Execução do Juízo de Execução de Oeiras

              Sumário:

             I – Não se pode censurar, por negligência, um exequente, por não requerer que fossem praticados, na execução, actos que levariam à extinção da mesma e ao levantamento das penhoras efectuadas; sendo assim, tal não pode levar à deserção da execução (art. 281/5 do CPC).

              II – Os executados têm meios próprios para requerer o levantamento da penhora em execuções que estejam paradas por inércia do agente de execução (art. 763/1 do CPC); tal como têm meios próprios para levar à prática dos actos que podem levar à extinção da execução, quando o agente de execução não faz o que devia fazer (art. 750 do CPC).

              III – No caso dos autos, o executado não actuou estes meios, pelo que o despacho, que não deferiu o levantamento da penhora, nem julgou extinta a execução, não está errado.

              Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados:

1. A 20/11/2008, a CdP [sic] requereu uma execução contra A / C, para pagamento de 11.408,83€ + 1479,15€ de juros desde 31/07/2007 a 20/11/2008, com base num requerimento de injunção de 31/07/2007 a que tinha sido dada força executiva a 11/12/2007 (capital de 10.649,27€ + 513,69€ de juros à taxa de 9,9% desde 01/09/2006) [a exequente tem o NIF 500111111; a procuração é feita por CdP, com o referido nif]. Designou agente de execução; não indicou bens à penhora.

2. A 24/11/2008, a AE aceita a nomeação.

3. A 05/12/2008, o tribunal notificou a AE de que não havia lugar à citação prévia e para proceder à penhora de bens.

4. Entre 12 e 16/06/2008, a AE fez diligências de averiguação de bens e um pedido de autorização para penhora de depósitos bancários.

5. A 30/06/2009, o tribunal notificou a exequente para juntar aos autos o original do título executivo [o tribunal não dá, subsequentemente, qualquer desenvolvimento a isto].

6. A 08/07/2009, a AE registou no processo electrónico que a 03/07/2009 tinha elaborado um auto de penhora do salário do executado, constando como quantia exequenda 12.887,98€ + 1288,80€ de despesas prováveis, num total de 14.176,78€ e diz que junta cópia da comunicação da entidade patronal e recibo de vencimento. O valor penhorado foi de 283,87€

7. A 22/07/2009 a AE informou que citou o executado e que junta a/r.

8. A 29/07/2009, o executado deduz oposição (entre o mais diz que antes mesmo da execução já tinham sido pagos 3.000€ da dívida – pela educação dos filhos, que seria da responsabilidade da executada, sua ex-mulher).

9. A 21/08/2009 apensa-se a oposição aos autos (apenso A).

10. A 20/07/2010 a AE é notificada da suspensão da execução por força da oposição.

11. Em 24/08/2010 a AE faz pesquisa de bens da executada.

12. A 04/01/2011 é dada notícia de recurso interposto na oposição à execução, como apenso B [nunca mais se soube deste recurso, embora, como se irá vendo, se possam tirar ilações sobre o mesmo pelas referências esparsas, nos despachos subsequentes, ao apenso A; note-se que está publicado um acórdão do TRL de 14/06/2011, na base de dados da DGSI, relativamente a este recurso, acórdão que confirma a decisão recorrida que, segundo resulta da passagem que se segue, seria uma decisão interlocutória; com efeito, o TLR escreveu, entre o mais: Para o conhecimento das questões postas, relevam as seguintes ocorrências processuais: […] foi proferida a decisão sob recurso que considerou: (…) conclui o tribunal que, ressalvando o alegado quanto à falta ou nulidade de citação no procedimento injuntivo, cuja verificação passará necessariamente, pela prova que se vier a fazer em sede de audiência de discussão e julgamento, os demais fundamentos invocados pelo oponente são legalmente inadmissíveis e por conseguinte não poderão ser atendidos, conduzindo, nessa parte, à improcedência da presente oposição… no concerne aos fundamentos invocados nos artigos 2 a 39 e 56 a 87].

13. A 27/06/2011 o executado, em requerimento ao juiz, diz, entre o mais, que: foi notificado pelas Finanças da penhora de 667,31€ no âmbito dos presentes autos; por despacho de 04/10/2010 [? – TRL] a execução foi suspensa e ordenada a notificação à AE; a suspensão não foi levantada pelo que a penhora agora realizada viola esse despacho e prejudica o executado; nestes termos: requer o levantamento da penhora.

14. A 08/07/2012 e 16/09/2012, em actualização estatística, a AE diz que a execução está suspensa.

15. A 18/09/2012 – um ano depois do requerimento – o tribunal notifica a AE para se pronunciar sobre a penhora referida pelo executado.

16. A 09/10/2012, a AE diz que foi lapso – quis penhorar créditos fiscais da executada; sugere a devolução da quantia penhorada [o tribunal não dá qualquer desenvolvimento subsequente a isto].

17. A 30/10/2012, o tribunal notifica as partes

    para, em 10 dias, esclarecerem se conseguiram obter o acordo que se propuseram obter nos autos de oposição apensos aos presentes autos e, caso o tenham feito, em que termos.

18. Não houve resposta.

19. A 23/01/2013, o tribunal dá o seguinte despacho:

         Aguarde o impulso processual, sem prejuízo do disposto no artigo 285 do CPC. Notifique.

20. A 09/03/2013, a AE dá actualização estatística – execução suspensa – e pesquisa bens.

21. A 13/09/2013, o executado requer ao juiz o levantamento da penhora pelo facto de a execução estar parada há mais de 6 meses por culpa da exequente.

22. A 24/09/2013, a exequente vem opor-se ao levantamento da penhora e dizer que a execução deve prosseguir, não tendo sido obtido acordo com os “réus”, não havendo motivos para que a instância se mantenha suspensa.

24. A 24/09/2013, a AE faz pesquisa de bens dos executados.

25. A 10/10/2013, é proferido o seguinte despacho:

         Fl. 44:

         Indefiro ao requerido, por a instância se mostrar suspensa por acordo das partes, como resulta da acta de fl. 86 do apenso A, logo o impulso pendia sobre ambas as partes.

                                          *

         Fl. 47:

         Ordeno o levantamento da suspensão da instância.

         Prossigam os autos (processo principal e apenso A) os seus termos normais.

26. A 31/10/2013, o advogado do executado vem renunciar ao mandato [renúncia que notifica aos mandatários da exequente – mas que nunca foi notificada ao executado].

27. A 07/11/2013, a AE actualiza informação estatística do processo, dizendo que estão diligências de penhora em curso.

28. A 13/11/2013, a AE faz várias diligências de averiguações de bens dos executados.

29. A 27/12/2013, a secção notifica a AE da renúncia do mandato.

30. A 31/12/2013, a AE actualiza informação estatística do processo: suspensão da instância.

31. A 31/12/2013, a AE faz pedido de penhora electrónica de depósitos bancários dos executados, tal como a 06/02/20214 e a 11/02/2014.

