Voto vencido: 

              O art. 989/3 do CPC, acrescentado pela Lei 112/2015 [ou antes 122/2015] diz respeito a situação em que a prestação alimentar não está já fixada a favor do filho e dá origem a um direito do progenitor não obrigado (cujo montante pode depois ser entregue ao filho, por decisão do tribunal ou acordo dos pais, como se vê do art. 989/3 do CPC, pelo que a prestação não pode ser aquela a que o filho tem direito, sob pena de se estar a admitir que terceiros decidam de um direito de outrem sem sequer a intervenção deste).

              A situação dos autos não tem, por isso, nada a ver com o art. 989/3 do CPC. No caso dos autos, a prestação já estava fixada e, sendo o filho maior de idade, é ele o titular de tal direito, que não pode ser exercido por mais ninguém (art. 130 do CC). O não cumprimento da obrigação pelo progenitor obrigado não pode ser configurado como um facto ilícito (violador do direito do filho) que provoque danos no progenitor não obrigado (art. 483 do CC), como se defende, sem qualquer fundamento, na posição que fez vencimento.

              É certo que se pode verificar a sub-rogação de direitos. Mas para isso têm que se alegar os respectivos pressupostos e no caso não foi invocada nem a sub-rogação, nem os pressupostos da mesma: o progenitor não obrigado não disse que tinha pago a obrigação em lugar do outro, pelo que é impossível que se possa dizer preenchida quer a sub-rogação pelo credor (art. 589 do CC), pelo devedor (art. 590 do CC) ou pela lei (art. 592 do CC). Em relação a esta, aliás, não só não se verifica (não foi alegado) o pressuposto do cumprimento da obrigação, como, para alem disso, o progenitor não obrigado não tinha garantido o cumprimento nem estava directamente interessado na satisfação do crédito (como se pode ver na explicação que de tal noção é dada por Antunes Varela e Pires de Lima, CC anotado, vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, 1982, pág. 577). A invocação da figura da sub-rogação legal, por Remédio Marques (pág. 339 da 2ª edição de Algumas notas sobre alimentos, Coimbra Editora, 2007), depende de se poder entender que, pelo contrário, ele tem um interesse directo na satisfação do crédito, o que Remédio Marques nem sequer tenta demonstrar.

              Por fim, se estivesse em causa uma sub-rogação legal, então o direito seria do progenitor não obrigado que não o poderia exercer neste processo, que diz respeito aos direitos do filho e não daquele progenitor.

              Não tendo sido invocada a sub-rogação, nem os pressupostos da sub-rogação, o deferimento da pretensão do progenitor não obrigado representa a aceitação pelo tribunal do exercício do direito do filho pelo progenitor não obrigado, ou seja, do exercício do direito de A por B sem qualquer suporte legal.

              Representa também a violação frontal da autonomia (dignidade) de A relativamente ao exercício dos seus direitos. O tribunal tem de admitir a hipótese de o filho não ter querido exigir do progenitor obrigado o cumprimento da obrigação de pagar os alimentos, mas mesmo assim, sem respeito pela (potencial) vontade do mesmo, permite o exercício desse direito por outrem.

             Pedro Martins

 

          Notas posteriores

          Elementos para reponderar a questão e a solução, entre outros:

          I– J. H. Delgado Carvalho, O novo regime de alimentos a filho maior ou emancipado; contributo para a interpretação da Lei n.º 122/2015, de 01/09, https://blogippc.blogspot.pt/2015/09/o-novo-regime-de-alimentos-devidos.html

          II– Ac. do TRL de 30/06/2016, proc. 6692/05.7TBSXL-C.L1.-2

       III– Diana Gomes Rodrigues Mano, A Obrigação de Alimentos a Filhos Maiores e o Princípio da Razoabilidade – Tese de Mestrado, Outubro de 2016, Universidade do Minho, Escola de Direito.

   IV– Parecer do CC do IRN 85/2015 STJ-CC com data de homologação de 29/10/2016, file:///C:/Users/mj01332/Documents/processo%20civil/alimentos%20filhos%20maiores%2053_CC_2016-CC85-2015-STJ-CC.pdf   

          V- Gonçalo Oliveira Magalhães, (Juiz de Direito) – A tutela (jurisdicional) do direito a alimentos dos filhos maiores que ainda não concluíram a sua formação profissional – Julgar Online, Março de 2018 | 1 

      VI- Acórdão do TRP de 24/11/2016, processo 36/14.4T8SJM.P1  [relator: Aristides Rodrigues de Almeida, que autorizou esta publicação] que diz, na parte que interessa à questão: 

                C] Da excepção da ilegitimidade processual da autora.

           O recorrente questiona a legitimidade adjectiva da autora (1) para, depois de o filho atingir a maioridade, reclamar o pagamento do valor da pensão de alimentos devida àquele durante a respectiva menoridade.

