Processo 615/19.3T8LSB.L1 do Juízo Local Cível de Cascais – Juiz 4

              Sumário:

              I – A cláusula de um contrato-promessa em que se prevê que caso o financiamento bancário para aquisição do imóvel prometido vender não venha a ser aprovado com o montante mínimo de 240.000€ ou concedido pelo banco financiador até ao dia 02/08/2018, por qualquer motivo, o contrato caducará imediatamente, obrigando-se o promitente-vendedor a reembolsar em singelo ao promitente-comprador o valor do sinal de 20.000€, é uma condição resolutiva do contrato-promessa (art. 270 do CC) e suspensiva do direito do autor à restituição do sinal.

              II – Visto que o banco a quem o autor fez o pedido de financiamento não concedeu o empréstimo até aquela data (como o autor provou, cumprindo assim o ónus da prova que estava a seu cargo por força do art. 342/1 do CC), a condição resolutiva verificou-se e o contrato extinguiu-se automaticamente e o autor tem direito ao recebimento do sinal por verificação da respectiva condição suspensiva (cujo ónus da prova também incumbia ao autor por força do art. 343/3, 1.ª parte, do CC).

              III – Só não seria assim se o réu tivesse provado – o que não aconteceu – que o autor, agindo contra as regras da boa fé, provocou a verificação da condução resolutiva, quer por não ter pedido o financiamento, quer por o ter pedido por um valor inferior, quer por o ter pedido a um outro banco que o aprovou antes daquela data (art. 275/2, 2.ª parte, do CC), de acordo com as três versões diferentes que o réu assumiu no processo.

              Acordam no tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados

              HZ, intentou contra FF uma acção pedindo que seja declarada a caducidade de um contrato-promessa de compra e venda celebrado entre eles e que o réu seja condenado a restituir-lhe o valor pago a título de sinal no montante de 20.000€, acrescido de juros.

              Alegou, para tanto e em suma, que celebrou com o réu um contrato-promessa de compra e venda de um imóvel e ulterior aditamento, nos termos dos quais previram que o contrato caducaria automaticamente, com devolução ao autor do sinal, se, até 02/08/2018, o autor não obtivesse um financiamento bancário de 240.000€; o autor não logrou obter o financiamento até essa data; o autor comunicou esse facto ao réu, solicitando a devolução do sinal; o réu não devolveu o sinal a pretexto de que o autor poderia ter obtido o financiamento junto do NB, SA, e que, por isso, o autor estava em incumprimento do contrato; depois o réu notificou-o para agendar a outorga da escritura de compra e venda, sob pena de considerar o contrato resolvido por incumprimento definitivo e fazer seu o sinal prestado; o autor diz que o banco a que recorreu foi o Millenium BCP, o seu banco de gestão diária; o autor qualifica a cláusula descrita acima como uma condição suspensiva da execução do contrato (para tanto cita Vaz Serra, RLJ 110/326-327 e o ac. do STJ de 22/02/2017, proc. 1512/07.0TBCSC.L1.S1).

              O réu contestou, impugnando, por desconhecimento, se o financiamento que o autor solicitou ao M/BCP foi ou não aprovado, porquanto este nunca lhe remeteu, como devia ter remetido, um comprovativo da não aprovação do crédito; e diz que o teor da parte final da carta remetida pelos advogados do autor ao réu, datada de 01/08/2018, mais não é do que uma clara manifestação de interesse na manutenção do negócio, até que o banco se pronunciasse definitivamente sobre a concessão ou não do financiamento, pelo que não pode servir de fundamento para a caducidade do contrato; acrescenta que: (8) o réu sabia que o autor teve aprovado, junto do NB, o financiamento necessário para a aquisição do imóvel que prometeu comprar, conforme decorre do relatório de avaliação que se junta como doc. 1; (9) o autor solicitou financiamento ao NB para aquisição do imóvel que prometeu comprar. (14) O imóvel que o autor prometeu comprar ao réu foi avaliado em 322.000€, conforme consta do relatório de avaliação. (15) O NB financiava, e continua a financiar, cidadãos não residentes – como era o caso do autor – em montante correspondente a 75% do valor da avaliação. (16) Tendo sido a avaliação do imóvel no valor de 322.000€ e sabendo-se que o NB financia cidadãos não residentes em montante igual a 75% do valor da avaliação, conclui-se que o NB aprovou o financiamento requerido pelo autor no montante de 241.500€. (18) Sucede que o autor, decidiu tentar ludibriar o réu, ao solicitar aos seus advogados para remeter ao mesmo a carta que constitui o doc.3 junto com a PI. (19) Essa carta não faz qualquer referência ao facto de ter havido uma entidade bancária que financiava o autor. (23) Tendo sido o autor a decidir não prosseguir com a concretização do financiamento. (24) É pois falso que o autor não tenha conseguido o financiamento, que o próprio reputava necessário e suficiente. (25) Aquando do envio da carta ao réu, doc.3 da PI, o qual ocorreu no dia 01/08/2018, o autor já sabia que o NB lhe aprovava o crédito para aquisição do imóvel que prometeu comprar ao réu. (26) Com efeito, o relatório de avaliação tem a data de 18/07/2018. (29) Em suma, e totalmente ao contrário do que alega, o autor obteve a aprovação do crédito que necessitava para a aquisição do imóvel que prometeu comprar ao réu. (30) Ou seja, a condição de que dependia o pagamento do reforço de sinal no dia 02/08/2018 verificou-se. (31) Apenas não se concretizou porque o autor não quis. (33) E mais grave é o facto de, por um lado, o autor ter tentado enganar deliberadamente o réu, criando a aparência de que não havia conseguido obter o financiamento necessário à aquisição, (34) E, por outro, ter ocultado de forma ostensiva e com manifesta má-fé que havia recorrido igualmente a financiamento junto do NB e que esta instituição lhe concedia o financiamento necessário. (41) O réu não consegue interpretar o e-mail do BCP, máxime o envio da carta de aprovação – a qual apenas é enviada quando o cliente a solicita e no caso de pretender prosseguir com o financiamento –, como uma não aprovação do crédito, conforme o autor pretende, mas antes como uma verdadeira aprovação do financiamento nos termos solicitados pelo autor. Daí o envio da carta de aprovação. (42) Conclui-se, pois, que embora o autor tenha feito constar no contrato promessa que necessitava de um financiamento mínimo de 240.000€, a verdade é que, tendo o BCP aprovado o financiamento apenas no montante de 188.450€, ainda assim o autor solicitou a emissão da carta de aprovação para prosseguir com o processo de financiamento. (44) Se com 188.450€ de financiamento deu ordem para a emissão da carta de aprovação ao BCP, (45) era porque tinha o remanescente para concretizar a aquisição, (46) pelo que não necessitava, verdadeiramente, dos 240.000€ que disse ao réu serem essenciais à concretização da aquisição e que constam como condição para a concretização da mesma. (52) Se o financiamento aprovado pelo NB fosse concretizado, o autor teria pago pontualmente ao réu o reforço de sinal e, inclusivamente, a escritura de compra e venda já teria sido outorgada. (53) Se o financiamento aprovado pelo NB fosse concretizado, o autor não teria incumprido o contrato promessa de compra e venda, como incumpriu. (54) E se o autor tivesse pago o reforço de sinal previsto no aditamento ao contrato promessa de compra e venda, o que não fez (55) ou mais tarde tivesse marcado a escritura como foi interpelado para fazer, o que também não fez, (56) o réu não teria perdido o interesse no negócio, como perdeu (57) E não teria feito sua a quantia paga a título de sinal pelo autor como legitimamente fez.

              O autor veio responder “à excepção peremptória” [as aspas resultam do facto de o réu não ter qualificado a sua defesa como excepção], impugnando os factos base da mesma e dizendo que em nenhuma parte do contrato-promessa ou do seu aditamento, consta que o autor teria de recorrer a todas as instituições bancárias para ver aprovado o seu crédito ou que caso o crédito não se visse aprovado o autor teria de remeter ao réu prova de tal facto, nem o réu pediu essa prova, além de que foi junta aos autos prova de que o crédito foi aprovado, em data posterior à data de verificação da caducidade por valores que não alcançavam os 240.000€ contratualmente estipulados (cfr. doc.7 junto com a PI). Em nenhum ponto do doc.1 junto pelo réu se pode retirar que o autor teve aprovado junto do NB o financiamento necessário para a aquisição do imóvel. O doc.3 junto pelo réu reporta-se a um email trocado entre uma empregada da M- Lda, a Srª SR, e uma empregada do NB, a Srª VG, do qual apenas se retira que, em geral, o financiamento de não residentes poderá ir até 75% do valor de avaliação de um imóvel; em nenhum ponto deste email é referido o autor, nem um seu pedido de crédito, e muito menos a aprovação de tal pedido, sendo, apenas e só, um email genérico trocado entre duas entidades, sem que nada tenha este que ver com o autor. Para prova disto mesmo, o autor junta o doc.1, cuja obtenção não foi possível em data anterior (e apenas justificada agora por factos alegados na contestação pelo réu), que corresponde a um email remetido pelo NB, mais concretamente pela Srª VG, donde consta que não há “registo de qualquer simulação nem foi submetido nenhum processo de crédito habitação para análise comercial sobre o [autor], nem “durante o ano de 2018 […] houve qualquer troca de e-mail’s sobre o tema em apreço”. Pelo que dúvidas não podem restar de que o autor não solicitou qualquer financiamento junto do NB, que não pode ter sido aprovado, conforme quer fazer crer o réu.

              Depois de realizada a audiência final, foi proferida sentença, julgando a acção procedente.

              O réu vem recorrer desta sentença, impugnando dois pontos da decisão da matéria de facto e a sua condenação nos pedidos.

              O autor contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso, para além de levantar a questão prévia da falta de cumprimento de ónus da alegação no recurso.

                                                                 *

              Questões que importa decidir: a questão prévia; se a matéria de facto deve ser alterada; se o contrato-promessa não caducou.

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                                                  Da questão prévia

              O autor diz que o réu se furtou ao ónus consagrado pelo artigo 640/1-a do CPC, quando, relativamente à matéria de facto, não especifica os concretos pontos de facto que considera terem sido incorrectamente julgados, apenas referindo de forma vaga, genérica e abrangente, que o recurso interposto visa a “reapreciação da prova gravada em sede de audiência de discussão e julgamento, bem como da demais prova produzida nos autos, e a correcta aplicação do Direito à matéria dos autos.” Pelo que deverá, a priori, ser rejeitado.