32. A 16/07/2014, a AE junta uma notificação elaborada a 15/07/2014 a notificar o executado para deduzir oposição à penhora de bens e junta um auto de penhora de conta bancária do executado no valor de 1.064,58€, no BPI, SA, elaborado a 14/02/2014, com as já referidas quantias exequendas e despesas prováveis [a 01/02/2015 consta um movimento de desmobilização, transferência, do saldo em causa e ele não consta da lista de valores penhorados do ponto 82 infra; no entanto, não há nada que demonstre que este valor não se encontra penhorado…]

33. A 08/08/2014, a AE faz novo pedido de penhora bancária de depósito bancário da executada no BES.

34. A 09/01/2015, a AE faz nova pesquisa de bens dos executados.

35. A 01/02/2015, a AE faz novo pedido de penhora de depósitos bancários do executado no BPI.

36. A 11/02/2015 é junto o seguinte despacho de 05/02/2015 proferido no apenso A [despacho que é notificado à AE]:

         Face à falta de impulso processual das partes, os autos encontram-se parados há mais de um ano, pelo que se declara interrompida a instancia — artigo 285 do CPC na redacção aplicável anterior a 2013. Notifique e aguardem os autos a deserção no arquivo.

37. A 28/02/2015, a AE actualiza a estatística dizendo que a execução está com diligências de penhora em curso.

38. A 17/03/2015, a AE faz averiguação de bens dos executados.

39. A 16/02/2016, o executado [aqui, como para diante, representado pelo advogado que tinha renunciado à procuração] faz o seguinte requerimento:

         Tendo tomado conhecimento do trânsito em julgado da sentença que declarou a insolvência da sociedade executada [sic], vem desse facto dar conhecimento aos autos e requerer a restituição das quantias indevidamente penhoradas.

              Junta uma informação registal de 24/02/2014 de que a Neves & Coelho, Lda, em liquidação, tem administrador judicial inscrito e tem uma declaração de 02/08/2013, de insolvência, registada a 08/08/2013, com nomeação de administrador judicial, transitada a 11/09/2013.

40. A 26/07/2016, a secção de processos notifica este requerimento à AE e à exequente.

41. A 28/09/2016, o executado faz o seguinte requerimento à AE:

         Tendo conhecimento de que lhe foi notificado, em 26/07/2016, o requerimento apresentado pelo executado em 16/02/2016, encontrando-se extinta a execução, vem requerer a restituição das quantias indevidamente penhoradas.

42. A 11-12/10/2016, a AE faz o seguinte requerimento [e dá conhecimento dele ao executado]:

         Vem, na sequência do requerimento apresentado nos autos pelo Sr. mandatário do executado, notificado por essa secretaria à signatária em 26/07/2016 informar do seguinte:

         Desconhecia a signatária a circunstância de se encontrar a correr processo de insolvência relativamente à exequente, desconhecendo assim igualmente em que estado se encontre tal processo.

         Deste modo desde já se requer que, averiguado que seja o estado da referida insolvência, profira despacho quanto ao destinatário das quantias penhoradas nos presentes autos, deva ser o exequente ou a massa insolvente do mesmo.

         Quanto às quantias penhoradas, no valor total de 5.427,08€, foram-no no normal decurso da presente execução, não tendo a signatária conhecimento de decisão alguma que tenha considerado tais penhoras indevidas.

43. A 21/10/2016, o executado solicita ao tribunal que sobre o requerimento apresentado em 16/02/2016, seja proferida decisão ou que seja ordenado o levantamento da penhora, por extinção da exequente, e ordenada a devolução ao executado das quantias penhoradas à ordem destes autos.

44. Num movimento de 21/02/2017, mas com data de 23/05/2017, foi proferido o seguinte despacho:

         Atento o teor da certidão permanente da CRComercial resulta que a exequente foi declarada insolvente encontrando-se em processo de liquidação. Face ao exposto, notifique o Administrador de Insolvência para, querendo, vir aos autos informar se mantém interesse na prossecução dos presentes autos pois que o exercício de funções próprias que lhe está cometido é corolário da privação do poder de administração e disposição dos bens que integram a massa insolvente (art. 81/1 do CIRE) e do poder de representação do devedor pelo AI, para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessem à insolvência (art. 81/4 do CIRE) sem prejuízo do disposto no art. 281 do CPC.

                                          *

         Req. com refª 2698962 [?]: Oportunamente tomaremos posição.

45. O AI é notificado por carta elaborada a 21/06/2017.

46. A 22/09/2017 [= refª 0711223] o executado requerer o prosseguimento dos autos em face da falta de resposta do AI

47. A 05/03/2018 é proferido o seguinte despacho:

         Req. com refª 0711223:

         Sopesado o valor dos presentes autos a constituição de mandatário é obrigatória, pelo que, notifique o AI para, no prazo de 10 dias, constituir advogado ou desistir da instância (art. 85/3 CIRE) sem prejuízo do disposto no artigo 281/5 do CPC.

         Notifique.

48. A 15/03/2018, num formulário electrónico em que a exequente se identifica como CdP, faz o seguinte requerimento [que notifica ao executado]:

         Massa Insolvente de CFSM, exequente melhor identificada nos autos à margem identificados, vem requerer se digne a admitir a junção aos mesmos de procuração outorgada ao Dr. T, Advogado e à Dr.ª V, Advogada.

                   Na procuração consta: MASSA INSOLVENTE N&C, LDA, NIPC: 500111111 e com o NISS: 20001111111, representada por PM, Administrador de Insolvência […]

49. A AE é notificada deste requerimento pela secção de processos por carta elaborada a 19/03/2018.

50. A 24/05/2019, a secção de processos notifica a AE para informar do estado da diligência.

51. A 27/05/2019, a AE informa que aguarda despacho ao m/requerimento datado de 11/10/2016.

52. A 25/06/2019, o juiz profere o seguinte despacho:

         Requerimento da AE, que antecede: notifique o exequente para, querendo, se pronunciar.

53. A 25/06/2019, o executado requer ao juiz se digne julgar deserta a instância, face à inércia do exequente por mais de 6 meses, e ordenar a devolução ao executado das quantias penhoradas.

54. A 03/09/2019, a Massa Insolvente de N&C, Lda, exequente, vem requerer a admissão do IBAN referente à conta bancária titulada pela mesma. Mais requer que sejam transferidos os montantes penhorados até à data para a respectiva conta bancária.

55. A 05/09/2019, o executado, “nos autos à margem referenciados, em que é exequente Massa Insolvente de N&C, Lda, notificado do requerimento da exequente enviado aos autos em 03/09/2019, vem dizer e requerer o seguinte [e dá conhecimento do requerimento à AE]:

         1 – A exequente enviou requerimento aos autos em 03/09/2019, dirigido à AE com a comunicação do IBAN aos autos, para efeitos de transferência das quantias penhoras ao executado.

         2 – Sucede, porém, que se encontra pendente nos autos, para decisão, um requerimento da AE enviado ao presente processo em 11/10/2016.

         3 – A AE reiterou o mencionado requerimento, mas sem que, até à presente data, recaísse decisão judicial sobre o mesmo.

         4 – Ora, o mencionado requerimento foi enviado aos autos pela AE depois de a exequente ter sido declarada insolvente.

         5 – Por sua vez, o executado vem requerendo a restituição das quantias penhoradas desde 16/02/2016, em face da referida insolvência declarada no ano de 2016,

         6 – O que reiterou em sucessivos requerimentos enviados aos autos.

         7 – Perante tudo isto, a exequente, 2 anos e 1 mês depois de ter sido declarada a insolvência, veio aos autos, em 15/03/2018, requerer a junção de procuração,

         8 – O que ocorreu muito para lá dos 6 meses previstos no art. 281 do CPC.

         9 – Ora, nos termos do art. 281/5 do CPC, “no processo de execução, considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses.”

         10 – Na sequência da intervenção tardia da exequente nos presentes autos, que ocorreu, sublinhe-se, 2 anos e 1 mês depois de ter sido declarada a sua insolvência, fácil é concluir que a presente execução se encontra extinta, por deserção.