              Esta questão foi decidida pelo Mmo. Juiz a quo nos seguintes termos: «[…]quanto à invocada ilegitimidade, julgo desde já improcedente tal excepção, pois após a maioridade do filho o progenitor a quem foi confiada a guarda não perde a legitimidade para continuar a exigir do outro, em incidente de incumprimento, o pagamento das prestações alimentares vencidas e não pagas durante a menoridade do filho, mantendo o progenitor a quem o menor foi confiado legitimidade, em nome próprio ou em representação do filho, para as exigir do outro progenitor – cf. Acórdão da Relação de Coimbra de 28/01/2014 (Relator: Fonte Ramos), proferido no Proc. 989/08.1TBPMS-A.C1, disponível in www.dgsi.pt.

              No Acórdão citado na decisão recorrida, em que interveio a aqui 1.ª Adjunta também nessa qualidade, estava em causa uma execução especial por alimentos instaurada pela mãe na sequência do incidente promovido pelo Ministério Público de incumprimento da regulação das responsabilidades parentais quanto a alimentos, com a particularidade de a instância se ter iniciado quando os filhos eram menores e eles terem entretanto atingido a maioridade, discutindo-se a legitimidade da mãe para prosseguir com a instância executiva para obter o pagamento das prestações relativas ao tempo da menoridade, tendo a decisão recorrida considerado que a mãe não tinha legitimidade.

           Nesse contexto o Acórdão expressou o seguinte entendimento: «Embora estejamos perante matéria que tem suscitado alguma divergência na doutrina e na jurisprudência, afigura-se, por um lado, que é maioritária a corrente contrária ao entendimento que vemos sufragado no despacho recorrido e, por outro lado, sem quebra do respeito sempre devido, aquela perspectiva é a que efectivamente respeita a ligação entre “a lei e a vida real”, por forma a que os normativos legais aplicáveis tenham “um sentido mais justo e mais apropriado às exigências/interesses da vida”.[..] Acresce que, tratando-se de processo de jurisdição voluntária (…), o tribunal não está vinculado à observância rigorosa do direito aplicável à espécie vertente/ não está sujeito a critérios de legalidade estrita, tendo a liberdade de se subtrair a esse enquadramento rígido e de proferir a decisão que lhe pareça mais equitativa (mais conveniente e oportuna) (…), a que melhor serve os interesses em causa[..], sendo que, salvaguardados os efeitos já produzidos, será sempre possível a alteração de tais resoluções com fundamento em circunstâncias supervenientes[..] (…). E o Tribunal deverá buscar a solução mais justa, a que repute como mais conveniente e oportuna, em ordem a uma equitativa composição dos interesses em presença, encontrando-se, assim, a resposta mais adequada ao caso concreto, sendo que, na regulação do exercício das responsabilidades parentais, sobrelevam os reais interesses do menor, que sempre se imporá salvaguardar e proteger, não podendo deixar de se atender às circunstâncias dessa efectiva salvaguarda e protecção.[..]

               [..] O dever de prestar alimentos aos filhos menores recai sobre ambos os pais que, em conjunto, estão onerados com a obrigação de contribuir para o sustento, manutenção e educação dos descendentes menores. Trata-se de uma manifestação do conteúdo do poder paternal (das responsabilidades parentais) a que estão sujeitos os filhos até à maioridade ou emancipação (…). […] O beneficiário da prestação alimentar é o menor, mas é o progenitor a quem foi confiado que goza da respectiva titularidade, agindo em substituição processual, parcial, representativa do menor. Age em nome próprio e, por isso, é parte processual. [..] É ao progenitor com a guarda do menor (com quem ele reside habitualmente) que cabe a legitimidade para, em substituição processual do menor, pedir os alimentos, a sua alteração ou exigir o cumprimento coercivo da obrigação. Por conseguinte, se o progenitor condenado a entregar ao outro prestações a título de alimentos devidos ao filho menor não cumpre, este fica onerado e passa a custear despesas que obrigavam aquele (custeia os encargos com o sustento e a educação do filho na totalidade), despesas que só ele pode exigir do devedor, seja no exercício de um direito próprio, seja, quando assim se entenda, por via sub-rogatória (art.º 592º, n.º 1, do CC). Por isso, satisfeita unilateralmente a obrigação, compreende-se que só quem efectivamente a cumpriu possa exigir do co-obrigado os encargos a que esse cumprimento deu origem e lhe assista legitimidade para exigir a parte dos encargos que, na repartição efectuada, o outro obrigado deixou de lhe prestar.

