Este despacho foi notificado à executada por carta elaborada a 13/09/2019.
  4. Deste despacho não foi interposto recurso.

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              Questões que importa decidir: se se verifica a nulidade da sentença; se a sentença de verificação e graduação de créditos deve ser revogada.

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              Os factos que interessam a esta decisão são os que consta do relatório que antecede.

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              Decidindo:

              Quanto à nulidade da falta de notificação da reclamação é evidente que não se trata de uma nulidade da sentença, mas sim de uma nulidade processual, já decidida, como devido, pelo tribunal da 1.ª instância. Este tribunal de recurso só poderia conhecer da questão se o despacho que conheceu da arguição da nulidade tivesse sido objecto do recurso (se ele, no caso fosse admissível: art. 630/2 do CPC). Das nulidades processuais reclama-se e, depois, dos despachos que se pronunciam sobre elas, recorre-se. A executada não pode arguir a nulidade processual (necessariamente para o tribunal da 1.ª instância) e ao mesmo tempo recorrer da nulidade (como se fosse uma nulidade da sentença). É só do despacho que decidir a nulidade que se pode, se se puder (art. 630/2 do CPC), recorrer.

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              Um recurso contra uma sentença de verificação e graduação de créditos não é um articulado onde se possam impugnar os créditos reclamados.

              Nos termos do art. 791/2 do CPC, se nenhum dos créditos for impugnado […] profere-se logo sentença que conheça da sua existência e os gradue com o crédito do exequente, sem prejuízo do disposto no n.º 4. E o art. 791/4 do CPC acrescenta: são havidos como reconhecidos os créditos e as respectivas garantias reais que não forem impugnados, sem prejuízo das excepções ao efeito cominatório da revelia, vigentes em processo declarativo, ou do conhecimento das questões que deviam ter implicado rejeição liminar da reclamação.

              O que consta das alegações do recurso não coloca em causa nada que tenha a ver com as excepções ao efeito cominatório da revelia (previstas no art. 568 do CPC) ou com as questões que deviam ter implicado a rejeição liminar da reclamação.

              Assim, os créditos foram, como tinham de ser, reconhecidos, sendo que a argumentação da executada contra tal nem sequer existe, pois que ela, na lógica da invocação da arguição da falta de notificação, diz que nem sequer conhece a documentação alegadamente junta pela reclamante, e que, apesar disso, entende – não diz porquê – “que, no âmbito dos contratos celebrados, à data de hoje, não são devidas quaisquer importâncias à reclamante.”

              Não se alterando a decisão quanto ao reconhecimento dos créditos reclamados, nada mais há decidir pois que a executada não tem qualquer matéria dedicada ao recurso sobre matéria de direito.

                                                                 *

              Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente.

              Custas do recurso, na vertente de custas de parte (não há outras) pela executada (que é quem perde o recurso).

              Lisboa, 11/12/2019

              Pedro Martins

              1.º Adjunto

              2.º Adjunto