         11 – Tal é consequência da conduta negligente da exequente, que não impulsionou os autos no período legal que tem para o efeito.

         12 – Não pode, pois, a exequente, na presente data, e encontrando-se o processo extinto por deserção, retirar qualquer efeito útil dos presentes autos, nomeadamente, receber as quantias penhoradas.

         13 – Para além disso, a exequente não prestou qualquer resposta à notificação efectuada pelo tribunal em 26/06/2019, para efeitos de pronúncia relativamente ao requerimento da AE de 27/05/2019, limitando-se a, cerca de 2 meses depois, comunicar o IBAN da exequente e com o pedido de entrega das quantias penhoradas.

         14 – Tal falta de resposta à referida notificação perante o tribunal, demonstra bem a falta de interesse que a exequente tem em colaborar na justa composição do litígio.

         15 – E, acresce ainda que, depois do requerimento da exequente de 15/03/2018, a juntar procuração, a mesma apenas requereu a transferência das quantias penhoradas em 03/09/2019!

         16 – Ou seja, bastante mais de 6 meses depois do primeiro requerimento que, por sua vez, foi enviado aos autos 2 anos e 1 mês depois de o executado ter informado da declaração de insolvência da exequente.

         17 – Não restam, pois, dúvidas, de que a exequente deixou passar o prazo de deserção da instância, e por mais de uma vez!

         Termos em que, reitera os sucessivos requerimentos enviados aos autos, nos quais pede a restituição das quantias penhoradas, desde o início da penhora, por motivo de negligência da exequente em promover os termos do processo por mais de 6 meses, que se encontra extinto, por deserção, nos termos e para os efeitos do art. 281/5 do CPC.

56. A 06/09/2019, o executado diz que junta – mas não junta – substabelecimento a favor de uma advogada.

57. A 19/12/2019, numa conclusão aberta a 22/10/2019, é proferido o seguinte despacho:

Averigúe junto do AI o estado do processo de insolvência da exequente.

58. A carta enviada pela secção ao AI vem devolvida a 08/01/2020.

59. A 27/01/2020 é junta informação da substituição do AI.

60. A 27/01/2020, a secção cumpre o despacho de 19/12/2019.

61. A 29/01/2020, o AI informa que prestou contas tendo as mesmas sido julgadas válidas, aguardando que seja realizado o mapa de rateio.

62. A 29/01/2020, o processo de insolvência informa que a insolvência se encontra em fase de ir à conta. Mais se informa que aguarda a prolação da sentença de encerramento.

63. A 06/02/2020, o executado vem dizer e requerer ao juiz o seguinte:

         1 – O executado vem requerendo a restituição das quantias penhoradas desde 16/02/2016, em face da referida insolvência declarada no ano de 2016,

         2 – O que reiterou em sucessivos requerimentos enviados aos autos.

         3 – A exequente, 2 anos e 1 mês depois de ter sido declarada a sua insolvência, veio aos autos, em 15/03/2018, requerer a junção de procuração,

         4 – O que ocorreu muito para lá dos 6 meses previstos no art. 281/5 do CPC, que comina com a deserção da instância quando “(…) independentemente de qualquer decisão judicial (…), por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de 6 meses.”

         5 – Acresce que, depois do requerimento da exequente de 15/03/2018, a juntar procuração, a mesma apenas requereu a transferência das quantias penhoradas em 03/09/2019, cerca de 1 ano e meio depois!

         6 – Na sequência da 1.ª intervenção tardia da exequente nos presentes autos, que ocorreu, sublinhe-se, 2 anos e 1 mês depois de ter sido declarada a sua insolvência, fácil é de concluir que a presente execução se encontra extinta, por deserção, já desde meados de Outubro de 2016.

         7 – E nem se diga que a instância ficou suspensa desde a insolvência da exequente, porquanto, nos termos do art. 88/1 do CIRE, a insolvência apenas tem efeitos suspensivos da instância relativamente ao devedor, isto é, quando este se encontra em situação de insolvência, e não relativamente ao credor/exequente.

         8 – Como referem Carvalho Fernandes e João Labareda, no CIRE anotado, quanto à disposição legal mencionada, “em qualquer dos casos, a suspensão só se verifica em relação a diligências ou providências que tenham por objecto bens integrantes da massa insolvente.”

         9 – Ora, as quantias penhoradas ao executado não integram os bens da massa insolvente.

         10 – Não pode, pois, a exequente, na presente data, devido ao facto de o processo se encontrar extinto por deserção, retirar qualquer efeito útil dos presentes autos, nomeadamente, receber as quantias penhoradas.

         11 – Para além do mais, depois de contactar telefonicamente o escritório do AI, foi obtida a informação de que não foi contemplado na prestação de contas e, por conseguinte, não estará previsto no mapa de rateio do processo de insolvência, os valores penhorados ao executado como crédito da massa insolvente ou da insolvência.

         12 – Não restam, pois, dúvidas, de que a exequente deixou passar o prazo de deserção da instância, por duas ocasiões, e, nos termos das informações obtidas do AI, não existe a expectativa jurídica de receber, no processo de insolvência, os valores penhorados ao executado nos presentes autos.

         Termos em que reitera novamente os sucessivos requerimentos enviados aos autos, nos quais pede a restituição das quantias penhoradas, desde o início da penhora, por motivo de negligência da exequente em promover os termos do processo por mais de 6 meses, que se encontra extinto, por deserção, nos termos e para os efeitos do art. 281/5 do CPC.

64. A 20/02/2020, o AI vem dizer o seguinte, quanto ao requerimento do executado:

         1- Decorre do texto do art. 281/5 do CPC, que são pressupostos para que a deserção da instância executiva possa ser declarada: a) Que o processo se encontre parado, a aguardar impulso processual das partes, há mais de 6 (seis) meses; b) E que essa paragem do processo, por falta de impulso processual, se fique a dever à negligência das partes.

         2- Em face do segundo pressuposto legal, a declaração de deserção da instância não pode ser automática, logo que decorridos os 6 meses de paragem do processo, pois que se impõe previamente à prolação do despacho que o tribunal aprecie e valore o comportamento processual das partes, por forma a concluir se a referida paragem de processo, por falta de impulso processual, é ou não devida à negligência daquelas.

         3- Nessa medida, num juízo prudencial, e também em obediência ao dever de observância do princípio do contraditório plasmado no artigo 3/3 do CPC, impõe-se ao tribunal que, previamente, dê oportunidade às partes de se pronunciarem a esse respeito, o que sucedeu in casu. Ora,

         4- foi proferido despacho em 05/03/2018 no sentido de a exequente vir aos autos para, no prazo de 10 dias, constituir advogado ou desistir da instância (art. 85/3 CIRE) sem prejuízo do disposto no artigo 281/5 do CPC.

         5- Através de requerimento datado de 15/03/2018 com a ref. 11954496 veio a massa insolvente a juntar procuração.

         6- Em 24/05/2019, foi a AE notificada para vir informar os autos sobre o estado das diligências, à qual a mesma veio responder em 27/05/2019, dando conhecimento que a mesma aguardava despacho ao requerimento datado de 11/10/16.

         7- Em 25/06/2019 com a ref. 119674389 foi proferido despacho para que a exequente se pronunciasse, tendo ela, em 03/09/2019, requerido a junção aos autos do IBAN referente à conta bancária titulada pela mesma e fossem transferidos os montantes penhorados até à data para a respectiva conta bancária.