              O réu, em resposta facultada pelo tribunal recorrido, veio dizer, com alguma síntese, que: 1. Não sendo má-fé, a alegação do autor só pode ser compreendida num quadro de enorme distracção aquando da leitura das alegações de recurso. 2. Com efeito, o réu introduz o recurso referindo que o mesmo visa a “reapreciação da prova gravada em sede de audiência de discussão e julgamento, bem como da demais prova produzida nos autos, e a correcta aplicação do direito à matéria dos autos”. 3. E para que o tribunal ad quem possa fazer tal reapreciação, o réu tem o cuidado de, nas suas alegações de recurso, identificar na gravação o momento em que foram prestados os depoimentos de cada uma das testemunhas referidas nas mesmas e que fundamentam as razões pelas quais o tribunal a quo não podia ter dado como provados certos factos e não dar como provados outros. 4. O réu tem, ao longo das alegações de recurso, a permanente preocupação de, não só identificar os concretos pontos da decisão recorrida com os quais não concorda, como escalpelizar, ao detalhe, quer os depoimentos concretos, quer os documentos específicos que sustentam a sua frontal discordância com a fundamentação da sentença proferida em cada um desses pontos. 5. Não restam pois quaisquer dúvidas que o réu não violou, ao contrário do que refere o autor, as alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 640 do CPC

              Decidindo:

              O réu distorce a questão levantada pelo autor, de modo a poder responder-lhe. O autor nunca referiu o não cumprimento da alínea c do art. 640/1 do CPC. O que referiu foi o da alínea a.

              Por outro lado, o facto de o réu dizer que indicou os pontos de factos impugnados, sem dizer quais foram, é suficiente indício de que não cumpriu devidamente – fê-lo, ver-se-á à frente, de forma deficiente – o ónus que lhe é imposto pelo art. 640/1a do CPC, pois que, senão, seria capaz de concretizar os pontos de facto impugnados.

              Apesar disso, o autor não tem razão.

              A falta de cumprimento adequado daquele ónus – do art. 640/1-a do CPC -, não tem a consequência da rejeição, no seu todo, da impugnação da decisão da matéria de facto. A consequência é rejeição daquilo que não se puder aproveitar.

              O que pode ser aproveitado é apenas aquilo que se traduzir, de forma clara, sem necessidade de nenhuma construção pelo tribunal de recurso, em pontos de facto com decisões manifestamente / claramente / expressamente impugnadas pelas alegações do réu.

              Como isso depende da leitura das alegações do réu, será decidido mais à frente, mas ficando já decidido que não é caso de uma rejeição, em bloco, da impugnação da decisão da matéria de facto.

                                                                 *

              Foram dados como provados os seguintes factos:

         1\ Por documento escrito denominado contrato-promessa de compra e venda, datado de 07/05/2018, cuja cópia se encontra junta a fls. 12 a 16 verso do suporte físico dos autos, o autor, na qualidade de promitente-comprador, e o réu, na qualidade de promitente-vendedor declararam, além do mais, o seguinte:

          É celebrado e reciprocamente aceite o seguinte contrato promessa de compra e venda, que será regido pelas seguintes cláusulas:

          CLÁUSULA PRIMEIRA

          (Prédio)

          O promitente-vendedor é proprietário e legítimo possuidor do prédio urbano sito na Rua N, Concelho de C, descrito na Conservatória do Registo Predial de C sob o número 00000 e inscrito na matriz predial sob o artigo 00000, da mesma freguesia (adiante designado por ‘Imóvel’).

          (…)

          CLÁUSULA SEGUNDA

          (Objecto)

     1. Pelo presente contrato, o promitente-vendedor promete vender ao promitente-comprador, que promete comprar, livre de quaisquer ónus ou encargos, o Imóvel.

          (…)

          CLÁUSULA TERCEIRA

          (Preço e forma de pagamento)

          1 – O preço total a pagar pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor é de 485.000€, o qual será pago da seguinte forma:

         a) 20.000€ são pagos na data da assinatura do presente contrato a título de sinal e principio de pagamento e de que o promitente-comprador dá a devida quitação

          b) No dia 02/07/2018, será pago o valor de 77.000€ a título de reforço de sinal e princípio de pagamento, pagamento a ser efectuado por transferência bancária para a conta com o IBAN PT00;

          c) O remanescente do preço, ou seja, 388.000€ será pago na data da outorga da escritura pública de compra e venda a outorgar nos termos da cláusula 5.ª do presente contrato-promessa de compra e venda.

          (…)

          CLÁUSULA QUINTA

          (Outorga da escritura)

          1 – A escritura pública de compra e venda será outorgada até ao dia 02/10/2018.   

          2 – A escritura pública de compra e venda será marcada pelo promitente-comprador, em Cartório Notarial, o qual deverá avisar o promitente-vendedor, por carta registada com aviso de recepção com pelo menos 15 dias de antecedência, do dia, hora e local da outorga da mesma.

          3 – O promitente-vendedor obriga-se a disponibilizar, logo que para tal seja notificado pelo promitente-comprador, todos os elementos e documentos da sua responsabilidade, necessários à marcação da escritura pública de compra e venda.

          CLÁUSULA SEXTA

          (Financiamento bancário)

          1 – O promitente-comprador irá recorrer a financiamento bancário para aquisição do Imóvel, pelo que caso esse financiamento não venha a ser aprovado ou concedido pelo banco financiador até ao dia 02/07/2018, por qualquer motivo, caducará imediatamente o presente contrato, obrigando-se o promitente-vendedor a reembolsar em singelo ao promitente-comprador o valor do sinal de 20.000€.

          2 – O reembolso do sinal em singelo no caso previsto no número anterior deverá ser efectuado no prazo de 5 dias após o promitente-vendedor ser notificado pelo promitente-comprador de que o banco não aprovou ou não concedeu o financiamento e deverá ser efectuado através de transferência bancária para a conta com o IBAN PT00.

          CLÁUSULA NONA

          (Incumprimento)

          1 – O incumprimento definitivo pelo promitente-comprador confere ao promitente-vendedor o direito de resolver o presente contrato e optar por fazer suas as importâncias recebidas a título de sinal.

          2 – O incumprimento definitivo pelo promitente-vendedor confere ao promitente-comprador o direito de resolver o presente contrato e de exigir do promitente-vendedor a restituição em dobro de todas as importâncias entregues a título de sinal.

          (…)

          CLÁUSULA 11.ª

          (Comunicações)

          Todas as comunicações a realizar no âmbito do presente contrato deverão ser efectuadas por carta registada com aviso de recepção para as moradas constantes da identificação das Partes.

          (…)

          CLÁUSULA 13.ª

          (Mediação Imobiliária)

          As Partes declaram que o presente negócio tem intervenção de mediação imobiliária por parte de M-Lda, titular da licença AMI 0000.

         2\ Em 02/07/2018, o financiamento bancário ainda não havia sido aprovado pela entidade bancária do autor.

       3\ Por documento escrito denominado contrato-promessa de compra e venda – aditamento, datado de 02/07/2018, cuja cópia se encontra junta a fls. 18 a 19 verso do suporte físico dos autos, o autor, na qualidade de promitente-comprador, e o réu, na qualidade de promitente-vendedor declararam, além do mais, o seguinte:

          Considerando que:

            A) As Partes celebraram um contrato-promessa de compra e venda em 07/05/2018;

            (…)

         C) Nos termos da cláusula 3/1b desse contrato-promessa, o promitente-comprador deveria pagar ao promitente-vendedor, até dia 02/07/2018, um reforço de sinal o montante de 77.000€;

          D) Nos termos da cláusula 6/1 desse contrato-promessa, o promitente-comprador iria recorrer a financiamento bancário para aquisição do Imóvel, processo esse que ainda não se encontra concluído nesta data de 02/07/2018;

          Pelo que as Partes acordam em alterar o disposto nas mencionadas cláusulas, conforme segue:

          Cláusula 3.ª

           1. (…)

           a)

           b) No dia 02/08/2018, será pago o valor de 77.000€ a título de reforço de sinal e princípio de pagamento, pagamento a ser efectuado por transferência bancária para a conta com o IBAN PT00;

          c) (…)

          Cláusula 6.ª

         1. O promitente-comprador irá recorrer a financiamento bancário para aquisição do Imóvel, pelo que caso esse financiamento não venha a ser aprovado com o montante mínimo de 240.000€ ou concedido pelo banco financiador até ao dia 02/08/2018, por qualquer motivo, caducará imediatamente o presente contrato, obrigando-se o promitente-vendedor a reembolsar em singelo ao promitente-comprador o valor do sinal de 20.000€.

          Todas as restantes Cláusulas e disposições do contrato-promessa não especificamente alteradas por este aditamento mantêm-se com a mesma redacção, sendo o presente aditamento considerado integrante do contrato-promessa de compra e venda.”

         4\ Em 01/08/2018 o financiamento solicitado pelo autor ainda não havia sido aprovado.

         5\ Em 01/08/2018, o mandatário do autor remeteu ao réu a carta, por este recebida, cuja cópia consta de fls. 20 do suporte físico dos autos, da qual consta, além do mais, o seguinte:

          “A pedido do nosso constituinte [o autor] e na sequência do contrato-promessa de compra e venda celebrado com o mesmo, no pretérito dia 07/05/2018 e respectivo aditamento celebrado em 02/07/2018, informamos que não será possível efectuar o pagamento da quantia de 77.000€ no dia 02/08/2018, tal como se encontrava previsto na cláusula 3/1b do mencionado contrato em virtude do facto do banco financiador ainda não ter procedido à aprovação do financiamento, no valor que o promitente-comprador necessita para completar a aquisição do imóvel.

          Mais se informa que amanhã, dia 02/08/2018, conforme dispõe a cláusula 6/1 do Contrato, se verificará a caducidade do mesmo, sem prejuízo, o meu cliente irá aguardar a decisão bancária que se espera venha a suceder nos próximos dias e logo que a mesma seja do seu conhecimento informarei V. Exa.”

         6\ O réu enviou ao mandatário do autor uma carta datada de 17/09/2018, cuja cópia consta de fls. 21 verso do suporte físico dos autos, da qual consta, além do mais, o seguinte:

          “No dia 02/07/2018 o seu cliente deveria ter efectuado o pagamento de 77.000€ como sinal, o que não fez até esta data.