              […] o problema não será propriamente de legitimidade processual (…) mas, antes, um efeito da não coincidência entre o sujeito que detém a titularidade e disponibilidade do direito quanto às prestações vencidas durante a menoridade e o seu beneficiário, como reflexo do conteúdo e exercício das responsabilidades parentais e da natureza que, no seu âmbito, assume o direito a alimentos (…). A recorrente será, por isso, a titular dos alimentos fixados ao filho enquanto menor, seu beneficiário, e, também por isso, será ela a titular do direito de continuar a exigir do progenitor as prestações que este lhe não entregou durante a menoridade do filho, nos termos fixados na sentença da acção de regulação e nas decisões subsequentes. […] apenas ela poderá reclamar ou renunciar à exigência dessas prestações vencidas, sem as quais proporcionou ao menor as condições de vida que teve por convenientes ou possíveis, prestações que, (…), dada a natureza da obrigação alimentar relativa a menor a expensas do progenitor, não se apresentam como convertíveis em crédito próprio do filho após a maioridade deste.[..] Ou seja, as prestações vencidas durante a menoridade não se convertem em crédito próprio do filho após a maioridade deste, mantendo o progenitor a quem o menor ficou confiado legitimidade, em nome próprio ou em representação do filho, para as exigir do outro progenitor. […] esta é a solução que respeita, por um lado, o regime jurídico vigente, e que, por outro lado, salvaguarda a ligação entre “a lei e a vida real”, conferindo aos normativos legais aplicáveis “um sentido mais justo e mais apropriado às exigências/interesses da vida”.»

              No Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15.04.2015, relatado por Granja da Fonseca, no proc. n.º 200080-C/1996.L1.S1, in www.dgsi.pt, o contexto processual altera-se no aspecto em que a execução por alimentos foi instauradadepois de o filho atingir a maioridade, mas ainda assim o valor que se discute respeita ao período da menoridade.

          Nesse aresto o Supremo Tribunal de Justiça revelou o seguinte entendimento: «Perspectivando analiticamente a obrigação alimentar nos quadros de uma relação obrigacional [..], é viável considerar que os alimentos são prestados a benefício dos filhos das partes. Podem, pois, ser tidos como os credores da prestação alimentícia a cargo do recorrente [..].Todavia, … a dissonância entre a legitimidade formal e a titularidade efectiva do crédito em causa não assume, em face do critério que se contém no n.º 1 do artigo 53º do Código de Processo Civil, qualquer relevância. Ademais, tal incoerência constitui uma ressonância das particularidades do modo como se efectiva o direito a alimentos a menores na sequência da ruptura da vida em família, i.e. das concretas circunstâncias em que nasceu e se desenvolveu a obrigação exequenda. Na verdade, basta atentar que, quem ainda não completou 18 anos de idade, carece de capacidade de exercício (…) e é, por isso, necessariamente representado pelos seus pais (…) para efeitos patrimoniais, sendo, pois, natural que os alimentos devidos aos menores pelo progenitor que não detém a guarda daqueles sejam prestados através do progenitor que a detém. […] Ora, estando os filhos do recorrente e da recorrida confiados à guarda desta e não havendo notícia nos autos de que os mesmos angariaram, por si, meios para o seu sustento, não se crê que possam subsistir dúvidas de que foi a progenitora quem, a expensas exclusivamente suas, prestou àqueles os alimentos necessários ao longo do lapso de tempo em que perdurou o incumprimento do recorrente documentado nos autos. Por isso, é viável considerar que, ao proceder à cobrança coerciva das prestações pecuniárias alimentícias em causa nestes autos junto do recorrente, a recorrida propõe-se realizar um crédito próprio, decorrente de ter satisfeito, na medida do que lhe foi possível e seguramente para além do que lhe competia [..], a obrigação alimentar[..]. […] Nessa medida, seria manifestamente iníquo não reconhecer à recorrida o direito a obter a realização coactiva desse crédito junto do recorrente[..], redundando a adopção de uma solução oposta num prémio para o inadimplemento do recorrente, tanto mais que, perante os elementos disponíveis nos autos, é de concluir que [o filho] não demandou o seu progenitor.» (2)

              Também a Relação de Lisboa no Acórdão de 02.10.2014, relatado por Ilídio Martins, no proc. n.º 6420/11.8TCLRS-D.L1-8, in www.dgsi.pt, se pronunciou neste sentido nos seguintes termos: «Sendo também certo que o filho menor é o beneficiário e titular das quantias pagas a título de alimentos pelo progenitor que o não tem à sua guarda – progenitor não convivente, tal não significa, porém, que o progenitor convivente, que teve o filho à sua guarda até este atingir a maioridade (…) e que cumpriu o seu dever de assistência (…) fique privado de legitimidade processual para exigir o cumprimento das prestações fixadas em decisão judicial vencidas e não pagas durante a menoridade, uma vez atingida a maioridade. Na verdade, se em tal caso o filho maior não requer a realização coactiva da prestação alimentar contra o progenitor que a ela estava obrigado, tem de aceitar-se que o progenitor que dele cuidou e lhe prestou, exclusivamente, alimentos, provendo ao seu sustento, segurança, saúde e educação na medida das suas capacidades durante a sua menoridade, possa tornar efectivas as prestações em dívida, mesmo que fixadas em sentença proferida durante a menoridade do alimentando, ao abrigo da figura da sub-rogação leal, de harmonia com o disposto no artº 592º nº 1 do Código Civil». (3)

           Esta é de facto a posição dominante na doutrina (4) e na jurisprudência (5) e que merece a nossa inteira adesão.