         8- Em 22/10/2019 foi proferido despacho para que o AI viesse informar sobre o estado dos autos de insolvência, tendo o AI em 29/10/2019 dado conhecimento de prestou contas tendo as mesmas sido julgadas válidas, aguardando que seja realizado o mapa de rateio.

         9- Como é sabido, pode o AI rectificar e apresentar novas contas caso este valor penhorado seja entregue à Massa Insolvente, o que até à presente data tal não sucedeu, porque aguarda a AE ser esclarecida pelo tribunal (leia-se despacho) sobre o requerimento datado de 11/10/2016, nomeadamente sobre a quem deverá entregar os valores penhorados, à qual não obteve resposta até à presente data.

         10- Assim, para que se verifique a deserção da instância executiva prevista no art. 281 do CPC, há que verificar, tal como em processo declarativo, dois pressupostos cumulativos: um de natureza objectiva – a demora superior a 6 meses – e outro de natureza subjectiva a imputação de tal delonga à inércia de alguma das partes e só delas;

         11- Por isso, a inércia do AE, operador judiciário, no cumprimento do seu dever de pontualmente promover o andamento da execução, em especial, à entrega dos valores penhorados à massa insolvente, ponderando na sua devida medida a posição das partes e/ou solicitando a decisão do tribunal em caso de obstáculos colocados pela interpretação da lei, não pode ser, sem mais, considerada imputável às partes para esse efeito, in casu, à aqui exequente.

65. A 04/03/2020, o executado, vem dizer e requerer o seguinte:

         1 – Em primeiro lugar, o AI não é mandatário judicial da exequente, dado que esta juntou procuração para o efeito nos autos em 15/03/2018, através de requerimento dirigido ao juiz.

         2 – Do requerimento apresentado nos autos pelo AI, foi notificada judicialmente a mandatária substabelecida pelo mandatário judicial da exequente na data referida em 1, também em 21/02/2020. Sucede que,

         3 – O mandatário judicial e a mandatária substabelecida da exequente, até à presente data, nada disseram relativamente ao requerimento do AI, em representação da exequente. Ora,

         4 – Encontrando-se os autos em discussão de questões de direito e atendendo ao valor da acção, o requerimento de 20/02/2020, enviado aos autos pelo AI, é ineficaz se não for ratificado pelo mandatário judicial da exequente,

         5 – O que, até à presente data, como se referiu, ainda não sucedeu.

         6 – Ineficácia esta que se invoca, nos termos e para os efeitos do art. 40, n.ºs 1 e 2, do CPC. Não obstante,

         7 – Antes de a exequente vir aos autos juntar a procuração, a atribuir poderes forenses ao mandatário, já a instância se encontrava deserta, como se referiu nos diversos requerimentos enviados aos autos pelo executado.

         8 – E durante dois períodos: desde 16/02/2016 a 15/03/2018 e desde 15/03/2018 a 03/09/2019!

         9 – Isto é, até depois de ter sido notificada pelo tribunal, em 07/03/2018, para juntar procuração, a exequente demorou cerca de 1 ano e meio a pedir a transferência dos valores penhorados para a conta da massa insolvente.

         10 – E, desde 03/09/2019 até hoje, já decorreram mais 6 meses sem que o mandatário judicial da exequente venha sequer requerer a ratificação do processado!

         11 – Pelo que o factor objectivo da deserção da instância se encontra preenchido.

         12 – Relativamente ao facto de a exequente ter ou não agido com negligência processual, a mesma também se verifica. Com efeito,

         13 – Cabe à exequente provar que actos praticou e o que obstou à intervenção processual nos presentes autos entre os períodos temporais referidos em 8 e 10 supra.

         14 – Não o tendo feito, não demonstra a exequente ter agido com a prudência necessária à intervenção neste processo judicial,

         15 – Pelo que, agiu com negligência por si mesma causada entre o ano da insolvência da exequente de, repita-se, 2016, e a primeira intervenção nos autos, em Março de 2018 e, ainda, desde 15/03/2018 e 03/09/2019,

         16 – Cabendo à exequente provar que agiu de modo prudente ou não negligente, nos termos das regras gerais do ónus da prova, previstas no art. 342 do Código Civil.

         17 – Deste modo, ao contrário do que é referido pelo AI, não se deve a inércia da AE o facto de a exequente ter demorado um longo período de tempo a juntar procuração aos autos (2 anos!), sem qualquer justificação, e,

         18 – Mesmo depois disso, não é também devido a inacção da AE que foi requerida, tardiamente, pela exequente, a transferência dos valores penhorados para a conta da massa insolvente,

         19 – O que ocorreu cerca de 1 ano e meio depois da junção da procuração e não dentro dos 6 meses para o efeito.

         Termos em que reitera novamente os sucessivos requerimentos enviados aos autos, nos quais pede a restituição das quantias penhoradas, desde o início da penhora, por motivo de negligência da exequente em promover os termos do processo por mais de 6 meses, que se encontra extinto, por deserção, nos termos e para os efeitos do art. 281/5 do CPC.

66. A 06/03/2020, a AE vem reiterar que se aguarda despacho ao m/requerimento datado de 11/10/2016.

67. A 20/04/2020 é proferido o seguinte despacho:

         Renova-se o despacho antecedente [o juiz está a referir-se ao despacho de 19/12/2019…]

68. A 21/04/2020 o AI:

         informa que os autos de insolvência se encontram em fase de ir à conta, sendo que no pretérito dia 02/03/2020 foram remetidos à conta para cálculo das custas prováveis.

         Conforme se depreende do supra exposto, foram anteriormente prestadas contas pelo anterior AI, tendo as mesmas sido julgadas válidas.

         Todavia, e de modo a que possam ser rectificadas as mesmas, aguarda o signatário que se proceda à discriminação do valor penhorado à executada e posterior transferência pelo AE para a conta da massa insolvente de molde a que possam ser informados os autos de insolvência em conformidade.

69. A 28/04/2020, o executado vem dizer e requerer o seguinte:

         1 – O executado requereu nos autos a restituição das quantias indevidamente penhoradas.

         2 – O que ocorreu nos requerimentos datados de 16/02/2016, 21/10/2016, 22/09/2017, 25/06/2019, 05/09/2019, 06/02/2020 e 04/03/2020,

         3 – Nos termos e para os efeitos do art. 281/5 do CPC.

         4 – Sendo que, nos termos do alegado no requerimento de 04/03/2020, o AI, sem se encontrar representado para o efeito, não se encontra legitimado para apresentar defesa na qual se levantem questões de direito.

         5 – Porém, sem a referida legitimidade, o AI apresentou, directamente, defesa nos autos no requerimento de 20/02/2020, do qual foi notificada a mandatária judicial constituída pelo AI, mas sem ratificar o mencionado requerimento.

         6 – Pelo que, se requer a V. Exa. que sobre os requerimentos do executado incida despacho que julgue extinta a instância por deserção.

         Termos em que reitera os requerimentos enviados aos autos, nos quais pede a restituição das quantias penhoradas, desde o início da penhora, por motivo de negligência da exequente em promover os termos do processo por mais de 6 meses, que se encontra extinto, por deserção, nos termos e para os efeitos do art. 281/5 do CPC.

70. A 01/06/2020, a exequente:

         notificada do teor do requerimento do executado, vem subscrever na íntegra as considerações formuladas nos requerimentos do AI, de 20/02/2020 e 04/03/2020.

         Sendo que em face de decisão declaratória de insolvência da exequente e por força do prescrito no artigo 81/4 do CIRE, o “administrador” da insolvência assume a representação do devedor para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessem à insolvência, sendo certo que entre as várias funções que àquele incumbem destaca-se a de prover à conservação e frutificação dos direitos de insolvência (art. 55/1-b do CIRE).