          Recebi uma carta do Sr. Dr. no início de Agosto a dizer que o financiamento bancário não tinha sido aprovado, razão pela qual não podia fazer o pagamento, no entanto e de acordo com informações e provas que recolhi, o seu cliente já poderia ter obtido o financiamento junto do NB, o que parece que não fez.

          O seu cliente está assim em incumprimento do contrato pelo que, caso o pagamento do reforço do sinal não seja feito até dia 28/09 irei entregar o assunto ao meu advogado para que, entre outras coisas, obtenha integral ressarcimento de todos os prejuízos que já estou a sofrer derivado ao incumprimento do seu cliente.”

         7\. Em 19/09/2018, o Banco Millennium BCP aprovou um montante máximo de financiamento ao autor de 188.450€ para aquisição do imóvel a que se reporta o documento referido em 1.

         8\ Os mandatários do réu enviaram ao mandatário do autor uma carta datada de 24/10/2018, por este recebida, cuja cópia consta de fls. 22 a 23 do suporte físico dos autos, da qual consta, além do mais, o seguinte:

          “(…)

          Por carta datada de 01/08/2018, o Colega comunicou ao nosso Cliente a impossibilidade de o comprador efectuar o pagamento do reforço de sinal a que se tinha obrigado “em virtude do facto do banco financiador ainda não ter procedido à aprovação do financiamento”.

          Na mesma comunicação, refere ainda o Colega que no dia seguinte se verificaria a alegada caducidade do contrato, não obstante referir que o seu Cliente aguardava ainda a decisão bancária sobre o financiamento.

          Ora, nunca mais o nosso Cliente teve qualquer notícia nem do seu Cliente nem do Colega, sobre a concessão ou não do financiamento bancário.

          Sucede ainda que o nosso Cliente tem na sua posse documentos que atestam de forma inequívoca que o financiamento foi aprovado.

          Sabe o nosso Cliente – e pode demonstrá-lo em sede própria, se a isso for obrigado – que o cliente do colega não prosseguiu com o processo de financiamento porque não quis, uma vez que estavam reunidas todas as condições exigidas pelo banco para, nesta situação concreta, ser concedido ao [autor] o financiamento no valor de 240.000€, conforme previsto no aditamento ao contrato promessa assinado a 02/07/2018.

          Na prática, o cliente do colega, por razões que só ele saberá e poderá explicar, não quis prosseguir com o processo de compra e informou o nosso cliente, através do colega, que tinha sido o banco a não conceder o financiamento, sem, contudo, o provar.

          Colocou-se assim o cliente do colega numa manifesta situação de mora, a qual o nosso cliente não mais está disposto a tolerar.

          Deste modo, pela presente carta interpela-se o cliente do colega para, no prazo máximo de 8 dias a contar da recepção da mesma, agendar dia, hora e local para a outorga da escritura pública de compra e venda.

          Na hipótese de tal agendamento não ocorrer no prazo acima referido, o nosso cliente perderá em definitivo o interesse no negócio e considerará o contrato resolvido por incumprimento definitivo do mesmo por parte do Cliente do Colega, sem necessidade de qualquer outra interpelação para o efeito.

          Naturalmente que, caso a escritura não seja agendada no prazo supra mencionado, o nosso Cliente não abdicará de exercer a prerrogativa prevista no n.º 1 da Cláusula 9.ª do contrato promessa, fazendo sua a quantia que lhe foi entregue a título de sinal.”

         9\ Em 20/11/2018, os mandatários do autor enviaram aos mandatários do réu uma carta, recebida por estes em 21/11/2018, cuja cópia consta de fls. 23 verso a 24 verso do suporte físico dos autos, da qual consta, além do mais, o seguinte:

          “(…)

          Acusamos a recepção da vossa carta datada de 24/10, à qual passamos a responder:

          1 – Conforme comunicado ao v/constituinte, por meio da carta datada de 01/08/2018, verificou-se a caducidade do contrato-promessa de compra e venda supra citado.

          2 – Conforme também referido nessa mesma carta, o banco M/BCP, instituição financeira a que o n/constituinte recorreu para obter o crédito, em 02/08/2018 ainda não havia aprovado o financiamento mínimo de 240.000€ para que o n/constituinte pudesse adquirir o imóvel melhor identificado supra.

          3 – O n.º 1 da cláusula 6.ª do aditamento ao citado contrato-promessa de compra e venda indica de forma explícita que caso o financiamento não viesse a ser aprovado com o montante mínimo de 240.000€, ou concedido pelo banco financiador até ao dia 02/08/2018, por qualquer motivo, caducaria imediatamente o contrato, e obrigava-se o promitente-vendedor a reembolsar em singelo ao promitente-comprador o valor do sinal de 20.000€, sinal este já liquidado aquando da celebração do dito contrato-promessa de compra e venda.

          4 – Ora, o financiamento não foi aprovado até ao dia 02/08/2018, não tendo também sido até tal data aprovado o montante mínimo de crédito de 240.000€, nem tão pouco tendo tal acontecido em data posterior, sendo que o montante máximo de financiamento aprovado posteriormente pelo banco Millennium BCP foi de 188.450€.

          5 – Dúvidas não restam, face à leitura do contrato-promessa de compra e venda, e bem assim, do seu aditamento, de que o primeiro caducou em 02/08/2018, importando destacar que a estipulação de tal caducidade é válida nos termos do artigo 330 do Código Civil.

          Assim sendo, ficam V. Exas. interpeladas, enquanto mandatários do [réu], para proceder, no prazo de 5 dias após a recepção desta missiva, à devolução do montante de 20.000€, pago pelo n/constituinte a título de sinal.

          No caso de o v/constituinte pretender proceder voluntariamente à devolução do valor relativo ao sinal, o n/constituinte está desde já na disposição de o ressarcir relativamente às despesas em que eventualmente tenha incorrido, desde que devidamente comprovadas.”

         10\ Por avaliação realizada pela XY-Lda, para a M-Lda, datada de 16/08/2018, foi atribuído ao imóvel a que se reporta o documento referido em 1 dos factos provados o valor de 322.000€.

         11\ Em 07/08/2018, o valor de financiamento pelo NB, SA, a clientes não residentes era de 75% do valor da avaliação.  

*

Da impugnação da decisão da matéria de facto

              A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida, foi a seguinte – transcreve-se quase na íntegra, para se poderem compreender as alegações do réu e as contra-alegações do autor:

         “[…]

         A matéria de facto elencada no ponto 2 da factualidade provada encontra-se admitida por acordo, uma vez que, tendo sido alegada no artigo 5 da PI, foi expressamente aceite pelo réu no artigo 1 da sua contestação.

         A convicção do tribunal acerca da prova da matéria constante dos pontos 4 e 7 dos factos provados assentou na análise do doc.7 junto com a PI (a fls. 25v a 27v) conjugada com os depoimentos das testemunhas TR e WJ, ouvidas em julgamento.

         Com efeito, o aludido documento é composto por um email, datado de 19/09/2018, assinado por TR e remetido de um email com o nome da mesma e domínio millenniumbcp.pt, no qual é copiada WJ, e onde a primeira transmite ao autor que o montante aprovado do crédito foi de 188.450€, anexado uma proposta de crédito com a mesma data, referente ao imóvel dos autos (identificado a fl. 27), para uma aquisição do mesmo por 480.000€, onde se prevê financiamento de 188.450€.

         Deste documento extrai-se a prova directa da matéria de facto vertida em 7 dos factos provados e, a contrario, que em 01/08/2018 o financiamento solicitado ao BCP não tinha ainda sido aprovado (cf. facto provado 4).

         TR, gestora de conta no M/BCP, depôs em tribunal, num depoimento absolutamente desinteressado (e evidenciando até não se recordar do caso concreto, atento o número de financiamentos de que disse tratar para clientes da República da C) e foi num tom calmo e objectivo que, confrontada com o mencionado email, confirmou ser o seu endereço de email e, conquanto tenha referido não se recordar daquele caso concreto, esclareceu ser o teor normal de um email relativo ao pedido de uma proposta de crédito. Mais esclareceu que apenas estabelece a relação comercial com os clientes e, posteriormente, compete a uma outra área do banco analisar a capacidade financeira dos mesmos e solicitar avaliação dos imóveis.

         Após analisar o teor da aludida proposta, esta testemunha referiu também que o valor mencionado no email era, provavelmente (e de acordo com a sua experiência) o montante máximo que o banco estaria disposto a financiar ao cliente, acrescentando – após ver o aludido documento – que tinha a ideia de o processo de financiamento não ter prosseguido.

         Também WJ (cujo nome, como se referiu, é identificado no email junto como doc.7) depôs em julgamento, tendo o seu depoimento merecido igualmente a credibilidade do tribunal. Com efeito, conquanto esta testemunha tenha referido, aos costumes, que o A é seu cliente, a quem presta habitualmente serviços de tradução/interpretação de português para mandarim e vice-versa, o seu depoimento foi espontâneo e tranquilo, apenas tendo surgido hesitações motivadas por dificuldades de compreensão de algumas questões, compreensíveis uma vez que ficou claro que a língua portuguesa não é a sua língua materna. Não obstante, tais hesitações foram esclarecidas e o discurso da testemunha, no seu todo, revelou-se coerente e verosímil.

         Referiu WJ que foi contratada pelo A para o acompanhar no processo de aquisição de um imóvel em Portugal, servindo de sua intérprete e tradutora de documentos (nomeadamente do contrato-promessa de compra e venda dos autos, que, conquanto tenha esclarecido não ter traduzido para inglês, atestou ter traduzido/interpretado para o A, de forma a que este o compreendesse).

         Num discurso fluido, esta testemunha descreveu as diligências tomadas pelo A, depois de ter escolhido a casa, no sentido de obter um financiamento de 240.000€, que referiu ser o valor que o mesmo disse precisar para comprar o imóvel dos autos, e ter ido com o A ao M/BCP (para servir de intérprete no contacto deste com os funcionários do banco) poucos dias depois da celebração do contrato-promessa de compra e venda, onde este submeteu o pedido de financiamento.

         Mais referiu que a resposta do banco demorou muito tempo, por, inicialmente (e antes do aditamento) o crédito ter sido aprovado por um valor muito inferior ao que o A necessitava, tendo sido pedida pelo A uma reavaliação, a qual demorou muito, tendo sido mesmo necessário adiar o prazo previsto no contrato-promessa de compra e venda (cujo aditamento verificou e disse ter também traduzido para o A). Esta testemunha confirmou ainda que a resposta do banco apenas chegou depois do prazo que estava no aditamento ao contrato (o que se mostra corroborado pelo documento de fl. 25v a 27).