     A análise da estrutura obrigacional do direito e a cisão entre o beneficiário do direito e o titular do direito, não pode, com efeito, esquecer que os direitos subjectivos compreendidos no âmbito do direito da família e relacionados com a atribuição aos pais de responsabilidades no tocante à pessoa dos filhos e à satisfação das respectivas necessidades de alimentação, educação, orientação e formação são, sobretudo, a resposta da ordem jurídica ao modo como se organizam e desenvolvem as relações familiares.

         A atribuição ao progenitor que tem o filho a seu encargo de legitimidade processual para reclamar do outro os alimentos que este tem a obrigação de pagar, dá resposta ao concreto problema que este enfrenta, qual seja, o de independentemente do comportamento do progenitor incumpridor ter de continuar a proporcionar ao filho casa, alimentação, cuidados de saúde e formação escolar e profissional, utilizando para o efeito o seu património e os seus rendimentos para além do que lhe era exigível que fizesse se o outro, como era sua obrigação, estivesse à altura das suas responsabilidades.

          Esse esforço acrescido que é exigido ao progenitor que tem o filho ao seu cuidado e a que, na prática, ele não pode renunciar nunca, justifica do ponto de vista jurídico que se atribua a esse progenitor alguma forma ser compensado pelo progenitor incumpridor, uma vez que em resultado desse seu esforço em condições normais o filho acabou por ver plenamente satisfeitas as suas necessidades de alimentação e, por essa razão ou por razões pessoais (não querer demandar o progenitor para lhe mostrar que cresceu sem o apoio dele ou, ao invés, para conquistar o apreço dele a que sempre aspirou) ele pode optar por uma atitude de inércia em relação ao outro progenitor.

         Para efeitos de reconhecimento dessa legitimidade do progenitor cremos ser irrelevante se a instância se inicia ainda durante a menoridade do filho e este atinge a maioridade na pendência da lide ou se a instância se inicia apenas já depois da maioridade, porquanto a legitimidade pode existir ab initio e deixar de existir posteriormente e a capacidade jurídica e judiciária também pode não existir de início mas sobrevir num momento posterior. Acresce que a questão não é de aproveitamento de actos processuais já praticados porque antes de se retirarem do vício consequências legais haveria sempre lugar ao convite à sanação da irregularidade superveniente ao nível da legitimidade/capacidade /representação, fazendo intervir na acção o filho que entretanto atingiu a maioridade.

              A nosso ver a ordem jurídica oferece hoje uma norma legal que aponta claramente no sentido da solução que vimos defendendo. Referimo-nos à alteração do artigo 989.º do Código de Processo Civil pela Lei n.º 122/2015, de 1 de Setembro, em resultado da qual foram aditados ao referido preceito os seguintes números:

«3 – O progenitor que assume a título principal o encargo de pagar as despesas dos filhos maiores que não podem sustentar-se a si mesmos pode exigir ao outro progenitor o pagamento de uma contribuição para o sustento e educação dos filhos, nos termos dos números anteriores.

4 – O juiz pode decidir, ou os pais acordarem, que essa contribuição é entregue, no todo ou em parte, aos filhos maiores ou emancipados

              Estas normas são relativas aos alimentos a filhos maiores e entraram em vigor em 1 de Outubro de 2015. Por isso no Acórdão desta Relação do Porto e secção de 16.06.2016, relatado por Pedro Lima Costa no proc. n.º 422/03.5TMMTS-E.P1, in www.dgsi.pt, entendeu-se que as mesmas não são aplicáveis a situações constituídas antes da data da sua entrada em vigor, como era o caso desses e é o caso dos presentes autos. Para o efeito, os subscritores do referido Acórdão interpretaram as referidas normas afirmando que através delas foi instituído um «direito próprio de um dos progenitores revelado na oposição ao outro progenitor – ainda que numa relação tripartida que também envolve filho maior –», direito esse que «não se confunde com pensão de alimentos que o progenitor em falta deva pagar a filho maior, não existindo coincidência para a situação do filho maior na previsão do art. 1880 do CC e na previsão do nº 3 do art. 989 do CPC» e nessa medida consideraram que «o nº 3 do art. 989 do CPC é uma norma de direito substantivo e não uma norma de direito adjectivo» (6).