         Assim, para a instauração de acções posteriores ou representação em acções pendentes à decisão de insolvência que a esta interessem – por o seu resultado poder afectar o activo ou o passivo da massa insolvente – só o AI, por princípio, tem legitimidade, apesar de não estar arredada a possibilidade do próprio insolvente tomar a iniciativa da acção, quando esteja em causa a valorização do património da massa insolvente – v., neste sentido, Lebre de Freitas, in Estudos sobre Direito Civil e Processo Civil, Vol. II, 2.ª ed., págs. 487 a 499.

         Pelo que não carece o AI de legitimidade para intervir nos presentes autos.

71. A 19/06/2020 é proferido o seguinte despacho:

         Informe o executado que os presentes autos não se encontram desertos, porquanto aguardavam o proferimento de decisão quanto ao requerido pela AE em 11/10/2016.

                                               *

         Notifique a AE para proceder à discriminação das quantias penhoradas e posterior colocação à ordem dos autos de insolvência do exequente o montante penhorado no processo.

72. A 23/06/2020, a AE faz novas pesquisas de bens dos executados.

73. A 26/06/2020, a AE notifica uma sociedade que identifica como entidade patronal do executado, da penhora do respectivo vencimento, com referência ao valor total previsto de 21.500€.

74. Na mesma data a AE notifica ao executado e o tribunal do seguinte: “dando cumprimento ao despacho proferido em 19/06/2020 e ao abrigo do disposto no art. 33 do CCJ, sou a remeter em anexo a nota discriminativa de despesas e honorários, donde resulta que se encontra disponível para entrega à massa insolvente o valor de 3.533,14€, e ainda em dívida o valor total de 20.591,03€.

75. Na nota discriminativa consta, entre o mais:

            VALOR Honorários SE €309,27 + despesas €85,88 = 395,15€ + IVA à taxa de 23% (€ 90,88) = total 486,03€

            Valor a receber pela SE (€486,03 – €160,00 provisão inicial recebida) = € 326.03.

            Valor devido à Exequente (quantia exequenda 12.887,98€ + juros de mora (até 23/06/2020) 5.365,98€ + restituição da provisão paga a SE 160€ + ½ SPC (até 23/06/2020) 3.627,06€ + Tx Justiça 24€) = 22.065,02€.

            Valor devido pelos Executados: quantia exequenda 12.887,98€ + juros de mora (até 23/06/2020) 5.365,98€ + SPC (até 23/06/2020) 7.254,12€ + Tx Justiça 24€ + honorários e despesas de SE até 23/06/2020 = 26.018,11€ – Total Penhorado (até 23/06/2020) 5.427,08€ = 20.391,03€

76. A 26/06/2020 a AE diz:

         A fim de dar cumprimento à notificação datada de 22/06/2020, vem informar o seguinte: a) efectuada notificação das partes da conta do processo; b) aguarda que o AI junte aos autos o requerimento de indicação de IBAN da massa insolvente; c) na presente data encontra-se penhorado o valor de 5.427,08€, sendo que, 326,03€ ficará retido para pagamento dos m/honorários e o valor de 1.567,91€ também ficará retido, pois corresponde à 1/2 da sanção pecuniária compulsória e que será entre[gue] aos cofres do Estado, pelo que, encontra-se disponível para ser entregue à massa insolvente o valor total de 3.533,14€.

77. A 07/07/2020, o executado recorre do despacho de 19/06/2020 – para que seja julgando nulo e revogado e substituído por outro que reconheça a extinção da execução e ordene a devolução ao executado das quantias penhoradas -, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

         1.ª O despacho recorrido não especifica os fundamentos de facto nem os fundamentos de direito em que assenta, com o que viola o artigo 154/1 do CPC.

         2.ª Por este motivo, o despacho recorrido padece de nulidades, nos termos do artigo 615/1-b do CPC, requerendo-se que essas nulidades sejam declaradas com as legais consequências.

         3.ª A decisão recorrida padece ainda de erro quanto à apreciação da matéria de facto, pois não considerou que, pelo menos, a instância executiva esteve absolutamente parada entre 17/03/2015 e 16/02/2016, pelo que, em 17/09/2015 se completaram 6 meses com a execução parada por culpa da exequente.

         4.ª Por este motivo, o requerimento de 11 ou 12/10/2016 da AE era irrelevante para obstar à extinção da instância ocorrida mais de um ano antes.

         5.ª Ao decidir diferentemente, o tribunal a quo fez errada apreciação da matéria de facto, devendo o assim decidido ser modificado, nos termos do artigo 662/1 do CPC, face aos elementos que constam dos autos.

         6.ª O despacho recorrido violou o disposto no art. 281/5 do CPC, pois deveria ter reconhecido a extinção da instância executiva decorridos 6 meses sobre 17/03/2015, por inércia da exequente, a qual opera independentemente de declaração, o que não fez.

         7.ª Tal decisão, além de violadora da lei, deu origem a processado inútil e anómalo, bem como a actuações ilícitas por parte da AE – que igualmente não pode ignorar a extinção da instância ainda em 2015 – além de que apresentou uma nota discriminativa errada e ordenou ilegalmente a penhora de vencimentos do executado, actuação essa que é causadora de evidentes prejuízos a este último.

78. A 09/07/2020 é dada a informação da apensação aos autos de uma oposição à penhora – apenso C.

79. A 19/08/2020 é junto pela AE um auto de penhora com data de 03/08/2020, no qual consta: Limite da penhora: Dívida exequenda: 12887,98€ Despesas prováveis 1288,80€ = 14176,78€; penhora do vencimento do executado: 191,84€; e notificação dessa penhora ao executado.

80. A 20/08/2020, é junta pela AE a seguinte nota de entrega de resultados à exequente: 3.533,14€. Do que é dado conhecimento à exequente a 21/08/2020, a título de adjudicação de valores penhorados.

81. A exequente não apresentou contra-alegações ao recurso.

82. 18/09/2020, é junto o despacho proferido no apenso C com data de 17/09/2020 com o seguinte teor:

         Admito liminarmente a presente oposição à penhora – art. 784/1-a do CPC.

         Notifique o exequente para, querendo, contestar (arts. 785/2 e 293 do CPC).

                                          *

         Notifique a AE para juntar aos autos principais, em 10 dias, informação quanto aos montantes até à data penhorados do vencimento auferido pelo executado.

83. A 21-22/09/2020, a AE junta a informação solicitada quanto aos montantes até à data penhorados do vencimento auferido pelo executado:

02/07/2009 – 283,87€;

04/08/2009 – 76,23€;

09/09/2009 – 266,93€;

08/10/2009 – 287,25€;

10/11/2009 – 285,56€;

29/12/2009 – 535,56€;

21/01/2010 – 283,86€;

04/02/2010 – 283,86€;

03/03/2020 – 280,48€;

15/04/2010 – 288,94€;

11/05/2010 – 285,56€;

15/06/2010 – 285,56€;

08/07/2010 – 251,53€;

22/06/2012 – 667,31€;

03/08/2020 – 191,84€;

Total = 4554,34

84. A 16/10/2020 foi admitido o recurso.

                                                                 *

              Questões que importa decidir: se, à data do despacho recorrido, a execução se encontrava deserta e se as quantias penhoradas nos autos deviam ter sido devolvidas ao executado.

                                                                 *

            Os factos que importam a estas decisões são os que constam do relatório que antecede e estão provados pela prova documental em que se consubstanciam.