         Perguntada acerca da reacção do A à circunstância de, na data prevista no aditamento (02/08/2018) ainda não ter resposta do Banco, a mesma referiu que o A se mostrou muito preocupado com a situação, conhecimento que circunstanciou por o mesmo não estar em Portugal na altura e ter sido ela que se incumbiu de falar com o Banco em nome dele. Mais referiu que o A lhe deu instruções para falar com o seu advogado para que este preparasse uma carta a avisar o proprietário que, chegado o prazo, não havia resposta do Banco e tinha de cancelar a compra da casa, tendo o A referido que não tinha dinheiro para comprar sem o financiamento.

         Ademais, WJ confirmou que só depois de ultrapassado o prazo contratual é que o A recebeu uma aprovação de crédito mas, ainda assim, por valor inferior aos 240.000€.

         As premissas probatórias extraídas destes três meios de prova revelam-se logicamente coerentes e não se mostram infirmadas por qualquer outra prova produzida no processo, pelo que o tribunal firmou a sua convicção no sentido da correspondência da matéria de facto indicada em 4 e 7 dos factos provados com a realidade.

         […].

         Quanto ao facto provado elencado em 10, para a prova do mesmo atendeu o tribunal ao relatório de avaliação junto como doc.1 da contestação, a fls. 48 a 53v, conjugado com os depoimentos de LA e SR, que confirmaram exercer actividade de mediação imobiliária através da M-Lda. (o que, no caso da testemunha SR, resulta ainda do texto de assinatura do seu email de 07/08/2018, junto como doc.3 da contestação – a fl. 54v) e terem pedido a referida avaliação do imóvel dos autos (com a qual ambos foram confrontados em julgamento).

         […]

         Motivação dos factos não provados

         Para prova da matéria de facto indicada sob as alíneas a a d dos factos não provados (correspondente à factualidade alegada nos artigos 8, 9, 16, 23 e 25 da contestação, depurada das afirmações de pendor conclusivo ou especulativo) o réu juntou a avaliação ao imóvel que consta de fls. 48 a 53v e a troca de emails entre SR (da M-Lda) e VG (do NB), constante de fl. 54v) e arrolou as testemunhas LA, SR e VG, as quais foram ouvidas em julgamento.

         As primeiras duas testemunhas elencadas (LA e SR), que declararam trabalhar para a agência explorada pela M-Lda (exercendo ou acompanhando a actividade de mediação imobiliária da mesma), vieram concretizar, na versão dos factos que relataram em tribunal, a forma (genericamente alegada pelo réu na contestação) como o autor teria solicitado financiamento ao NB, obtido a aprovação de tal financiamento e decidido não prosseguir com a concretização do mesmo.

         Sucede porém que os depoimentos de LA e SR não mereceram a credibilidade do tribunal.

         Desde logo, ambas as testemunhas têm um interesse objectivo no desfecho da acção, o qual foi verbalizado e plenamente assumido por LA que, aos costumes e perguntado por tal interesse, assumiu o seu interesse financeiro na medida em que, “havendo o negócio de intervenção imobiliária, nós teríamos uma comissão da qual seria também ressarcido numa parte dessa comissão”. (sic)

         É certo que tal circunstância, por si só, não importaria qualquer presunção de falta de credibilidade destas testemunhas, se o seu discurso se tivesse revelado imparcial, espontâneo e sincero. Mas não foi o caso. Na verdade, LA e SR apresentaram versões da realidade não totalmente coincidentes entre si e desconformes às regras de experiência.

         Da análise conjunta de tais depoimentos resulta mesmo que as versões dos factos que apresentaram foram construídas para um objectivo, que ambos claramente tinham: fazer passar a ideia – alegada na contestação – de que o autor obteve financiamento do NB e, como tal, não se verificou a condição contratualmente prevista para a cessação de efeitos do contrato-promessa de compra e venda celebrado, no qual a sociedade para que ambos trabalham teve intervenção como mediadora (cf. cláusula 13.ª do contrato, referido no ponto 1 dos factos provados).

         Mas vejamos em detalhe.

         Em primeiro lugar, a relação do autor com a agência imobiliária das testemunhas foi apresentada de forma diferente e contraditória por ambas. Enquanto SR assumiu que o cliente da imobiliária era o réu (que denominou “cliente-angariação”), tendo o autor chegado à agência apenas para visitar moradias e aí encontrado a que o réu já antes lhes entregara para mediação, LA, num depoimento claramente pensado e enviesado, aos costumes identificou logo o autor como “cliente da nossa empresa em termos de aquisição do imóvel”, explicando que o mesmo queria comprar um imóvel que identificou em visitas que a agência fez com ele, e que foi com base nisso que foi contactado o réu (através dos contactos exibidos na publicitação do imóvel), com quem – só após o interesse demonstrado pelo autor pelo imóvel do réu – foi celebrado um contrato de mediação imobiliária.

         Esta versão, para além de contrariada pelo depoimento de SR, resultou ainda infirmada pelas declarações de parte do réu, que, a esclarecimentos do mandatário do autor, disse que contratou a agência imobiliária para promover a venda do imóvel e que foi nessa sequência que apareceu o autor.

         Tal versão de LA (de que também o autor era cliente da agência), antecedeu a linha do depoimento destas duas testemunhas, que pretenderam fazer crer que a agência imobiliária em causa actuou como uma espécie de procuradora do autor, diligenciando pela obtenção do financiamento de que este necessitava para a concretização do contrato definitivo.

         LA começou por descrever, de forma muito assertiva, contactos da agência imobiliária com duas entidades bancárias: o BCP (que referiu que desde o início lhes pareceu impossível por financiar apenas 50% do valor da avaliação) e o NB.

         Quanto ao BCP, num momento posterior do seu depoimento, LA acabou por dizer coisa diversa, referindo que (afinal) não foi a sua agência que fez o contacto, tendo apenas noção de que o autor se deslocou na altura ao BCP, para tratar de outro assunto, onde aproveitou para expor a questão do financiamento, tendo o BCP proposto ajudá-lo, mas que a sua agência não acompanhou este processo.

         Questionado pela mandatária do réu sobre o que dissera anteriormente, relativamente à necessidade de dar ao cliente uma panóplia de soluções de financiamento, aditou então, nesse momento, que “na altura tentou-se a CGD”, contactos que disse terem sido feitos através da gestora comercial da agência.

         Quanto ao NB, LA disse que nesta instituição o autor, por ter residência temporária, teria direito a 75% do valor da avaliação, acrescentando depois que as avaliações feitas pela sociedade XY, com a qual a sua imobiliária trabalha, eram aceites de imediato pelo NB.

         Mais referiu LA que a XY fez uma avaliação que comportava uma validação de empréstimo de 250.000€ e que, nessa senda, o NB fez chegar à agência todas as simulações necessárias para o processo de financiamento, através de duas empregadas do balcão do Marquês de Pombal do NB: uma empregada de ascendência chinesa e VG (testemunha no processo).

         Disse ainda que o NB enviou um documento – a que o autor teria tido acesso – no qual declarava que tinha disponibilidade para financiar o autor em 250.000€, colocando apenas como condicionantes a necessidade de o autor corrigir uma situação relativa às suas declarações de IRS e juntar documentos de sua mulher.

         Contudo, questionado sobre se esta “aprovação” do NB ocorreu antes ou depois de realizada a avaliação da XY-Lda, depois de uma primeira resposta evasiva e enviesada, acabou por afirmar que só ocorreu depois, e, questionado sobre se o autor pediu à agência imobiliária para fazer tais contactos junto do NB, disse que não, apesar de ter acrescentado que tal pedido foi feito pela empresa que acompanhava o autor.

         Sobre a mesma matéria, SR disse que tratou (pessoalmente) de pedir os documentos necessários ao autor (através da sua tradutora) para tratarem do crédito de que este necessitava, por este lhe ter pedido (numa reunião havida na loja da agência, onde disse que esteve a tradutora/intérprete do mesmo, WJ) que tratassem do financiamento.

         Disse que tentaram vários bancos, nomeadamente o Millennium – agência de Alvalade – com gestor cujo nome não conseguiu precisar, mas que o BCP só financiaria 50% da avaliação, pelo que o processo de crédito com este banco não desenvolveu.

         Mais referiu ter pedido uma simulação de crédito ao NB, junto da agência do Marquês de Pombal, à qual disse ter chegado através de um cartão de visita que deixaram na agência, a quem perguntou qual o financiamento que davam a não residentes.

         Questionada pela mandatária do réu, sobre se o contacto com o NB não teve nada a ver com o cliente, hesitou, voltou atrás e, apelando ao tempo decorrido, disse que se recordava agora que o autor tinha conta lá e que, afinal, foi (também) por esse facto que recorreu àquela agência.

         SR disse ainda que o NB financiava 75% do valor do imóvel, mas que o processo não avançou por o cônjuge do autor não estar agregado na respectiva conta e faltarem documentos do mesmo para avançar com o processo – o que referiu ter transmitido à tradutora do autor, mas que, apesar disso, a sua agência pediu, a expensas suas, uma avaliação que qualquer Banco teria de aceitar, para avançar com o processo.

         Ora, a versão destas testemunhas não mereceu a credibilidade do tribunal, por vários motivos.

         Em primeiro lugar, tendo existido as alegadas trocas de emails por banda dos agentes imobiliários e envio de simulações aos mesmos pelo NB, para um financiamento a conceder ao autor, muito se estranha que nenhum desses emails ou simulações tenha sido junto aos autos pelo réu, tanto mais que, nas palavras da testemunha SR, fez questão de fazer todos estes contactos por emails pois, nas suas palavras “comigo é tudo por email, pois eu gosto de ter as coisas todas certinhas para mais tarde não ter problemas.”

         Também se estranha que nem na correspondência trocada entre autor e réu após a comunicação da verificação da caducidade do contrato (e dada por provada sob os pontos 5, 6, 8 e 9 dos factos provados) nem na sua contestação, tenha o réu referido, em momento algum, que o financiamento obtido pelo autor junto do NB o teria sido através da mediadora imobiliária, limitando-se a referir que sabia que o autor tinha obtido tal financiamento.