        Com todo o devido respeito, não podemos concordar com esta interpretação da norma.

              Desde logo, era estranho que a criação de um direito subjectivo do progenitor cuidador sobre o progenitor não cuidador em termos tão inovadores pudesse ter assento não no Código Civil que é a sede do direito material mas sim no Código de Processo Civil, sede de normas adjectivas que facultam o exercício daqueles direitos materiais.

              Depois não vemos que interesse subjectivo poderia justificar a atribuição pela ordem jurídica em simultâneo com o direito do próprio filho aos alimentos que se justifica na relação de filiação e nas responsabilidades advenientes da maternidade e paternidade, de um direito próprio do progenitor cuidador sobre o outro cuja medida e critério fossem as necessidades … do filho (contribuição para o sustento e educação dos filhos, diz a norma).

              Os pais estão ambos obrigados a prestar alimentos ao filho: o progenitor cuidador em espécie, directamente ao filho que vive consigo, o progenitor não cuidador em dinheiro, entregando-o ao outro progenitor para que o afecte à satisfação das necessidades do filho de ambos. Por isso, ao prestarem alimentos ao filho comum, ambos cumprem uma obrigação própria, e o filho recebe alimentos de ambos por ter sobre ambos um direito idêntico, com o mesmo conteúdo (ainda que a medida dos alimentos varie na medida das possibilidades de cada um). A questão é sempre a forma de repartir essa obrigação comum sobre ambos os progenitores quando estes estão separados, não vivem em economia comum, nunca é de repercutir sobre outrem o cumprimento de uma obrigação própria e inalienável.

              Basta um exemplo para demonstrar que aquela interpretação não convence. Imagine-se uma situação em que o filho tem necessidades de 500, o progenitor não cuidador suporta 300 e o cuidador os restantes 200. Nessa situação, se o filho pudesse exigir do progenitor não cuidador alimentos no valor de 300 e recebesse do outro em espécie os restantes 200, as suas necessidades estavam satisfeitas. Todavia, se o progenitor cuidador pudesse depois reclamar do outro parte dos 200 que suportava em espécie e a entregasse ao filho, conforme previsto no n.º 4 da norma, este receberia mais de 500 quando só tinha necessidade de 500 (!); se ao invés essa parte ficasse para si, a sua prestação seria reduzida para valor abaixo dos 200 que devia suportar com o filho (aumentando na mesma medida a prestação do outro para valor acima do devido).

              Cremos, pois, que se deve buscar outra interpretação para o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 989.º do Código de Processo Civil.

           Na nossa leitura do preceito, tendo em conta as perplexidades acabadas de referir, os números 3 e 4 do artigo 989.º do Código de Processo Civil não criam qualquer direito subjectivo de um dos progenitores sobre o outro progenitor, distinto do direito subjectivo do filho a receber alimentos de ambos os pais. A expressão do n.º 3 segundo a qual o progenitor cuidador «pode exigir» deve ser lida como pode «reclamar», pode «demandar» para obter algo. Por sua vez a expressão «contribuição para o sustento e educação dos filhos» deve ser interpretada como «concretização da contribuição devida ao filho».

              Daí resulta que o que a norma prevê é afinal a possibilidade de o progenitor cuidador poder desencadear mecanismos judiciais para forçar o outro a cumprir a sua obrigação de prestar ao filho os alimentos que lhe são necessários. Do que se trata é apenas de assegurar que o progenitor cuidador tem legitimidade processual para demandar o outro progenitor para obter a sua comparticipação nos alimentos necessários para o filho maior de ambos, não obstante o beneficiário dos alimentos (o filho) já ser maior e poder por si próprio demandar o progenitor não cuidador com esse mesmo objectivo. Daí, afinal, a sua correcta localização sistemática no seio do Código de Processo Civil.

              Quando o n.º 4 da norma prevê a possibilidade de a quantia a receber do progenitor demandado ser entregue no todo ou em parte ao próprio filho maior (afinal o beneficiário dos alimentos) está apenas a prever a possibilidade de o tribunal entender ou os progenitores acordarem que em resultado da maioridade o filho já é capaz de administrar directamente os alimentos recebidos. Não se trata, pois de acrescentar uma verba aos alimentos a que tem direito, mas de lhe entregar parte dos alimentos a que tem direito para que os administre pessoalmente (7).