                                                                 *

              Decidindo:

              Antes de mais, para clarificar o que resulta do relatório que antecede, registe-se:

              (i) a exequente não será a CdP, nem a massa insolvente de CM, ao contrário do que diz a própria exequente, mas sim a massa insolvente da N&C-Lda;

              (ii) o executado continua representado pelo advogado que subscreveu o recurso, apesar de este ter renunciado à procuração, em momento anterior – isto porque a renúncia nunca chegou a produzir efeito, por não ter sido notificada ao mandante (art. 47/2 do CPC).

              (iii) apesar de formalmente não se saber o resultado da oposição à execução, apenso A, resulta claro que esta, depois de um recurso de uma decisão interlocutória, acabou por ser julgada extinta por deserção (entre o mais, veja-se o ponto 36), pelo que a execução já não está suspensa desde então.

              (iv) 12 anos depois de se ter iniciado a execução, a executada ainda não está citada para ela, nem lhe foram penhorados quaisquer bens, e apesar disso a execução continua pendente contra ela.

              Posto isto;

                                  Da nulidade do despacho recorrido

              A 19/06/2020, ponto 71 do relatório, estava para decidir, pelo juiz, só relativamente ao executado, pelo menos, o seguinte: o requerimento do executado de há 4 anos atrás (ponto 39 – pedido de restituição das quantias penhoradas, dada a insolvência da exequente; dirigido depois à AE no requerimento do ponto 41), com insistência/reformulação a 21/10/2016 (ponto 43 – devolução das quantias penhoradas, agora por extinção da exequente), com insistência a 22/09/2017 (ponto 46), a 25/06/2019, com reformulação (ponto 53 – deserção da instância por inércia da exequente e devolução das quantias penhoradas), a 05/09/2019, com reformulação e outras questões (ponto 55), a 06/02/2020 (ponto 62), a 04/03/2020 (ponto 65) e a 28/04/2020 (ponto 69).

              Nesse despacho, na 1.ª parte, dá-se uma ‘informação’ ao executado, com base num único facto implicitamente dado como provado, decidindo-se que a execução não está deserta, explicando-se porquê; existe, assim, fundamentação de facto e de direito, embora se possa considerar deficiente, pelo que não se verifica a nulidade prevista no art. 615/1-b do CPC.

              Já na 2.ª parte decide-se indeferir tacitamente o pedido de devolução das quantias penhoradas, sem fundamentação de facto ou de direito, pelo que se verifica a nulidade apontada. Repare-se que as questões colocadas pelo executado tinham óbvia pertinência face ao que se passou nos autos, tinham, presumivelmente, importância real para o executado, face ao facto de estar em causa parte do seu salário, de valor reduzido, e diziam respeito a questões reguladas por normas jurídicas não confiadas ao arbítrio do julgador. Não se tratava, por isso, de um despacho de mero expediente ou de um despacho proferido no uso legal de um poder discricionário (art. 152/4 do CPC, a contrario); deviam ter, por tudo isto, um mínimo de fundamentação que tentasse convencer da bondade da decisão (art. 152/1 do CPC).  

              A consequência da nulidade é a substituição do tribunal recorrido pelo tribunal de recurso, se este tiver elementos suficientes para o efeito (art. 665/1 do CPC), o que é o caso, já que todos eles constam dos autos e já foram relatados supra.

              Note-se que, como se viu, o tribunal, à data do despacho, tinha ainda outras questões para decidir, para além da questão da deserção e da devolução das quantias penhoradas, pelo se verifica ainda a nulidade da omissão de pronúncia (art. 615/1-d, 1.ª parte, do CPC), mas as nulidades das sentenças e dos despachos não são de conhecimento oficioso (art. 615/4, a contrario, do CPC), pelo que só há que conhecer daquelas que o executado pôs em causa no recurso, ou seja, no caso, a da decisão de não levantar a penhora (a 2.ª decisão).

                                                                 *

Recurso sobre matéria de direito

              Comece-se pela 1.ª decisão.

Da deserção

              A deserção das execuções (art. 281/5 do CPC) é, como diz o executado, automática, ao contrário do que se verifica quanto às acções declarativas (art. 281/4-5, este, agora, a contrario, do CPC), mas está, tal como quanto a estas, dependente da verificação da negligência das partes em impulsionar o processo.

              Dizer-se que uma parte foi negligente em impulsionar o processo, equivale a dizer que ela não fez alguma coisa que devia ter feito se actuasse com o cuidado que uma pessoa razoável teria tido nas mesmas circunstâncias.

              Ora, o andamento subsequente dos processos judiciais, depois de terem sido instaurados, raramente depende de um impulso das partes. Isto é, só depende dele, se existir uma norma específica da lei ou um despacho do juiz a impor esse impulso subsequente. É o que decorre, em parte expressa e em parte implicitamente, do artigo 6 do CPC.

              Quer isto dizer que, em regra, a parte pode ter a legítima expectativa de que, tendo intentado uma acção judicial, o tribunal a faça prosseguir sem necessidade de a parte fazer algo mais. E ‘tribunal’ aqui está empregue em sentido amplo, de modo a abranger não só o juiz, como a secção de processos e, nas execuções, os agentes de execução, porque estes não são representantes das partes, mas órgãos da justiça no exercício da função de execução (é o que decorre também do art. 719 do CPC e do art. 162/1 e 3 do Estatuto da Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução, em anexo da Lei 154/2015, de 14/09: 1 – O agente de execução é o auxiliar da justiça que, na prossecução do interesse público, exerce poderes de autoridade pública no cumprimento das diligências que realiza nos processos de execução […] 3 – O agente de execução, ainda que nomeado por uma das partes processuais, não é mandatário desta nem a representa.)

              Tendo em conta que o processo de execução é levado a cabo por um AE, e que o exequente tem o poder de substituir a AE desde que possa considerar fundamentadamente que este não está a agir como devia (art. 720/4 do CPC), uma das hipóteses de responsabilizar o exequente pela paragem do processo é a de dizer que o AE não está a dar andamento ao processo, que o exequente sabe disso e que sabe também que só substituindo o AE poderá fazer andar o processo.

              De algum modo neste sentido, diz Lebre de Freitas: “Tendo o exequente a faculdade de destituir o agente de execução (art. 720-4 do CPC), o apelo à ideia de ónus ainda é possível quando a omissão das diligências processuais possa dever-se à manutenção em funções dum agente de execução não actuante. […]” (A acção executiva, 7.ª edição, Gestlegal, 2017, pág. 300, nota 36).

              Por outro lado, poderá haver, no decurso da execução, alguns actos que o exequente tenha que ir praticando e que se não o fizer a execução não possa prosseguir, como se vê, por exemplo, do art. 721 do CPC (2 – A execução não prossegue se o exequente não efectuar o pagamento ao agente de execução de quantias que sejam devidas a título de honorários e despesas; 3 – A instância extingue-se logo que decorrido o prazo de 30 dias após a notificação do exequente para pagamento das quantias em dívida, sem que este o tenha efectuado […].) Também, por exemplo, o art. 763 do CPC, para o caso de levantamento da penhora (se, por acto ou omissão que não seja da responsabilidade do executado, não forem efectuadas quaisquer diligências para a realização do pagamento efectivo do crédito nos 6 meses anteriores ao requerimento), fala, no n.º 3, da imputação ao exequente das custas a que deu causa, no n.º 4 refere a prática de actos que o exequente tenha negligenciado e no início da actuação negligente do exequente e no n.º 5 prevê a hipótese de o exequente retomar a prática normal dos actos executivos subsequentes.