         O único elemento junto para prova da alegada aprovação do crédito ao autor pelo NB foi o email de fl. 5v, datado de 07/08/2018 (data posterior ao prazo contratual previsto no aditamento referido em 3 dos factos provados e ao envio da carta mencionada em 5 dos factos provados), no qual SR pergunta, de forma absolutamente genérica, a VG, se para clientes não residentes o valor de financiamento é de 75% do valor da avaliação, ao que esta última responde afirmativamente.

         Em segundo lugar, como admitiram as duas testemunhas da imobiliária, nenhuma proposta de financiamento poderia ter sido emitida antes de feita a avaliação que consta de fls. 48 a 53v, a qual data de 16/08/2018. Ou seja, é posterior, uma vez mais, aos momentos temporais referidos em 3 e 5 dos factos provados, o que torna inverosímil que, após essa data, e tendo o autor. declarado já ao réu que considerava caducado o contrato-promessa de compra e venda, a agência imobiliária continuasse a agir em nome do autor para que este obtivesse crédito ou lhe pedisse documentação em falta para o efeito.

         Por último, e como derradeira evidência do pendor finalisticamente orientado dos depoimentos LA e SR e da baixa verosimilhança da versão da realidade que narraram, o tribunal não pôde deixar de tomar em consideração o que foi referido pela testemunha VG, da agência do NB do Marquês de Pombal.

         De facto, em esclarecimento sincero e preocupado ao teor do seu email de fls. 63 a 63v – de que confirmou recordar-se e onde referia não ter registo de qualquer simulação para o autor, nem de qualquer processo de crédito-habitação ao mesmo, para análise comercial – VG disse que duas pessoas da M-Lda que estavam na sala de testemunhas para serem ouvidas no julgamento (sendo certo que LA e SR foram as duas últimas testemunhas a ser inquiridas, no mesmo dia) a confrontaram, naquela mesma sala de testemunhas, com um email, trocado entre a testemunha e a M-Lda, relativo a uma simulação de crédito para o imóvel, solicitada pela imobiliária (e não pelo autor).

         Contudo, no seu depoimento – que pelas razões apontadas mereceu toda a credibilidade por parte do tribunal – VG asseverou que, antes de remeter ao advogado do autor o email de fls. 63 a 63v (cujo envio confirmou), fez uma pesquisa pelo email do cliente e por simulações e verificou que não havia sido trocado qualquer email com o autor. sobre este assunto, nem existia qualquer registo de simulação em seu nome.

         Mais asseverou VG, a propósito da “situação” de que referiu ter sido recordada na sala de testemunhas por LA e SR, que, relativamente àquele imóvel, não foi iniciado qualquer processo para aprovação comercial de um empréstimo, pois esse ficaria registado.

         A tudo isto acresce que, questionada a este propósito, foi a testemunha WJ muito clara quando respondeu que não foi com o autor ao NB.

         Ora, como resultou do depoimento desta testemunha, a mesma serviu de tradutora e ponte de contacto entre o autor e os vários interlocutores do mesmo no negócio em apreço nos autos, pelo que será razoável concluir – à luz do que são as regras de experiência comum – que a mesma seria também a intermediária de um eventual pedido de crédito pelo autor ao NB. Logo, do seu depoimento extrai-se mais um indício que reforça a convicção do tribunal de que o autor – contrariamente ao alegado pelo réu – não solicitou qualquer crédito ao NB.

         Em face desta ponderação dos meios de prova, não restou ao tribunal senão dar por não provada a factualidade vertida nas alíneas a a d dos factos não provados.

                   O réu diz o seguinte contra isto:

[dada a extensão e o facto de as razões alegadas serem perceptíveis na discussão tratada na fundamentação do acórdão, omite-se]

              O autor responde assim:

[dada a extensão e o facto de as razões alegadas serem perceptíveis na discussão tratada na fundamentação do acórdão, omite-se]

                                                                 *

              Decidindo:

              O art. 640/1-a do CPC, dispõe que “quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados.”

              A jurisprudência está hoje estabilizada no sentido de que a indicação dos pontos de facto em causa tem de ser feita nas próprias conclusões do recurso. No caso, o réu copiou, no essencial, todo o corpo das alegações do recurso para as conclusões do recurso, pelo que tudo aquilo que consta daquele corpo também consta das conclusões.

              Acima, transcreveu-se – principalmente para este efeito – todo o corpo das alegações do recurso do réu – pelo que, tudo o que consta dessa transcrição que possa ser entendido como de expressa impugnação de pontos de facto, serve de cumprimento daquele ónus.

              No caso, lendo todas as alegações do recurso do réu, estão claramente impugnadas as decisões dos pontos 2 e 4 dos factos provados.

              Já não estão impugnadas as decisões relativas aos factos não provados [que são, em síntese, os seguintes: (a) O autor solicitou ao NB financiamento para aquisição do imóvel; (b) O NB aprovou o financiamento requerido pelo autor no montante de 241.500€; (c) No dia 01/08/2018, o autor já sabia que o NB lhe aprovava o crédito; (d) O autor decidiu não prosseguir com a concretização do financiamento], ao contrário do que o autor entendeu – o que é provocado pela deficiente formalização da impugnação pelo réu -, pois que, por um lado, em lado algum o réu diz que impugnou essas decisões e, por outro, porque o réu tem agora, no recurso, uma posição diferente daquela que tinha na contestação e na audiência final e os factos não provados tinham sido por ele alegados na contestação. Ou seja, no recurso o réu diz uma coisa diferente do que dizia na contestação – no recurso diz, em síntese, que a acção deve improceder porque o autor não pediu o financiamento ao BCP, e na contestação e na audiência final defendeu, no essencial, que a acção devia improceder porque o NB aprovou o financiamento pedido pelo autor e este só não foi para a frente com financiamento porque não quis (artigos 8, 9, 14, 15, 16, 18, 19, 24, 25, 26, 29, 30, 31, 33 e 34) – e por isso não pode estar agora a defender que aquilo que disse na contestação está provado, porque isso seria contraditório com o que agora defende.

              O réu também não impugnou aquilo que consta do ponto 7 dos factos provados – embora o autor pense que sim, de novo devido à forma deficiente das alegações do réu.

              E não o fez, nem podia fazer, porque o réu, na contestação, aproveitou aquele facto para fazer construções de outros (como se vê nos pontos 42, 44, 45 e 46 da contestação), por isso não o impugnando, e agora não quis dizer o contrário, para não pôr à vista que o que disse na contestação não corresponde ao que diz agora no recurso.

              Em suma, voltando atrás, só estão impugnadas as decisões dos pontos 2 e 4 dos factos provados.

                                                                 *

              Posto isto e na sequência do que antecede, note-se que é verdade, como diz o tribunal recorrido, que o réu aceitou expressamente a matéria do ponto 2 dos factos provados. O facto tinha sido alegado no artigo 5 da PI e o réu no art. 1 da contestação disse: É verdade o alegado pelo autor nos artigos 1 a 11 e 13 da PI.

              O facto em causa, no entanto, não passa de um facto instrumental: ele apenas serve de explicação para o aditamento do contrato-promessa, não sendo um dos factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor. Assim, a admissão dele pode ser afastada por prova posterior (art. 574/2 do CPC).

              Fique, no entanto, registado: o réu estará agora a sugerir que da prova produzida resulta o contrário daquilo que já admitiu.

              Posto isto,

                                                                 *

              Trata-se então de saber se os factos constantes dos seguintes pontos deviam ter sido dados como não provados:                                        

         2\ Em 02/07/2018, o financiamento bancário ainda não havia sido aprovado pela entidade bancária do autor.

         4\ Em 01/08/2018 o financiamento solicitado pelo autor ainda não havia sido aprovado.

              Isto porque, agora, o réu entende que nem sequer ficou provado que o autor tenha feito um pedido de financiamento de 240.000€ ao M/BCP.      

              A argumentação do réu passa, essencialmente, pelo afastamento da credibilidade do depoimento da testemunha WJ, e pela demonstração de que, essa credibilidade, merece-a o depoimento da testemunha LA.

              Diga-se desde já que a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença é exaustiva – quase como se tivesse sido feita depois de uma nova audição da prova produzida através da respectiva gravação -, com uma análise da prova completa e não deixa a mínima dúvida da correcção das conclusões a que chegou, principalmente quanto à falta de credibilidade do depoimento da testemunha LA. Ou seja, secunda-se essa fundamentação e o que se dirá a seguir tê-la-á como base de fundo. 

              Diz o réu que a testemunha WJ é mediadora imobiliária e que habilmente o tentou escamotear e invoca dois momentos do seu depoimento dos dois se conclui que ela é mediadora imobiliária.

              O autor transcreveu grande parte de tal depoimento. Não foi a transcrição integral ao contrário do que o autor diz e haveria outras partes que reforçariam aquelas, mas, no essencial, o transcrito já serve para dizer, por um lado, que não é claro que a testemunha WJ tenha uma agência imobiliária – sendo que se o réu dava importância ao facto o devia ter tentado esclarecer através de perguntas feitas por algum do par de advogados que o representaram na audiência final, em vez de deixar pairar no ar a dúvida sobre o facto (aliás, tinha o dever de o fazer, nos termos de um incidente de contradita, artigos 521 e 522 do CPC, para dar à testemunha a oportunidade de se defender); por outro lado, que não há prova de que a testemunha WJ tenha, no caso, actuado como agente imobiliária; basta ver que ao longo de todo o interrogatório da testemunha SR, da M-Lda, que foi quem acompanhou todo o processo da venda da casa pelo réu – ou seja, aquela que devia ser a principal testemunha do réu, apesar de o réu, no recurso, apenas ter mencionado o seu depoimento duas vezes para pontos irrelevantes -, interrogatório feito pelos dois advogados do réu a essa sua testemunha, esta disse claramente que a WJ, para si, apareceu só e apenas como tradutora. Isto não obstante a insistência, do advogado do réu, ao longo de quase três minutos, para que a testemunha concordasse com a sua construção, de que a WJ era dona de uma empresa com quem a M-Lda tinha uma parceria, como se pode comprovar do minuto 9:46 até 12:53 desse depoimento: o advogado da ré pergunta-lhe: Esta Sr.ª WJ, ela era dona dessa empresa com quem tinham um tal protocolo, era só uma tradutora…? (note-se que a testemunha não tinha falado antes em nenhuma empresa com que a M-Lda tivesse um protocolo); a testemunha responde: para mim era só uma tradutora, que eu saiba era tradutora [9:46 a 10:08 – o advogado continua a tentar desenvolver o interesse da WJ e da entidade que ela representa, quando a testemunha nunca disse que a WJ representava qualquer entidade – numa ‘pergunta’ que vai até 11:25 – a testemunha volta a dizer que era tradutora e insiste, apesar da insistência do advogado…; e o advogado faz então perguntas no sentido de que o pedido para o NB foi feito pelo autor, através da representante WJ… – até 12:53].