              Não é necessário ir muito longe para obter a comprovação desta leitura. A Lei n.º 122/2015 teve origem no Projecto de Lei n.º 975/XI/4.ª apresentado por um grupo de Deputados do Partido Socialista (8). No preâmbulo do Projecto os respectivos autores esclarecem assim o sentido da solução normativa projectada: «a alteração legislativa proposta vai ao encontro da solução acolhida em França, (…) salvaguardando no âmbito do regime do acordo dos pais relativo a alimentos em caso de divórcio, separação ou anulação do casamento, a situação dos filhos maiores ou emancipados que continuam a prosseguir os seus estudos e formação profissional e, por outro lado, conferindo legitimidade processual activa ao progenitor a quem cabe o encargo de pagar as principais despesas de filho maior para promover judicialmente a partilha dessas mesmas despesas com o outro progenitor».

              Nesta perspectiva, temos hoje na ordem jurídica uma disposição legal sobre a legitimidade processual do progenitor cuidador para reclamar do outro os alimentos devidos ao filho comum. Sendo uma norma adjectiva e não uma norma substantiva não existe razão para recusar a sua aplicação imediata a todas as situações jurídicas vigentes por ser essa a regra de aplicação temporal das normas processuais.

              Porém, trata-se de uma norma cuja previsão se reporta aos alimentos devidos a filhos maiores, melhor dizendo, alimentos devidos a filhos no período posterior à sua maioridade até à conclusão da sua educação e formação profissional. A sua previsão não compreende pois a situação dos alimentos devidos a filhos menores, referentes ao tempo da menoridade, que é a que nos ocupa nos autos. Quer-nos parecer, todavia, que em relação a estes a solução deverá ser a mesma por maioria de razão.

              De facto, se a ordem jurídica reconhece legitimidade processual ao progenitor para obrigar o outro a cumprir a sua obrigação nas situações em que o filho já é maior, já tem condições para angariar por si mesmo rendimentos para completar a própria formação e condições para avaliar e decidir sobre a melhor forma de o fazer, deverá reconhecê-la, igualmente, nas situações de menoridade em que é mais natural, forçosa e inevitável a necessidade de alimentos, a impossibilidade de os obter por si e a falta de capacidade para fazer avaliações e tomar decisões, e o filho está na dependência total da capacidade do progenitor cuidador para o sustentar e educar.

              Se quisermos, após a Lei n.º 122/2015, de 1 de Setembro, e a alteração que ela introduziu no artigo 989.º do Código de Processo Civil, passámos a ter na lei uma lacuna quanto à legitimidade processual do progenitor no caso dos alimentos devidos a filhos menores. Por isso, uma vez que as razões que justificam a regulação dos alimentos a filhos maiores valem por maioria de razão para os alimentos a filhos menores, com recurso ao artigo 10.º do Código Civil que manda aplicar aos casos omissos a regulação dos casos análogos, podemos considerar aplicável, por analogia, ao caso sub iudice a regulação que resulta do novel n.º 3 do artigo 989.º do Código de Processo Civil.

              Em conclusão, a autora tinha legitimidade processual para demandar o réu com vista a exigir-lhe o cumprimento coercivo da obrigação de alimentos ao filho comum durante o período da menoridade. Improcede pois também esta questão do recurso.

Notas do acórdão

(1) No Acórdão da Relação do Porto de 16.01.2014, relatado por Araújo de Barros no proc. n.º 262/13.3TBALJ.P1, in www.dgsi.pt, discute-se a legitimidade não do progenitor com o qual o filho vivia mas do próprio filho, após atingir a maioridade, mas ainda assim assinalou-se o entendimento de que tal como o filho também aquele progenitor tem legitimidade para exigir os alimentos devidos durante a menoridade.

(2) No mesmo sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.03.2010, relatado por Alves Velho no proc. n.º 7957/1992.2.P1.S1, in www.dgsi.pt, não obstante com voto de vencido do Sr. Juiz Conselheiro Urbano Dias. Segundo este aresto «o beneficiário da prestação alimentar é o menor, mas é o progenitor a quem foi confiado que goza da respectiva titularidade. Este progenitor «age em substituição processual, parcial, representativa do menor». Age em nome próprio e, por isso, é parte processual (…). É ao progenitor com guarda que cabe a legitimidade para, em substituição processual do menor, pedir os alimentos, a sua alteração ou exigir o cumprimento coercivo da obrigação. Consequentemente, se o progenitor condenado a entregar ao outro prestações alimentares a título de alimentos devidos ao filho menor não cumpre, este fica onerado e passa a custear despesas que obrigavam aquele, despesas que só ele pode exigir do devedor, seja no exercício de um direito próprio, seja, quando assim se entenda, por via sub-rogatória (…). O titular único do exercício do poder paternal e dos correspondentes poderes-deveres satisfaz as respectivas obrigações e custeia os inerentes encargos na totalidade. Por isso, satisfeita unilateralmente a obrigação, compreende-se que só quem efectivamente a cumpriu possa exigir do co-obrigado os encargos a que esse cumprimento deu origem e lhe assista legitimidade para exigir a parte dos encargos que, na repartição efectuada, o outro obrigado deixou de lhe prestar

(3) No mesmo sentido os Acórdãos da Relação de Lisboa de 05.12.2002, in Colectânea de Jurisprudência, V, pág. 90, de 04.03.2010, relatado por Ana Luísa Geraldes no proc. n.º 20002-D/1996.L1-8, e de 29.01.2015, relatado por Maria José Mouro no proc. n.º 1717/14.8TMLSB-B.L1-2, in http://www.dgsi.pt.