              Assim, sempre que se possa dizer que, por força de uma norma legal, ou de um despacho do juiz ou de uma decisão do AE, o exequente tenha que fazer alguma coisa para que a execução ande, ele saiba disso e não o faça, ele pode ser responsabilizado pelo período de paragem do processo. Designadamente se lhe for dado conhecimento de que o processo está à espera que o AE faça alguma coisa, que já foi feito o que havia a fazer quanto a isso e que só a substituição da AE é que permitirá desbloquear a situação.

              Mas, sendo isto assim, não basta, para que se possa concluir que um exequente está a ser negligente no impulsionar do processo, dizer-se que ele tem o poder de substituir o AE ou que ele tem conhecimento ou pode ter conhecimento de que a execução não está a andar. É ainda necessário algo mais: em princípio, um despacho do juiz, que ponha o exequente perante a necessidade de fazer alguma coisa, designadamente substituir o AE sob pena de a execução se considerar extinta.

              De algum modo, neste sentido, veja-se a discussão da questão no ac. do TRG de 30/05/2018, proc. 438/08.5TBVLN.G1, em que se diz, com um voto de vencido, que: […] II. No actual regime desjudicializado do processo executivo, cabendo em regra ao AE promover o seu regular andamento – actuando como profissional liberal e em nome do tribunal que o haja nomeado -, a omissão do cumprimento de um concreto dever que lhe seja cometido para aquele efeito, não pode ser feita recair automaticamente no exequente, como incumprimento de um dever próprio de impulso processual, por o AE não ser seu representante, nem por si contratado (art. 719/1 do CPC). III. Só perante a comunicação que seja feita ao exequente da indevida inércia do AE, se constitui o respectivo ónus de tomar posição sobre o incumprimento comunicado, passando então os autos a aguardar o seu impulso processual próprio, a ocorrer necessariamente nos 6 meses subsequentes (art. 281/5 do CPC). O acórdão em causa tem uma extensa referência a inúmeros acórdãos no mesmo sentido e outros em sentido contrário (estes também referidos no voto de vencido).   

              Posto isto,

              No período em causa – o indicado pelo executado: de 17/03/2015 a 16/02/2016 – não havia nada que a exequente devesse (note-se: ‘devesse’, o que é diferente de ‘pudesse’) ter feito, pelo que o facto de, realmente, nada ter sido feito nesse período não equivale a uma omissão negligente da exequente que seja suficiente para a deserção, embora pudesse vir a ser prejudicado por ela como se verá à frente.

              Recorrendo-se ao corpo das alegações do recurso do executado, para se perceber porque é que ele diz o contrário, vê-se que ele entende, por um lado, que o facto de um processo estar parado durante um certo período de tempo é imputável à exequente, mesmo sem dizer em que é que ele teve culpa nessa paragem e, por outro lado, que a inactividade da AE nesse período equivale a inactividade da exequente, sem que fundamente qualquer destes pressupostos, sendo que o relevo de tudo isto já foi afastado com o que foi dito acima.

              Por fim, o executado no corpo das alegações acrescenta, sem reflexo nas conclusões – o que indicia falta de confiança na afirmação e confusão entre exequente e AE -, que o processo também esteve parado entre 16/02/2016 e 28/09/2016. Ou, mais à frente, até 11/10/2016. Mas o facto de o executado ir acrescentando períodos de paragem, não é argumento adicional que tenha de ser afastado.

                                                                 *

              De qualquer modo, veja-se o que é que se passava de facto e o que é que se devia/podia ter feito.

              A 17/03/2015, a execução estava pendente há mais de 6 anos. Tinham sido penhorados alguns valores até 22/06/2012 (ponto 82) e/ou 14/02/2014 (ponto 32). Há, pois, mais de 1 ano, pelo menos, que nada era penhorado. Entretanto tinham sido feitas, pela AE, variadíssimas outras averiguações de bens, sem que tivessem dado origem a penhoras, as últimas das quais nesse mesmo dia 17/03/2015.

              O que é que devia ter sido feito a seguir e por quem?

              Vejam-se as disposições seguintes (as normas em causa são do CPC depois da reforma de 2013 e são aplicáveis ao caso porque, embora a execução se tenha iniciado muito antes, todos os actos ou omissões que estão em causa se verificaram depois da entrada em vigor da reforma; isto tendo em conta também o disposto no art. 6/1 da Lei 41/2013, de 26/06; as reformas posteriores, por sua vez, não mexeram nas precisas disposições que vão ser citadas):

              Artigo 750 do CPC: 1 – se não forem encontrados bens penhoráveis no prazo de 3 meses a contar da notificação prevista no art. 748/1 do CPC [= A secretaria notifica o AE de que deve iniciar as diligências para penhora:], o AE notifica o exequente para especificar quais os bens que pretende ver penhorados na execução; simultaneamente, é notificado o executado para indicar bens à penhora […]. 2 – Se nem o exequente nem o executado indicarem bens penhoráveis no prazo de 10 dias, extingue-se sem mais a execução. 3 – No caso previsto no n.º 1, quando a execução tenha início com dispensa de citação prévia, o executado é citado; se o exequente não indicar bens penhoráveis, tendo-se frustrado a citação pessoal do executado, não há lugar à sua citação edital deste e extingue-se a execução nos termos do número anterior.

              Artigo 763/1 do CPC (levantamento de penhora): O executado pode requerer ao AE o levantamento da penhora se, por ato ou omissão que não seja da sua responsabilidade, não forem efectuadas quaisquer diligências para a realização do pagamento efectivo do crédito nos 6 meses anteriores ao requerimento.

              Artigo 779/4 (Penhora de rendas, abonos, vencimentos, salários ou rendimentos periódicos]: Findo o prazo de oposição, se esta não tiver sido deduzida, ou julgada a oposição improcedente, caso não sejam identificados outros bens penhoráveis, o agente de execução, depois de assegurado o pagamento das quantias que lhe sejam devidas a título de honorários e despesas: a) Entrega ao exequente as quantias já depositadas que não garantam crédito reclamado; b) Adjudica as quantias vincendas, notificando a entidade pagadora para as entregar directamente ao exequente, extinguindo-se a execução.

              Artigo 780/13: Penhora de depósitos bancários: Findo o prazo de oposição, se esta não tiver sido deduzida, ou julgada a oposição improcedente, o agente de execução entrega ao exequente as quantias penhoradas que não garantam crédito reclamado, até ao valor da dívida exequenda, depois de descontado o montante relativo a despesas de execução referido no n.º 3 do artigo 735.º.

              Artigo 788/4 Reclamação dos créditos: Não é admitida a reclamação do credor com privilégio creditório geral, mobiliário ou imobiliário, quando: a) A penhora tenha incidido sobre bem só parcialmente penhorável, nos termos do artigo 738.º, renda, outro rendimento periódico, veículo automóvel, ou bens móveis de valor inferior a 25 UC; ou b) Sendo o crédito do exequente inferior a 190 UC, a penhora tenha incidido sobre moeda corrente, nacional ou estrangeira, depósito bancário em dinheiro; […]

          Artigo 796/1 – As diligências necessárias para a realização do pagamento efectuam-se obrigatoriamente no prazo de três meses a contar da penhora […]

              Artigo 797: Decorridos três meses sobre o pagamento parcial sem que tenham sido identificados outros bens penhoráveis, aplica-se o disposto no artigo 750.º.