              O réu diz a seguir que também do depoimento da testemunha LA claramente se conclui que a testemunha WJ é, essencialmente, mediadora imobiliária. Nos pontos 9 e 10 do recurso, o réu desenvolve a afirmação com uma série de dados de facto. Não indica qual é a prova que suporta as afirmações que faz. Não é verdade, por outro lado, que a testemunha LA (20m39s) tenha referido a “GA – Unipessoal Lda”. É que a testemunha vai muito mais longe: a sociedade teria o nome de “GA – [imperceptível] de mediação imobiliária” [20:29 a 20:49]. A mudança de nome é significativa: demonstra o afã da testemunha em provar que a WJ tinha uma agência de mediação imobiliária; e demonstra que o réu, depois de pesquisa, não conseguiu encontrar a sociedade invocada pela testemunha, mas uma outra, que nada diz ser uma sociedade de mediação imobiliária. O réu também refere a morada da sociedade e fala em coincidências, mas não concretiza as moradas em causa. Tal como refere, sem concretização, o CAE/objecto principal da referida GA-Lda sem fazer prova. E critica o tribunal por não se ter preocupado em compreender cabalmente qual o verdadeiro papel e a verdadeira intervenção da testemunha WJ neste negócio, sem referir nada do depoimento da sua própria testemunha SR que não confirmou essa suposta intervenção nessa qualidade.

              Quanto às incoerências que o réu tenta descobrir no depoimento da testemunha WJ, nos pontos 11 a 21, duplicando-as numa infinidade de pontos, explicam-se facilmente: a testemunha não traduziu o contrato-promessa, no sentido de o pôr por escrito, em inglês e português; apenas o fez no sentido de fazer compreender o que lá estava ao autor. Para além disso, a argumentação do réu não tem a sequência lógica necessária: porque é que o facto de a testemunha WJ por ter estado a traduzir o contrato (12-13) tinha também de estar a acompanhar o autor na assinatura no contrato-promessa (14)? Para mais quando a testemunha revelou estar confusa com as perguntas sobre os encontros que estavam em causa que lhe eram feitas sem qualquer precisão e sem sequência lógica: contactos na loja é uma coisa; encontro para pagamento de uma reserva ou de um sinal, podem ser a mesma coisa ou coisas diferentes; encontros no escritório são outra; etc.;

              Quanto à escolha da agência de Alvalade do BCP, sobre a qual o réu, nos pontos 26 a 49, tenta pôr em causa o que foi dito pela testemunha WJ – que calhou, estava perto -, lembre-se, antes de mais, que o réu se esquece de dizer que a sua testemunha SR disse que foi ela, SR, a escolher o BCP, ao calhas, por uma questão de proximidade. Ou seja, é uma testemunha do réu, aquela que devia ser a principal, por ter sido a pessoa que, por contrato com o réu, acompanhou todo o processo, que disse que o BCP, agência de Alvalade, foi contactado por iniciativa sua, aleatória, para a questão do financiamento. Perante isto, a que propósito é que se pode tentar sugerir que a testemunha WJ está a mentir quando diz que o autor pediu o financiamento na agência do BCP em Alvalade? Poderá haver alguma dúvida de que foi feito tal pedido neste banco? A repetida insistência nesta argumentação é indício suficiente da falta de argumentos sérios para pôr em causa a credibilidade da testemunha WJ.

              Para mais, esquecendo-se que a procuração passada pelo autor aos seus advogados (junta nestes autos), dava-lhes poderes para o representarem em pedidos de financiamento no BCP, sendo que a testemunha TR (do BCP) e a testemunha SR (da M-Lda => réu), sabem que o autor lá tinha uma conta. Qual a diferença, então, entre o BCP e o NB (onde o autor também tinha conta) para que seja tão estranho que o autor tenha feito o pedido de financiamento no BCP e não no NB? Para mais quando a testemunha do réu, SR, até diz que foi ela, SR, a escolher o BCP? Nada do que o réu diz, tendo em conta o que antecede, é minimamente suficiente para que ele tire a conclusão, em 36, de que o “NB é, pois, uma instituição bancária com a qual o autor tem uma relação próxima no que respeita à sua actividade bancária em Portugal”, como se o autor apenas devesse ter feito o pedido de financiamento no NB e tudo o resto, ou seja, um pedido de financiamento ao BCP, fosse estranho.

                                                                 *

              Quanto ao testemunho de LA, contra o que o réu diz, este TRL acompanha, pelo contrário, a par e passo, a demonstração feita pelo tribunal recorrido de que esta testemunha não é minimamente credível, e só por isso é que não repete os argumentos daquele tribunal, mas remete para eles.

              Acrescente-se o seguinte, de imediato: a avaliação pedida pela M-Lda, que o réu, na contestação, disse ter sido pedida pelo autor (quando se sabe que não foi, mas sim pela testemunha SR como ela próprio o disse), não tem a mínima credibilidade, pois que tem a data de 16/07/2018, quando, no seu texto, se diz que a visita ao prédio foi feita a 14/08/2018 e que a avaliação tem a data de 16/08/2018 (o que é repetido várias vezes) e que antes não tinha sido avaliada a propriedade pelo avaliador, embora também se refira, outras vezes, a data de 18/07/2018. Esta variação de datas permite presumir que elas puderam ser manipuladas, mas saliente-se que a data da visita não varia e é de 14/08/2018, tal como não varia a data da solicitação, que é de 09/08/2018, pelo que a avaliação não podia ser de data anterior, nem podia estar pronta antes, ao contrário do que o réu dizia na contestação e a testemunha LA disse na audiência final [veja-se o que é dito, por exemplo, nos artigos 25 e 26 da contestação: (25) Aquando do envio da carta ao réu, doc.3 da PI, o qual ocorreu no dia 01/08/2018, o autor já sabia que o NB lhe aprovava o crédito para aquisição do imóvel que prometeu comprar ao réu. (26) Com efeito, o relatório de avaliação tem a data de 18/07/2018; ou seja, toda a construção do réu, feita na contestação, se baseava em não verdades, entre elas, as de que a avaliação tinha sido feita a 18/07/2018, quando ela só foi pedida, e pela M-Lda, não pelo autor, a 09/08/2018].

              Ora, a testemunha LA, que não podia deixar de saber – foi a M-Lda que pediu e pagou a avaliação – que a avaliação tinha a data de 16/08/2018, posterior, por isso, a 01/08/2018, e que por isso não podia servir para provar que a aprovação do empréstimo tinha ocorrido antes de 01/08/2018, começa por dizer que a aprovação é anterior à avaliação, o que explica com convicção [20:58 a 21:20] e, depois daquilo que está a dizer ser posto em causa pelas perguntas que lhe foram feitas pela juíza, logo a seguir diz o contrário e com igual convicção e como se fosse o mesmo que tinha acabado de dizer [até 22:10]. É difícil de encontrar um comportamento igual ao desta testemunha. E note-se que este TRL não está a repetir todos os outros argumentos que já foram desenvolvidos pelo tribunal recorrido.

              Quanto ao interesse desta testemunha, tudo o que réu diz é artificial e não tem em conta a realidade das coisas: foi a própria testemunha que disse que tinha interesse e a forma como depôs demonstra esse interesse [chegando até a contactar, em tribunal, com outra testemunha para discutir a matéria em causa antes do depoimento, como se dá conta na sentença recorrida]: depois do autor ter escrito a carta a anunciar a caducidade, a M-Lda entrou em acção, de modo a fazer tudo para evitar as consequências da caducidade, inclusive pedindo e pagando, à sua custa, a avaliação da XY-Lda. E a testemunha disse aquilo que foi sintetizado pela Srª juíza: “havendo o negócio de intervenção imobiliária, nós teríamos uma comissão da qual seria também ressarcido numa parte dessa comissão” o que, neste contexto, independentemente das construções que possam ser feitos, é um indício, pelo menos, de que, de alguma forma, a M-Lda ainda está à espera de ser ressarcida deste valor e o que disse nesta acção serve esse fim.

              Afastado, pois, tudo o que o réu diz de 50 a 63, diga-se, quanto à primeira conclusão que ele tira, em 64, tendo em conta aquilo que já foi dito para trás, que está manifestamente errado: não há a mínima prova de que a M-Lda tenha sido abordada pela “empresa” da testemunha WJ para adquirir o imóvel do réu. Aliás, como foi dito pela sentença recorrida – e o próprio réu, nas suas declarações de parte, e a testemunha do réu SR, confirmam -, não há dúvida de que o réu já era cliente da M-Lda antes da M-Lda ser contactada pelo autor como interessado na compra do imóvel. Isto demonstra, também, a artificialidade da construção do réu, que ainda agora, depois de toda a prova produzida, continua a dizer o contrário, socorrendo-se do depoimento da testemunha LA, deixando no tinteiro aquilo que ele próprio e a sua testemunha SR disseram.

              Quanto à segunda conclusão, tirada em 65 pelo réu, ela está parcialmente certa, isto é, que a M-Lda teve uma intervenção muito activa neste processo, como aliás acabou de ser referido. Mas isto em nada ajuda o réu. Já do resto não há prova suficiente, isto é, de que essa intervenção tenha sido desde o início, se esse início se referir ao contacto com o BCP. Mas, se isto fosse desde o início, tal não seria favorável ao réu.

              Quanto à abordagem pela “empresa” da testemunha WJ, nada mais há a dizer, visto que já foi demonstrado que não há qualquer prova disso. Mas não se deixe de sublinhar a estranheza que provoca a forma como a testemunha LA se refere à questão, nos termos referidos pelo réu de 71 a 73: então a testemunha LA tenta demonstrar esse contacto por uma parceira comercial e nem sequer a identifica de imediato e antes fala dela como uma “pessoa que o [ao autor] acompanhava“, “era uma pessoa chinesa que fala perfeitamente português.” Alguém se refere nesta forma impessoal a uma pessoa que é titular de uma empresa parceira?