(4) Cf. Remédio Marques, in Algumas Notas Sobre Alimentos (Devidos a Menores) “Versus” o Dever de Assistência dos Pais para com os Filhos (Em Especial Filhos Menores), Centro de Direito da Família, FDUC, Coimbra Editora, pág. 311, e Maria Clara Sottomayor, in Regulação do Exercício das Responsabilidade Parentais nos casos de Divórcio, 5ª ed., Almedina 2011, pág. 344.

(5) Ainda o Acórdão da Relação do Porto de 07.07.2011, relatado por Carlos Portela no proc. n.º 1409/08.7TBVRL-C.P1, in www.dgsi.pt.

(6) No voto de vencido do Desembargador Pedro Martins afirma-se mesmo que «o art. 989/3 do CPC, acrescentado pela Lei 112/2015, diz respeito a situação em que a prestação alimentar não está já fixada a favor do filho e dá origem a um direito do progenitor não obrigado (cujo montante pode depois ser entregue ao filho, por decisão do tribunal ou acordo dos pais, como se vê do art. 989/3 do CPC, pelo que a prestação não pode ser aquela a que o filho tem direito, sob pena de se estar a admitir que terceiros decidam de um direito de outrem sem sequer a intervenção deste)».

(7) A lei é assim sensível à circunstância de a maioridade legal se atingir num determinado instante, assim que se completam 18 anos de idade, enquanto a competência para administrar com zelo e prudência é algo que se adquire com o tempo e o crescimento e não necessariamente no ano, mês, dia e hora em que se completa a idade dos 18 anos.

(8) In https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=39565

 

      VII- 

      O art. 373-2-5 do Code Civil diz: Le parent qui assume à titre principal la charge d’un enfant majeur qui ne peut lui-même subvenir à ses besoins peut demander à l’autre parent de lui verser une contribution à son entretien et à son éducation. Le juge peut décider ou les parents convenir que cette contribution sera versée en tout ou partie entre les mains de l’enfant.

     O antigo art. 295 dizia: Le parent qui assume à titre principal la charge d’enfants majeurs qui ne peuvent eux-mêmes subvenir à leurs besoins peut demander à son conjoint de lui verser une contribution à leur entretien et à leur éducation)].

       O CC anotado pela Dalloz coloca em anotação a esta norma, o ac. do STJ francês (Cour de Cassation, Chambre Civile 2) de 09/07/1973, 72-13.147, que diz o seguinte: l’obligation des père et mère de contribuer a proportion de leurs facultés a l’entretien et a l’éducation de leurs enfants survit a leur émancipation. Cette obligation s’analyse non seulement en une obligation envers l’enfant qui, émancipé, pourrait en invoquer seul le bénéfice, mais également en une obligation réciproque entre époux, permettant à celui qui assure la charge entière de l’enfant commun de recourir contre l’autre, pour la part lui incombant, compte tenu de ses ressources] [a obrigação dos pais de contribuir, na proporção dos seus meios à manutenção e educação dos seus filhos sobrevive à emancipação destes. Esta obrigação analisa-se não somente numa obrigação perante o filho que, emancipado, seria o único a poder invocar o benefício, mas também numa obrigação reciproca entre os cônjuges, dando, àquele que assegura por inteiro as despesas do filho comum, regresso contra o outro, pela parte que lhe incumbia, tidos em contas os seus meios].

      A citação deste acórdão, no Code Civil anotado pela Dalloz (2019, 118e édition) termina aqui e realmente é só isto que interessa para o artigo em causa do CC.

          Mas o sumário do acórdão prossegue: Il en résulte que la pension allouée a l’épouse attributaire de la garde, pour l’entretien de l’enfant, ne peut pas être supprimée par suite de l’émancipation de celui-ci des lors qu’il n’est pas contesté que cet époux continue à assumer la charge de l’enfant après son émancipation et que ce dernier poursuit des études supérieures.