              Assim, até 3 meses depois da última penhora (que ocorreu a Fev2014, pelo que, os 3 meses terminavam em Maio2014), a AE devia ter dado destino aos montantes penhorados (com pagamento de parte das custas e do crédito exequendo) e, 3 meses depois disso (por isso em Agosto2014), sem terem sido encontrados outros bens, devia ter cumprido o disposto no art. 750 do CPC, isto é, devia ter notificado a exequente, dizendo-lhe que não tinha encontrado outros bens penhoráveis e que a exequente devia agora especificar outros bens que pretendesse ver penhorados na execução; simultaneamente, devia notificar o executado para indicar bens à penhora; e, pelo menos então, devia ter citado a executada para a execução. Se nem o exequente nem o executado indicassem bens penhoráveis no prazo de 10 dias, extinguia-se sem mais – realce-se o ‘sem mais’ utilizado pelo legislador – a execução.

              O executado, por sua vez, já podia ter, 6 meses depois da última penhora (de Fev2014 – portanto desde Agosto 2014), requerido perante a AE o levantamento da penhora, e também já podia, desde Agosto2014 reclamado perante ela pelo cumprimento do disposto no art. 750 do CPC que levaria à extinção da execução. Se a AE, no prazo de 10 dias (art. 720/7 do CPC), não levantasse a penhora e/ou não desse cumprimento ao disposto no art. 750 do CPC, o executado podia, no prazo de 10 dias (art. 149 do CPC), reclamar para o juiz (art. 723/1-c do CPC).

              Perante tudo isto, vê-se que seria contrário à lógica das coisas – do interesses em causa – dizer que cabia à exequente impulsionar o processo, no caso, insistindo pelo cumprimento do art. 750 do CPC, para que a execução se viesse a extinguir. O interesse dela seria, sim, o de que lhe fosse pago o crédito, ao menos em parte, e podia-o ter requerido, mas não o ter feito não equivale a ter actuado negligentemente quanto ao andamento global do processo e não lhe pode ser censurado o facto de não ter feito com que o processo se extinguisse, porque contrário aos interesses dela.

              Assim sendo, conclui-se que não se verifica a negligência da exequente como pressuposto da deserção da instância do art. 281/5 do CPC.

              Aliás, tendo em conta tudo o que já se disse, vê-se que o regime descrito, na parte do levantamento das penhoras, é muito mais favorável para os executados, do que o da deserção, pelo que era aquele que se justificava que no caso fosse aplicado e não o do deserção.

                                                                 *

Do levantamento da penhora

              Do que antecede, já decorre que o executado podia ter requerido o levantamento da penhora e, mais ainda, que podia legitimamente esperar que a actuação do AE já tivesse levado à extinção da execução, com a consequência, também, do levantamento da penhora (Lebre de Freitas, obra citada, págs. 298 e 413 a 416).

              O levantamento da penhora, directo, teria que ser requerido à AE, com posterior reclamação para o juiz.

              Já o levantamento indirecto da penhora, devido à extinção da execução, teria que resultar ou do comportamento da AE, se necessário por requerimento do executado com eventual reclamação para o juiz (pela via, por exemplo, do art. 750 do CPC – daí, por exemplo, o teor do ac. do TRL de 10/05/2018, proc. 2491/08.2TBPDL-B.L1-6: III – Incumbe ao AE o cumprimento dos requisitos contidos no art. 750/1-2 do CPC, previamente à extinção da execução. IV- O decurso do prazo de 3 meses, previsto neste preceito legal, para a localização de bens penhoráveis através das diligências realizadas pelo AE, não permite por si só declarar extinta a execução, sem ocorrer prévia notificação ao exequente e executado nos termos previstos no seu n.º 2.), ou imposto oficiosamente pelo juiz (determinando que o AE cumprisse o disposto no art. 750 do CPC se por alguma razão se desse conta de que a situação dos autos já impunha inequivocamente essa notificação e se se pudesse considerar autorizado a dar tal despacho ao abrigo do artigo 6/1 do CPC), ou de uma verificação, pelo juiz, oficiosamente, ou eventualmente na sequência de reclamação, de uma causa de extinção da execução, por exemplo, por deserção.

              Aquilo que, no caso, o executado podia ter feito/requerido já se viu.

              Veja-se agora o que é que ele fez.

              O primeiro requerimento feito pelo executado é o de 16/02/2016 (ponto 39), dirigido ao juiz (tal como todos os outros à excepção do 2º).

              O fundamento invocado está errado – uma exequente não se extingue por ter sido declarada insolvente e estar em liquidação e, mesmo que entretanto se viesse a extinguir, tal não evitaria que a quantia penhorada fosse destinada ao pagamento dos créditos reconhecidos na insolvência (o executado, aliás, já deixou cair este fundamento).

              O segundo requerimento, é o do ponto 41, do mesmo teor do anterior, agora dirigido à AE. Repete-se: estava errado e não poderia conduzir ao levantamento das penhoras.

              O terceiro requerimento (do ponto 43) insiste no erro do primeiro.

              O quarto requerimento (do ponto 46) tem o mesmo fim, embora com diferente formulação.

              O quinto requerimento (do ponto 53) é uma pretensão de deserção da instância e, por aí, de levantamento das penhoras. Ora, já se viu que não se verifica a deserção da instância.  

              O sexto requerimento (do ponto 55) é uma insistência nos dois fundamentos anteriores, cuja relevância já foi afastada.

              O sétimo requerimento (do ponto 63), reafirmado na resposta do ponto 65, volta a insistir (i) na extinção da exequente como causa de extinção da execução, o que já se sabe não ser certo, e (ii) na deserção da instância, que também já se viu não ocorreu.

              E no oitavo requerimento (do ponto 69), o executado volta a insistir, sempre perante o juiz (com a ressalva já referida), na devolução das quantias, por deserção da execução.

              Assim, conclui-se que o executado nunca colocou a AE perante a questão do levantamento das penhoras, por força da verificação da situação do art. 763 do CPC (perante a AE, o que fez foi invocar-lhe a extinção da exequente, o que era um erro, como se viu); nem nunca reclamou, perante a AE, pela notificação da exequente e do executado, de modo a que a execução viesse a ser extinta nos termos do art. 750 do CPC.

              Eram estas as situações que se verificavam e eram estas as situações que podiam levar ao levantamento directo das penhoras, ou indirecto pela via da extinção da execução.

              Pelo que, nunca tendo sido feitos os requerimentos adequados, nunca os resultados pretendidos pelo executado podiam ter sido obtidos.

              Em consequência, a 1.ª decisão do despacho de 19/06/2020 (ponto 71) está correcta, embora a fundamentação esteja errada (a razão pela qual não se verificava a deserção era outra). Tal como está correcta a 2.ª decisão (do mesmo ponto 71), porque, não tendo o executado requerido, em tempo, o levantamento das penhoras ao abrigo do art. 763/1 do CPC, nada impedia que o pagamento, com o produto das penhoras, fosse então feito a quem era devido.

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              As outras questões levantadas pelo executado, na conclusão 7.ª, não são objecto deste recurso: ocorreram posteriormente ao despacho recorrido (não foram, por isso, decididas nele as questões que estão subjacentes) e são ou deviam ser ou serão objecto próprio de reclamação da nota discriminativa e de oposição às novas penhoras.

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              Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente.

              Custas, na vertente de custas de parte, pelo executado (por ter decaído no recurso); ou seja, ele perde aquilo que já pagou de taxa de justiça como impulso do recurso.

              Lisboa, 03/12/2020

              Pedro Martins

              1.º Adjunto

             2.º Adjunto