              Remetendo de novo para o que já foi dito pelo tribunal recorrido e afastada que está toda a credibilidade do que foi dito pela testemunha LA e pelo relatório de avaliação da XY-Lda, não se perde mais tempo com esta argumentação excepto para acrescentar o seguinte:

              De 92 a 97, o réu diz que nunca, em momento algum dos seus depoimentos, as testemunhas LA e SR disseram ou quiseram passar a ideia que o autor obteve financiamento no NB ou que o financiamento foi aprovado pelo NB.

              Ora, primeiro, tal não é verdade: a testemunha LA tentou – em passagens já assinaladas – convencer que a aprovação até tinha ocorrido antes da avaliação do prédio; depois, não se pode esquecer que, na contestação, era esta a construção do réu, e que a testemunha LA a estava a tentar confirmar, enquanto não foi posto em causa pelas perguntas da Sr.ª juíza: (16) Tendo sido a avaliação do imóvel no valor de 322.000€ e sabendo-se que o NB financia cidadãos não residentes em montante igual a 75% do valor da avaliação, conclui-se que o NB aprovou o financiamento requerido pelo autor no montante de 241.500€. […] (24) É pois falso que o autor não tenha conseguido o financiamento, que o próprio reputava necessário e suficiente. (25) Aquando do envio da carta ao réu, doc.3 da PI, o qual ocorreu no dia 01/08/2018, o autor já sabia que o NB lhe aprovava o crédito para aquisição do imóvel que prometeu comprar ao réu. (26) Com efeito, o relatório de avaliação tem a data de 18/07/2018. (29) Em suma, e totalmente ao contrário do que alega, o autor obteve a aprovação do crédito que necessitava para a aquisição do imóvel que prometeu comprar ao réu. E, mais importante que isto, é que o réu, pela voz do seu mandatário e pelas perguntas que fez às testemunhas LA e SR, já referidas, ainda em audiência final, tentava convencer que o pedido de financiamento ao NB tinha sido feito pelo autor ou a pedido deste representado pela “empresa” da testemunha WJ.

              Em suma, justifica-se que o tribunal tivesse dado credibilidade ao depoimento da testemunha WJ e nenhuma ao depoimento da testemunha LA.

                                                                 *

              Em seguida, para afastar os factos provados sob 2 e 4, o réu tenta provar que não houve pedido de financiamento feito pelo autor ao BCP.

              Para tal invoca, para além do que já atrás foi analisado e afastado, a forma como a aprovação de um pedido de financiamento devia ser processado – tendo em conta o que a testemunha TR diz – e o facto de o doc.7 junto pelo autor não demonstrar esses passos todos ou todos os elementos pressupostos.

              Ora, antes de mais, há que notar, como já se referiu acima, que o réu, na contestação, não pôs em causa a existência do pedido de financiamento junto do BCP e que ele conduziu ao resultado que consta do ponto 7 dos factos provados. Não o pôs em causa então, na contestação, e fez mesmo construções de outros factos com base nele na contestação; e também não o pôs agora, no recurso, como também já referido e já se pôde constatar acima, com a leitura do mesmo.

              Assim, é natural que o autor não se tenha preocupado em trazer aos autos os elementos de prova que a seguir o réu vem dizer que deviam estar juntos e não estão.

              Por outro lado, o depoimento da testemunha TR tem as características apontadas na fundamentação da decisão impugnada e não as que o réu lhes dá agora. A testemunha, notoriamente, não tentou esconder nada, não tinha ideia ao que vinha, não tinha nada contra o réu, e limitou-se a fazer a leitura do documento em causa e a fazer a interpretação dele segundo a sua experiência de lidar com tais coisas. E os dois mandatários do réu, na instância, não levantaram todas as questões que agora estão a levantar, aceitando, no essencial, as respostas que a testemunha deu, sem lhe permitir responder às objecções que agora levantam e às conclusões que agora tiram.

              Posto isto e passando a analisar os pontos 107 a 147 do recurso.

              i/ A testemunha TR tinha que ter conseguido dizer qual o valor de financiamento pedido pelo autor ao BCP? É evidente que não, já que aquilo sobre que ela estava a depor era sobre um email a dar conta da aprovação do montante aprovado e sobre uma proposta de crédito a assinar pelo autor.

              ii/ é certo que a testemunha concordou com o que lhe foi dito pelo advogado do autor – Já disse aí que o que o cliente pretendia eram 480.000€ -, mas a testemunha já tinha dito que tal era o valor de aquisição constante da “proposta de pedido de financiamento.” Limitou-se a perceber mal, desta vez, o alcance da pergunta do advogado, confusão que, face à anterior pergunta, se percebe. Aliás, sabe-se que é isto que muitas vezes ocorre. Não há o mais pequeno indício de que esteja aqui uma tentativa de iludir e criar no tribunal uma convicção completamente contrária à realidade, por parte da testemunha, em relação à qual não há o mínimo de indícios, antes pelo contrário, de que tivesse, do caso, os conhecimentos necessários para poder saber quais os valores e factos que podiam prejudicar/beneficiar o autor/o réu. Para o réu lançar este labéu contra a testemunha devia alegar algo mais e não repetir a imputação várias outras vezes, sem qualquer indicação de ter o mínimo de fundamento para isso.

              Segundo o réu a testemunha disse que, quando um cliente aborda o banco, é feita uma simulação e encaminhada para a tal “proposta de pedido de financiamento” (7m15s) e que é solicitado ao cliente (i) o valor da aquisição e (ii) o valor que o cliente pretende de financiamento. Assim, estas duas informações seriam essenciais para que o passo seguinte possa ser dado, numa outra área do banco, tendo de haver uma avaliação do imóvel, por uma entidade solicitada pelo banco. Ora, no caso não existe nenhum documento nos autos qual o valor de financiamento solicitado pelo cliente, como é que o departamento do banco responsável pela análise da capacidade financeira do cliente conseguiu fazer a mesma.

              Ora, é evidente o vício do raciocínio do réu. O facto de não estar junto aos autos tal documento, não quer dizer que não exista no banco. E face ao facto de o réu não ter posto em causa, na contestação, antes aceitou expressamente, que tinha sido feito um pedido e aprovado, o autor não tinha de fazer prova da existência de tal documento.

              A seguir, o réu diz que também não existe nos autos o pedido de avaliação do imóvel.

              Ora, vale para aqui o que já se disse quanto ao outro documento. O facto de ele não estar junto aos autos não quer dizer que não exista no banco. E, já agora, a comparação com a avalização feita pelo XY-Lda para o pedido de financiamento feito ao NB é infeliz, porque a testemunha LA até tentou provar que o NB tinha feito a aprovação antes ainda da avaliação.

              Em suma, nenhum dos argumentos do réu tem a mínima razão de ser, relativamente à existência de um pedido de financiamento feito pelo autor ao BCP, que o próprio réu aceitou na contestação ter sido feito, tal como o aceitou nas declarações de parte, e foi confirmado pela testemunha do réu, SR, que acompanhou o processo.

                                                                 *

              Os restantes pontos do corpo das alegações do réu, são, para além de alegações de direito, apenas repetição de argumentos já invocados, não havendo, pois, mais matéria a considerar a título da impugnação da decisão da matéria de facto.

              Improcedem, assim, todas as razões do réu para se concluir que os pontos 2 e 4 dos factos provados foram mal decididos, não havendo dúvidas, face à prova produzida, e pelas razões indicadas na fundamentação respectiva, de que tais factos foram correctamente julgados.

                                                                 *

                                 Do recurso sobre matéria de direito

              A fundamentação da sentença, com invocação de doutrina, foi, em súmula, a seguinte:

         O contrato celebrado entre as partes foi um contrato-promessa (art. 410 do CC), onde as partes estipularam, ao abrigo da liberdade contratual (art. 406 do CC), a caducidade do mesmo (arts. 298/2 e 328 e segs do CC), ou seja, a sua extinção automática, caso não fosse feito o financiamento, até uma certa data (02/08/2018) ou por um certo valor (240.000€), que o autor ia solicitar (uma condição resolutiva: art. 270 do CC, e não suspensiva, ao contrário do que era dito pelo autor na PI).

         Ora, atento o teor da cláusula de caducidade acordada entre as partes (numa clara intenção de não assunção de risco contratual pelo autor, no caso de não obtenção de financiamento) e o que ficou demonstrado ter sucedido (factos provados sob 4, 5 e 7), não resta senão concluir que, em 02/08/2018, o contrato-promessa celebrado entre autor e réu caducou, extinguindo-se, portanto, desde essa data, o vínculo contratual e, com ele, o feixe de direitos e obrigações que do mesmo decorriam para ambas as partes, nomeadamente a obrigação de o autor pagar o reforço de sinal, de proceder à ulterior marcação de escritura e de outorgar a escritura de compra e venda.

         É certo que o réu invocou – numa interpretação jurídica da cláusula contratual em análise como condição suspensiva do pagamento de reforço do sinal e da celebração do contrato definitivo (interpretação que, de resto, parece decorrer também da petição inicial, mas que não se sufraga) – que a condição contratual se verificou, na medida em que o autor teria conseguido o financiamento bancário junto do NB.

         Contudo, como decorre do elenco dos factos não provados e respectiva motivação, o réu não logrou provar esta factualidade, que, nos termos do disposto no artigo 342/2 do CC, enquanto facto extintivo do direito do autor, era seu ónus provar, pelo que não se apuraram circunstâncias de facto susceptíveis de obstar ao reconhecimento do direito invocado pelo autor, expressamente previsto no contrato, em caso de cessação do mesmo por caducidade, motivada pela verificação da condição resolutiva: ao reembolso do valor de sinal de 20.000€ pago pelo autor.

              As razões do réu, quanto a esta parte, constam dos pontos 148 a 201, já transcritos acima.

              As razões do autor também já foram transcritas acima.