            Em anotação ao art. 373-2-5 o referido CC anotado da Dalloz coloca, entre outros, os seguintes acórdãos:

               Pour l’affirmation du maintien de l’obligation d’entretien au-delà de la majorité, V., avant la L. du 4 mars 2002 [que revogou o art. 295 e introduziu vários outros,  entre eles o art. 373-2-5]: aucune disposition légale ne limite à la minorité l’obligation des père et mère de contribuer à proportion de leurs facultés, à l’entretien et à l’éducation de leurs enfants; ceux-ci, devenus majeurs, ou le parent qui en assume la charge entière, peuvent donc demander l’exécution de cette obligation. ● Civ. 2e, 12 juill. 1971, no 69-14.601 […] ● 29 mai 1996, no 94-20.511 

            […]

         Sauf disposition contraire du jugement qui, après divorce, condamne l’un des époux à servir une pension alimentaire à titre de contribution à l’entretien des enfants mineurs dont l’autre a la garde, les effets de la condamnation ne cessent pas de plein droit à la majorité de l’enfant. ● Civ. 2e, 8 févr. 1989, no 87-17.771  

       Art. 203 do CC francês:  Les époux contractent ensemble, par le fait seul du mariage, l’obligation de nourrir, entretenir et élever leurs enfants.

             Art. 371-2 do CC francês:  (L. nº 2002-305 du 4 mars 2002)

          Chacun des parents contribue à l’entretien et à l’éducation des enfants à proportion de ses ressources, de celles de l’autre parent, ainsi que des besoins de l’enfant.

           Cette obligation ne cesse pas de plein droit lorsque l’enfant est majeur.

          Em anotação ao art. 371-2 o referido CC anotado da Dalloz coloca, entre outros, os seguintes acórdãos:

           Si chacun des père et mère, naturels comme légitimes, est tenu pour le tout de l’obligation de nourrir, entretenir et élever les enfants communs, cette obligation, unique au regard des enfants, qui en sont les créanciers en dehors de toute décision judiciaire consacrant leurs droits, ne s’en divise pas moins entre les parents, qui, dans leurs rapports entre eux, doivent en supporter le poids proportionnellement à leurs ressources; il suit de là que si l’un d’eux s’est soustrait à l’exécution de ce devoir, à la fois légal et moral, vis-à-vis des enfants hors d’état de se protéger eux-mêmes, celui qui en a forcément assumé la charge a un recours contre le défaillant […] ● Civ. 27 nov. 1935, Épx Gibeaux: GAJC, 12e éd., no 56-57 (II); DP 1936. 25, note Rouast ●  Paris, 3 nov. 1960: D. 1961. 32. [Se cada um dos pais, naturais como legítimos, está obrigado pela totalidade da obrigação de alimentar, manter e educar os filhos comuns, esta obrigação, única em relação às crianças, que são os credores, independentemente de qualquer decisão judicial consagrando os seus direitos, divide-se pelos pais que, nas suas relações entre si, a devem suportar em proporção aos seus recursos; segue-se daqui que, se um deles se subtraiu à execução deste dever, legal e moral, perante crianças incapazes de se proteger a si próprias, aquele que necessariamente assumiu as despesas, tem regresso contra o inadimplente […]].

         La personne tenue en vertu de l’art. 203 à une obligation alimentaire dispose d’un recours contre son coobligé pour les sommes qu’elle a payées excédant sa part contributive, compte tenu des facultés respectives des débiteurs. ● Civ. 2e, 28 avr. 1980, no 78-15.716 ● 6 mars 2003, no 01-14.664  […] [A pessoa obrigada em virtude do art. 203 a uma obrigação alimentar tem regresso contra o seu co-devedor pelas somas que ela pagou excedendo a sua parte, tida em conta as possibilidades respectivas dos devedores].

         Art. 373-2-2 do CC francês:

         En cas de séparation entre les parents, ou entre ceux-ci et l’enfant, la contribution à son entretien et à son éducation prend la forme d’une pension alimentaire versée, selon le cas, par l’un des parents à l’autre, ou à la personne à laquelle l’enfant a été confié.

    Les modalités et les garanties de cette pension alimentaire sont fixées par la convention homologuée visée à l’article 373-2-7 ou, à défaut, par le juge.  (L. no 2014-873 du 4 août 2014, art. 28)  «Cette convention ou, à défaut, le juge peut prévoir le versement de la pension alimentaire par virement bancaire ou par tout autre moyen de paiement.»

           Cette pension peut en tout ou partie prendre la forme d’une prise en charge directe de frais exposés au profit de l’enfant.

           Elle peut être en tout ou partie servie sous forme d’un droit d’usage et d’habitation.

           (L. nº 2016-1827 du 23 déc. 2016, art. 41)  «Lorsque le parent débiteur de la pension alimentaire a fait l’objet d’une plainte déposée à la suite de menaces ou de violences volontaires sur le parent créancier ou l’enfant ou d’une condamnation pour de telles menaces ou violences ou lorsque de telles menaces ou violences sont mentionnées dans une décision de justice, le juge peut prévoir que cette pension est versée au directeur de l’organisme débiteur des prestations familiales.»

           VIII – Acórdão do TRL de 04/04/2019 e declaração de voto