              Posto isto,

              Como a sentença diz, na cláusula 6/1 do contrato-promessa, na redacção que lhe foi dada pelo aditamento, prevê-se uma condição resolutiva e não uma condição suspensiva. Os efeitos do contrato-promessa são a constituição da obrigação de celebrar o contrato-prometido. Se se prevê que o contrato caducará, isto é, deixará de produzir automaticamente efeitos, se se verificar um evento futuro e incerto (a não concessão do financiamento até uma certa data, ou um financiamento inferior a 240.000€), então o que existe é a previsão do efeito de uma condição resolutiva, não suspensiva. Aliás, a caducidade só tem sentido ligada a uma condição resolutiva, pois que é o modo de operar a cessação dos efeitos. Isto é, a caducidade é uma das causas da ineficácia superveniente. Ela ocorre, no caso, pela verificação da condição resolutiva (Galvão Telles, Manual, Coimbra Editora, 4.ª edição, 2002, págs. 262-263, 379-381 e 382; Heinrich Ewald Hörster / Eva Sónia Moreira da Silva, A parte geral do CC português, 2.ª edição, Almedina, 2019, páginas 546-550; Pedro e Pedro Leitão Pais de Vasconcelos, Teoria Geral de Direito civil, 9.ª edição, 2019, Almedina, páginas 603 a 614 e 763-764; Ana Afonso, no Comentário ao CC, parte geral, UCP/FD/UCE, 2014, páginas 660-663 e 673-677). A caducidade não pode estar, por isso, ligada a uma condição suspensiva (em sentido diferente, no entanto, veja-se o acórdão do STJ invocado pelo autor na PI).

              O direito do autor é, por outro lado, uma consequência da caducidade do contrato decorrente da verificação da condição resolutiva, não uma consequência directa da condição resolutiva: a condição resolutiva leva à caducidade do contrato e esta provoca o efeito do nascimento do direito do autor à restituição do sinal em dobro, pelo que ela funciona como um dos factos constitutivos deste direito do autor, a ser provado por ele (art. 342/1 do CC; não se aplica o art. 343/3, 2.ª parte, do CC, porque a condição resolutiva condiciona o contrato, não directamente o direito à restituição – neste sentido, com desenvolvimento, o ac. do TRL de 11/07/2013, proc. 22310/11.1T2SNT.L1, subscrito pelo relator deste).

              Ora, como diz a sentença, os factos provados permitem a conclusão da verificação da condição resolutiva. Condição resolutiva que ficou logo preenchida com a 1.ª alternativa em que ela se consubstanciava, ou seja, da não concessão do financiamento até ao dia 02/08/2018 (ponto 4 – se ele não foi aprovado, muito menos pode ter sido concedido) e que teve o efeito de extinguir o contrato logo nessa data, pois a caducidade não depende da vontade de resolver o contrato, nem da manifestação dessa vontade, nem depende de uma comunicação de resolução (autores e obras citados acima).

              O teor da carta de 01/08/2028, do autor para o réu (ponto 5), não podia ter o significado de afastar essa caducidade, por estranha que ele seja (invoca-se a caducidade mas ao mesmo tempo diz-se que se vai esperar pela decisão do banco – isto teve reflexos na audiência final, com a advogada do réu a contrapor a este, durante as declarações de parte do réu, que o autor não tinha desistido do negócio, que ainda estava à espera do empréstimo [: 12:03 a 12:39], depois de o réu ter dito precisamente o contrário: com a carta de 01/08/2018 entendeu que o autor desistiu do negócio [: 11:35]), porque a vontade de uma parte não pode evitar a extinção do contrato provocada automaticamente pela caducidade.

              E a segunda alternativa da condição resolutiva também se verificou, pois que se o M/BCP aprovou um montante máximo de financiamento de 188.450€ (facto 7) tal necessariamente implica que fica afastada a possibilidade da aprovação de um financiamento de 240.000€.

              O réu, na contestação, como diz a sentença recorrida, tenta afastar isto invocando o preenchimento da condição [vista como condição suspensiva do reforço do sinal], pois que o financiamento teria sido aprovado por um outro banco, o NB, antes da data da caducidade. No entanto, esta alegação, não tinha credibilidade, porque era feita com base num documento de avaliação datada de 16/08/2018 (facto provado sob 10) e que só podia ter sido elaborado depois de 09/08/2018, ou seja, depois da data da caducidade. E não ficou provada, como a sentença o esclareceu.

              Acabou de se falar na condição suspensiva quando acima se esclareceu que a cláusula 6.ª estabelecia uma condição resolutiva, pelo que há que explicar que, assim como a condição resolutiva do contrato pode ser vista, para o direito do autor, como uma condição suspensiva (o direito do autor à restituição do sinal pago nasce depois e em consequência de a condição resolutiva do contrato se ter verificado, com a extinção deste: o que é um outro modo de explicar que não se pode aplicar a este direito o disposto no art. 343/3, 2.ª parte, do CPC), assim o direito do réu ao reforço do sinal pode ser visto como estando dependente de uma condição suspensiva, que é o reverso daquela, ou seja, dependente da não verificação da condição resolutiva.

              E, assim sendo, quando o réu dizia, na contestação, que se verificou a condição suspensiva do seu direito ao reforço do sinal (e, desenvolvendo, também o direito à celebração do contrato e por fim o direito a ficar com o sinal pago), pois que o financiamento tinha sido aprovado antes de 01/08/2018, estava também a dizer que não se verificou a condição resolutiva do contrato.

              Ora, o réu, em vez de, coerentemente com a posição tomada na contestação, tentar convencer que a sentença estava errada e que, ao contrário do que ela conclui, a condição resolutiva não se preencheu porque o financiamento tinha sido aprovado, recorre como se não tivesse sido isto que defendeu na contestação e agora tenta demonstrar que a condição resolutiva não se preencheu, não com o fundamento anterior, mas com um fundamento diferente, qual seja, o de que o financiamento nem sequer tinha sido pedido.

              Ora isto é uma outra forma de alegar que o preenchimento da condição resolutiva se deu porque o autor o provocou, actuando contra as regras da boa fé.

              Pelo que se tem de admitir a legitimidade desta mudança de fundamentos, tanto mais que, por um lado, se pode entender que se continua no âmbito da excepção da verificação da condição resolutiva provocada por um comportamento de má fé do autor, e, por outro, esta excepção se baseia, ao fim e ao cabo, numa actuação materialmente de abuso de direito (2.ª metade do art. 275/2 do CC – neste sentido, Ana Afonso, obra citada, pág. 675) e este é sempre de conhecimento oficioso, mesmo na fase de recurso, desde que os factos estejam provados.

              Mas, sendo legítima a mudança de posições, não deixa de ser verdade que elas têm por base factos diferentes: o preenchimento da condição suspensiva [do reforço do sinal], logo da não verificação da condição resolutiva, invocado na contestação, baseou-se no facto de que o financiamento tinha sido aprovado; e agora, no recurso, a não verificação da condição resolutiva baseia-se no facto de o financiamento nem sequer ter sido pedido.

              Ora, para além desta mudança de posições ser o reconhecimento, pelo réu, de que a primeira versão não tinha pernas para andar, por outro lado, aquela primeira versão constava da contestação e por isso podia ser objecto de prova, e esta segunda versão não constava e não podia ser nem foi objecto de prova e só através de uma discussão artificial sobre os pontos 2 e 4 dos factos provados é que o réu a pôde tentar fazer. Mas também sem êxito, pelo que toda esta argumentação do réu cai pela base.

              Não se deixe de dizer que o que o réu alegou na contestação ainda pode ser analisado por outra via: a de que o autor provocou a verificação da condição resolutiva, porque, contra as regras da boa fé, fez um pedido de empréstimo inferior a 240.000€, tal como resultaria, segundo o réu, da alegação feita pelo autor que está na base do ponto 7 (daí que o réu não tenha impugnado essa alegação na contestação e no recurso não tenha impugnando a decisão de dar como provado o que consta de 7).

              Só que o que consta do ponto 7 dos factos provados – que o réu não impugnou no recurso – não diz o que o réu pretende. O que diz é que o M/BCP aprovou um montante máximo de financiamento de 188.450€. Ora, tal não é o mesmo que dizer que o autor só fez um pedido nesse montante.

              E daqui se vê que, se esta última argumentação do réu pode ser analisada deste ângulo, isso não quer dizer que o réu tenha alegado os factos necessários para a sua procedência, tendo-se limitado a fazer uma construção com base nos factos alegados pelo autor.

              Em suma, a variedade de posições que o réu foi tomando, demonstram, por um lado, a fragilidade de todas elas, e, por outro, nenhuma delas se provou (sendo que duas delas nem sequer tinham por base factos alegados pelo réu).

              O que é um outro modo de dizer que improcede a quarta parte do corpo das alegações do recurso do réu, argumentação essa na sua maior parte baseada na repetição de um conjunto de factos de que não há a mínima prova e que o réu invoca sem se ter sequer preocupado em introduzi-los de modo válido na matéria de facto provada (o que é um modo de confessar que não tem elementos de facto para o fazer), para além de serem irrelevantes e/ou contraditórios com outros (é o caso do que diz em 155 – o principal banco com que o autor trabalha em Portugal é o NB –, 157, 159, 160 – o NB foi eleito pelo autor para as questões financeiras ligadas com o negócio prometido –, 162 – o autor recorreu ao BCP “ao calhas” para solicitar um financiamento -, 163 – o NB foi o banco eleito pelo autor para gerir os temas financeiros ligados a este negócio -, 164 – o autor não colaborou com a empresa M- Lda, fornecendo-lhe a documentação que estava em falta –, 174 – o autor deixou de ter interesse em adquirir o imóvel do réu -, 175 – para recuperar o sinal que tinha pago, o autor criou a aparência de que solicitou um financiamento ao BCP para a aquisição de tal imóvel -, 177 – não existe um documento que prove o pedido de financiamento [ao BCP, pelo autor] e os termos do mesmo –, 181 – o autor nunca solicitou qualquer financiamento ao BCP -, 187, 188 – sabendo que nunca solicitou qualquer financiamento ao BCP e que não colaborou com a empresa M-Lda –, e 190 – o autor nada fez para obter financiamento bancário).

              Por fim e para ter em conta tudo o que era dito na contestação, do contrato-promessa não decorre qualquer obrigação de o autor ter de andar a solicitar financiamentos a todos e quaisquer bancos até conseguir um que aceitasse o financiamento, nem resulta dos factos provados que o autor soubesse alguma coisa sobre a tentativa de financiamento junto do NB, para além de que os factos referentes a este financiamento (pontos 10 e 11) são posteriores à data da caducidade do contrato. 

                                                                 *

              Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente.

              Custas, na vertente de custas de parte (não existem outras), pelo réu (por ser quem perde o recurso).

              Lisboa, 25/03/2021

              Pedro Martins

              1.º Adjunto

              2.º Adjunto